quarta-feira, 25 de setembro de 2013

O ABATE DOS CÃES MILITARES DO PRÍNCIPE WILLIAM

Pouco nos interessa comentar pessoas ou factos ligados á Casa de Windsor ou aos residentes no Buckingham Palace, porque já não acreditamos em contos de fadas, não nos interessa alimentar o marketing inglês e não temos a memória curta, apesar da pequena Rainha Isabel II ser oficialmente uma figura simpática. Há muito que os ingleses nos desapontaram, enquanto piratas e regentes no nosso solo, quando saqueavam as nossas caravelas e nos exigiram o Brasil como fiador. Na verdade fomos uma “colónia” inglesa ao longo dos séculos e se calhar voltaremos a sê-lo. E como se isto não bastasse, é impossível esquecer o “Ultimato Inglês”, acontecido a 11 de Janeiro de 1890, quando reinava a Rainha Vitória (trisavó da actual) e o Império Britânico possuia a maior e melhor armada do mundo.
A Aliança Luso-Britânica, ratificada pelo Tratado de Windsor em Maio de 1386, que renovou a anterior Anglo-Portuguesa de 1373, apesar de ser a mais antiga aliança diplomática no mundo em vigor, melhor tem servido aos ingleses do que aos portugueses, que sempre nos usaram para enfraquecer o poder das nações europeias suas concorrentes, primeiro contra a Espanha e depois contra Napoleão. Talvez por causa disto, ainda exista hoje um sentimento popular de desconfiança em relação aos ingleses (justificado, diga-se), sobrando daí a frase hipócrita: “para inglês ver”. Também não nos interessa saber se o Príncipe William deles é de convicção nazi, porque se o for, certamente não será o primeiro, porque muito do que se condenou aos alemães teve uma origem inglesa, alcançando de imediato adeptos incondicionais no seio da sua aristocracia, também ela de ascendência alemã e que se viu obrigada, durante a I Guerra Mundial e perante o ódio generalizado do povo britânico contra os germanos, a trocar o nome da sua dinastia, passando de Saxe-Coburgo-Gota a casa e dinastia de Windsor.
Foi uma aluna nossa que nos alertou para o particular dos cães militares do Principe William, pedindo-nos que lêssemos e comentássemos o constante em: http:/greensavers.sapo.pt/2013/09/18caes-da-forca-aerea-que-guardavam-príncipe-william-abatidos-depois-da-missão/. Segundo o que se faz saber, ao que parece, dois cães militares destinados à segurança pessoal do Príncipe William foram abatidos, um Pastor Belga e um Cão de Pastor Alemão, por dispensa do serviço e impossibilidade doutra instalação, mercê da sua idade e tipo de comportamento. O abate dos cães militares por ocasião da sua dispensa, que são tão soldados quanto os seus tratadores, é uma prática comum a todas as companhias cinotécnicas  espalhadas pelo mundo, que não encontrando outra solução, acabam por abatê-los. Os ainda adaptáveis, caso haja interessados, poderão vir a ser resgatados e alguns têm sido, tanto pelos seus tratadores como por outros. As companhias cinotécnicas não têm como comportar os gastos dos cães dispensados, nem hoje nem nunca, porque em apenas duas décadas teriam de sustentar o quádruplo dos animais ao seu encargo e aumentar na mesma proporção as suas instalações.
Serão estes cães reeducáveis? Estamos em crer que na sua maioria sim, desde que entregues a gente conhecedora dos seus códigos, do agrado dos animais (ao ponto de aceitarem a sua liderança) e com disposição para isso, pessoas capazes de levar a cabo a sua descodificação (por transformação, substituição ou inibição), dispostas ao risco e livres de tempo. Ninguém melhor do que os seus tratadores o poderia fazer, contudo tal não é viável, porque irão ser precisos para a instrução de novos cães, exactamente daqueles que substituirão os dispensados. Diante desta impossibilidade e havendo outros dispostos prà tarefa, quem suportaria os seus custos? Valeria a pena pedir tal esforço aos cães, agora gastos, debilitados e a acusar o peso da idade, já que nehuma descodificação é automática e gratuita? Mesmo verificando-se a sua reeducação, quem estaria disposto a acolhê-los, agora velhos, de pouco préstimo e com possíveis manifestações recidivas de stress pós-traumático? Não nos custa acreditar que alguns deles morreriam ainda antes da conclusão da sua reeducação, invalidando assim o esforço em prol da sua sobrevivência.
