O tumor venéreo canino é um cancro contagioso que ataca
cães por todo o mundo, tem uma característica única, por razões ainda pouco
claras, regride espontaneamente ou após algumas semanas após um único
tratamento de radioterapia ou de quimioterapia. Um estudo publicado no passado
dia 9 de Abril na revista “ Cancer Cell” esclarece esse mistério, ao revelar o
papel fundamental do sistema imunológico no desencadeamento da rejeição rápida
do cancro em cães tratados com quimioterapia. Como o tumor venéreo
transmissível canino compartilha muitas semelhanças com vários cancros humanos,
as descobertas podem apontar para estratégias terapêuticas mais eficazes. A
título de curiosidade adiantamos que já nos pronunciámos sobre este tipo de
cancro no texto “TVT:
O CANCRO TRANSMISSÍVEL CANINO QUE TRANSPORTÁMOS PELOS MARES”,
editado em 16/06/2016.
Neste
estudo descobriu-se que a activação do sistema imune inato e a produção de
certas moléculas chamadas por quimiocinas pelo tecido hospedeiro ao redor do
tumor são fundamentais para atrair células imunes dentro do tumor e desencadear
uma reacção em cadeia que leva à rejeição do cancro e à sua eliminação, isto segundo
fez saber o Professor Ariberto Fassati da University College London (UCL).
Espera o mesmo docente que o presente estudo encoraje o teste clínico de
abordagens combinadas para melhorar as terapias imunológicas contra o cancro,
tanto em animais quanto em humanos.
Descrito
pela primeira vez em 1800, o tumor venéreo transmissível canino cresce
rapidamente numa massa semelhante a uma couve-flor na genitália e é
naturalmente transmitido entre os cães pelo coito, quando mordem ou lambem as
áreas afectadas pelo tumor. Este cancro é um dos três cancros clonais
transmissíveis conhecidos na natureza, juntamente com a doença facial do
diabo-da-tasmânia e as leucemias em moluscos de casca mole. Por ter a sua
origem num único ancestral comum, o tumor venéreo transmissível canino
apresenta células geneticamente idênticas em todos os cães afectados, o que
facilita a identificação dos principais factores que levam à regressão do
cancro.
No
entanto, poucos laboratórios investigaram este tópico, não deixando claro como
ocorre a rejeição do cancro. Para dar resposta à questão, Fassati e os seus
colaboradores colectaram biópsias de tumores venéreos transmissíveis caninos em
oito cães antes do tratamento, assim como 6 dias e 14 dias após receberem uma
droga quimioterápica chamada vincristina. Os pesquisadores realizaram análises
sistemáticas do genoma para comparar a actividade génica em tumores que
regrediram totalmente com aqueles que não regrediram, descobrindo que a regressão
ocorre em etapas sequenciais.
Primeiro,
o tratamento com vincristina levou a uma forte resposta inflamatória e à
proliferação de células da pele do hospedeiro, o que pode representar uma
tentativa do tecido circundante de conter ou substituir o tecido maligno, o que
surpreendeu os investigadores, que esperavam que a maioria das mudanças responsáveis
pela regressão do tumor ocorresse nas células cancerosas. Em vez disso,
constataram que as células hospedeiras eram as mais importantes. Este estágio
inicial de regressão foi também caracterizado por um aumento na produção de uma
quimiocina chamada CCL5 - uma proteína sinalizadora que atrai as células imunes
que combatem o tumor. Em última análise, este processo resultou na rejeição
imunológica do tumor e na reparação de danos nos tecidos
"Há
duas mensagens principais do nosso estudo", diz Fassati. "Primeiro,
não nos devemos concentrar apenas nas células cancerosas, mas também
compreender a importância do tecido normal em torno do cancro na promoção da
rejeição. Segundo, devemos ser capazes de induzir a produção de grandes
quantidades de certas quimiocinas para atrair cargas de células imunológicas”.
Esta pesquisa poderá ter implicações no tratamento dos cancros humanos, como o
da pele, o ósseo e alguns tipos de cancro no sangue.
Quanto a Fassati, planeia
investigar se é possível estimular quimiocinas que atraiam células imunes em
cancros humanos, o que poderá levar algum tempo até que essas abordagens sejam
clinicamente testadas. Não querendo semear falsas expectativas este docente
afirmou: "a audiência geral não deve concluir que encontrámos a varinha
mágica para fazer o cancro desaparecer. No entanto, esta pesquisa pode ajudar a
orientar investigações clínicas em andamento e futuras” e "Pode haver
maneiras de melhorar a eficácia das terapias imunológicas contra o cancro,
combinando diferentes abordagens, tais como libertar as falhas do sistema
imunológico através de checkpoint inibidores e induzir as células do hospedeiro
ao redor do tumor para atrair as células imunes desencadeadas para o local do
tumor. De fato, já existem estudos em andamento que combinam radioterapia de
baixa dose ou quimioterapia com terapias imunológicas, justamente para
estimular uma forte resposta inflamatória no tumor". Boas novas para quem
sofre da doença e espera a cura, óptimas notícias para quem futuramente não
padecerá dela.
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