Não estamos com isto a justificar tal carnificina, casos como estes levam-nos a questionar sobre o ofício que escolhemos, porque estamos cá para aumentar os seus dias e não para lhos roubar prematuramente, opinião dividida com os adestradores renomados mais pensados, que jamais gostariam de ter treinado cães e que o fizeram por amor a estes animais, porque doutra forma, dificilmente seriam eles aceites, tolerados, integrados e respeitados no seio das díspares sociedades humanas, porque só a utilidade canina pode evitar o extermíno do canis lupus familiaris. Compreendemos e respeitamos aqueles que abominam a cinotecnia e o treino, porque são pessoas sensíveis e sinceras, mas somos obrigados a esclarecê-los que o cão mais livre do mundo é o lobo, isto se o deixarem em paz e não o matarem também, mas que não se presta a viver em casa connosco! Aqui o que está em causa é o cão polícia ou soldado, o uso abusivo dos cães para fins fratricidas, à revelia das Declarações Universais dos Direitos Humanos e dos Direitos do Animal. Quando acharmos solução para as crianças-soldado, também arranjaremos maneira de dispensar os cães de guerra.
  O comunicado do Ministério da Defesa Britânico e aquilo que foi complementado pela RAF tresanda a hipocrisia, a uma mensagem tangível ao que é politicamente correcto, muito embora não tenha convencido ninguém, nem os seus emissores e muito menos os seus destinatários, porque sabemos que os cães visados foram criados, seleccionados e adestrados como cães de guerra, espicaçados e atormentados para se tornarem letais. A citação que nos chegou por tradução e que diz: “terem sido os cães muito amados pelos seus tratadores, que tinham um vínculo muito forte com eles”, não consegue esconder o assassinato dos cães, nem apaziguar a opinião pública, porque é do domínio comum que a relação binomal nestes casos é interesseira e procura a caça, a captura e o dolo de indivíduos considerados hostis, intrusos, ou indesejáveis, sendo os cães recompensados de acordo com o cumprimento desse “serviço” para reforço do seu instinto de presa e potenciação do impulso à luta.
Não sabemos ao certo se os cães estavam distribuídos ao Príncipe William, muito embora nos pareça que sim pela pronta resposta do Ministério da Defesa do Governo de Sua Majestade (a soar a desmentido forçado). Caso estivessem, não nos admiraria que fossem dos mais aptos para aquele tipo de serviço e por isso mesmo de difícil adopção, o que de certo modo justificaria assim a sua eliminação. Independentemente de quem fossem, o que se lamenta é o seu desaparecimento precoce, uma vez que acabaram condenados por práticas induzidas e ao alcance da sua natureza, também ela manipulada para o efeito. Como a realeza é um produto que se vende, a seguir à saga do “Carlitos-caça elefantes”, chega-nos agora o “Guillermo mata-perros” (isto de ser da realeza não os deixa sossegar, passar despercebidos e à vontade, chego a ter pena deles!). 
Mais pena temos dos cães transformados em cães de guerra cujo prémio é a morte, companheiros abusados que partem sem glória, confiantes em quem os conduz, mesmo no caminho para a injecção letal, de olhos postos no tratador e estranhando a presença do veterinário. Chorá-los-ão por pouco tempo e voltarão a abusar de outros! Não se fará justiça aos cães? Porque tarda ela?

terça-feira, 24 de setembro de 2013

O XIII ESTÁGIO DA ACENDURA BRAVA (39º 42’ N 8º 17’ W)

Realizou-se no passado fim-de-semana, dias 20, 21 e 22, o XIII Estágio da Acendura Brava que contou com 22 participantes e 18 binómios. O duplo objectivo da excursão escolar, plenamente alcançado, era o de familiarizar os binómios com a prática dos obstáculos e de capacitar os cães no desempenho dentro de água.
Ainda houve tempo para uma caminhada nocturna, para acções típicas da disciplina de guarda e no último dia realizaram-se provas para a fixação dos conteúdos de ensino adiantados.
As classificações obtidas pelos binómios com cães adultos nos obstáculos foram (até ao 5º lugar): 1º RED/ Rui Santos; 2º BROWNIE/ Jorge Martins; 3º RADAR  Joana Melo, 4º BONNIE/ Augusto Ribeiro e 5º DAISY/ Augusto Ribeiro.
Na prova de natação a classificação ficou assim: 1º DAISY/ Augusto Ribeiro; 2º RADAR/ Joana Melo; 3º BROWNIE/ Jorge Martins; 4º RED/ Rui Santos e 5º WILLIE/ Márcio Duarte.
Na prova de obstáculos para os cachorros até 1 ano de idade, a classificação foi a seguinte: 1º HUK/ Augusto Ribeiro; 2º RED/ Augusto Ribeiro/ 3º DAISY/ Telma, 4º GIGA/ Jorge Martins e 5º TWIX/ João Ramos.
Na natação para a mesma categoria, a classificação ficou assim ordenada: 1º GIGA/ Jorge Martins, 2º RED/ Augusto Ribeiro, 3º HUK/ Augusto Ribeiro, 4º KIRA/ Márcio Duarte e 5º DAISY/ Telma.
Os binómios constituídos pelo Sr. Augusto Ribeiro, a jogar em casa, alcançaram 55.5% dos pontos em jogo. O CPA RED, agora com 7 anos de idade e propriedade do Sr. Rui Santos alcançou  70% dos pontos possíveis, mostrando que apesar da idade, quem sabe nunca esquece e que a longevidade laboral é possível.
Nos cachorros o destaque foi para duas cachorras CPA, a HUK e a RED. A revelação coube à DAISY, uma SRD com muita garra, versátil e disponível. Participaram ainda nos trabalhos os seguintes binómios: BOXER/Luis Rebelo e PANTERA/Ricardo.
Os trabalhos foram coordenados pela Joana Melo, Rui Santos e Jorge Martins, cabendo também ao Sr. João Carreiras várias tarefas inerentes ao sucesso deste evento.
Nota de registo foi a participação do menino João Pedro Ferreira, que com apenas 11 anos, acampou com a sua CPA Cocas ao lado dos demais, debaixo da supervisão da Joana Melo, participando com interesse em todas as actividades.
A cozinha esteve a cargo da SrªAna Paula e ninguém passou fome, apesar de muita gente não gostar de sardinhas (este prato tão português jamais voltará ao menú de qualquer estágio ou acampamento). O Sr. Augusto Ribeiro fez as honras da casa e fê-las muito bem, pelo que lhe estamos muito gratos. Os condutores puderam ainda usufruir de uma praia fluvial privativa e de uma piscina colocada ao seu dispor.
No trabalho desenvolvido no rio avistámos duas lontras, que indiferentes à companhia dos cães, se deliciavam com camarões de água doce. 
O tempo esteve de feição e a lua iluminou as noites, o que muito ajudou na subida da serra e no retorno ao vale. Os cães adultos puderam expor a sua capacidade atlética no “Arco” e dois deles conseguiram ultrapassá-lo a 1.20 m de altura (RED e RADAR). O Sr. Jorge Martins, enquanto criador de CPA’s, esteve em alta porque os filhos da Brownie e do Kaiser estiveram em todos os pódios.
Queremos daqui endereçar os nossos agradecimentos a todos os participantes e esperamos vê-los de novo no próximo estágio, especialmente aqueles que agora iniciaram as suas actividades connosco, quer como convidados quer ainda como alunos.
Para a próxima vez trabalharemos em serra acima dos 400m, num ecossistema bem diverso e ao mesmo tempo único, com o propósito de melhor equipar homens e cães, para que em tudo e em todo o lugar, os vínculos binomais saiam reforçados e grupo escolar mais unido. Felicidades e boas caminhadas!          
 

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

FACILITAR A TRANSPOSIÇÃO E MOSTRAR A SAÍDA!

Apesar da prática sobre os obstáculos trazer bastantes benefícios para os cães, tais como: a correcção morfológia, o desenvolvimento dos indíces atléticos, a harmonia muscular, a melhoria dos ritmos vitais, o alcance de novas capacidades, o aumento cognitivo, o robustecimento de carácter, melhor operacionalidade e o reforço dos vínculos afectivos binomais, entre outros, grassa entre nós uma opinião contrária, aquela que os desconsidera e os considera impróprios ou abusivos para os cães, pelo que importa denunciar inverdades, esclarecer todos os interessados e adiantar-lhes subsídios.
A dispensa dos obstáculos está ligada aos factores técnico e económico. Ao técnico porque o desuso dos obstáculos tem formado adestradores que ignoram os seus requisitos e ao económico porque a pista de obstáculos é dispendiosa e não está ao alcance de todos. Estas duas carências são responsáveis pela ignorância relativa a estes preciosos aparelhos, que é falsamente justificada pelo “amor” aos animais. E como se isto não bastasse, ainda há quem julgue que a prática dos obstáculos é exclusiva de determinadas modadilidades desportivas caninas. O progressivo abandono dos obstáculos também não pode ser dissociado dos actuais métodos de treino, mais virados para o aproveitamento dos impulsos inatos caninos (quando não nos instintos) e menos apostados no desenvolvimento técnico dos seus intervenientes, relegando para os cães a responsabilidade do sucesso ou insucesso escolar, o que invariavelmente agrada a quem paga as mensalidades, porque sai inocentado e burro é o cão, ainda que receba, sem se aperceber de imediato, um certificado igual ao do animal.
Como nem todos temos a experiência e a habilidade técnica para realizarmos de surpresa a transposição de um obstáculo, também a felicidade de ter um cão valente e resoluto que nos siga incondicionalmente, é obrigatório evoluir lenta e gradativamente sobre os obstáculos, facilitando a sua transposição e mostrando para o cão a sua saída. A evolução que sugerimos é aquela que parte dos aparelhos mais fáceis para os mais difíceis e dos mais simples para os complicados, algo a se convencionou chamar de “sequências naturais” (Ex: “janela”, “pneu”, “arco” e finalmente “arco de fogo”). Considerando a possibilidade da indesejável experiência negativa, que a ninguém aproveita, não se deve convidar um cão para um obstáculo que esteja para além da sua capacidade de resolução, o que sempre nos obrigará a ajudá-lo na sua transposição, tornando-a fácil e isenta de danos (físicos e psicológicos).
A resistência canina contra os obstáculos resulta, na maioria dos casos, da incapacidade animal de antever como sair deles, pelo que importa mostrar aos cães como fazê-lo, já que as suas faculdades cognitivas assentam quase em exclusivo na experiência. Assim, o nosso primeiro trabalho é mostrar-lhes primeiro a saída, ajudando-os na transposição para que prontamente a vejam. Para que isso aconteça, podemos ter que carregá-los para cima dos obstáculos, subdividir os momentos da transposição e apoiá-los na saída, pois só assim levaremos de vencida o medo que têm de partir para parte incerta. É errado julgar que estes procedimentos apenas se destinam aos cães mais débeis ou temerosos, porque os valentes também precisam deles, porque ao não medirem os riscos, partindo à desfilada, podem adquirir vícios, lesionar-se gravemente e adoptar traumas de difícil eliminação. Como entendemos os obstáculos muito para além da competição, usamo-los como meio para a sobrevivência canina e não como pretexto para alcançar vã glória, o que justamente nos leva a convidar todo e qualquer cão para o seu concurso.
Para melhor entendimento do que acabámos de dizer, salientamos aqui o ocorrido com os cães de uma ex-aluna nossa, daquelas que chega num Domingo e que no Sábado seguinte desaparece, não deixando rasto e pouca ou nenhuma saudade. Ela deixou os seus três cães num quintal ao nível da rua, circundado por um muro de 90 cm, indo depois trabalhar. Algumas horas depois, deflagrou um incêndio num dos prédios contíguos e os pobres animais acabaram irremediavelmente esturricados (alguém nos disse que a dita senhora está inconsolável e que até se afasta dos proprietários caninos da sua vizinhança, que se esconde e não quer falar com ninguém). Um simples muro de 90 cm de altura impediu aqueles cães de se salvarem, transposição possível a qualquer cão de apenas 30 cm ao garrote, quando saudável e devidamente capacitado. Costuma dizer-se que para ser cão é preciso ter sorte e estes não tiveram nenhuma, porque foram primeiro abandonados, castrados depois de resgatados e acabaram em brasas vivas. Frequentar uma escola sem obstáculos pode condenar os cães à morte e isso ninguém deseja!

EQUITAÇÃO E CINOTECNIA

Já há muito reparámos que os melhores alunos na cinotecnia não se fixam nela como profissionais, ocupando o seu lugar indivíduos menos preparados e mais rudimentares, gente que procura no universo canino aquilo que o mundo dos homens não lhe reconhece na ânsia de um lugar ao sol. E quem disto tiver dúvidas, basta inquirir sobre a profissão anterior da maioria dos adestradores em exercício. É evidente que há excepções, e que muitas delas resultaram do desencanto profissional de alguns. Se a isto juntarmos e entendermos como formação exclusiva os workshops de fim-de-semana e as palestras esporádicas, então o panorama agrava-se de sobremaneira, a erudição tarda, o plágio reina e não haverá progresso ou evolução.
Convém não esquecer que a cinotecnia é uma ciência, muito embora o vulgo a entenda quase exclusivamente como arte, talvez por causa dos “artistas” que nela abundam, aqui e além fronteiras. Ainda que pareça impossível, a arte da cinotecnia sempre dependerá do conhecimento científico que a sustenta, tanto do que lhe é próprio como daquele que lhe é tangente, concorrente ou acessório. Por esta razão também não consideramos o Sr. Cesar Millan, tido como “encantador de cães” (nome que lhe assenta muito bem), um adestrador genuíno, porque, truque por truque; bucha por bucha, com mais justiça se atribuiria ao falecido Houdini o Prémio Nobel da Física.
Sempre soubemos que o adestramento não é doma, mas sempre reconhecemos as vantagens dos praticantes da equitação na condução de cães, ignorando até a paternidade equestre do Agility canino, porque através da equitação se alcança maior conhecimento biomecânico, se compreende da necessidade das ajudas (incentivos) e a importância da postura corporal, enquanto subsídios válidos para o melhor desempenho binomal, já que um condutor de cães é correctamente avaliado pela postura corporal (impacto visual), modo de respirar (respiração) e pela entoação dos comandos, que deve ser suave e de acordo com a divisão das sílabas, onde a ira e o stress estão proibidos de entrar, para que o cão aprenda o mais rápido possível, porque pelo condicionamento, a resposta canina é um acto reflexo da vontade humana.
A disciplina corporal dos condutores torna-se imprescindível no adestramento, porque os cães passam a vida a observar-nos e aproveitam qualquer deslize da nossa parte, chegando alguns a subornar-nos. Como cada comando verbal tem uma mímica própria que o pode substituir, o corpo deverá estar em sintonia com a voz, doutro modo, indevidamente, estaremos a enviar duas mensagens diferentes em simultâneo, o que sempre será do agrado a quem não quer obedecer. Para além destes aspectos, a prática da equitação responsabiliza os cavaleiros e desnuda-lhes os erros, levando-os ao assumir das suas culpas, condição indispensável para quem quer evoluir também no adestramento, porque só os tolos atribuem aos cães todo o insucesso que lhes é alheio.
Conhecedores destas vantagens (e não as descrevemos todas), temos convidado vários jovens para a complementaridade existente entre a equitação e a cinotecnia, certos do progresso individual desses duplos praticantes, convite que repetimos ano após ano no intuito de melhorar a sua formação, enquanto líderes e condutores de animais, dotando-os de maior responsabilidade, saber e experiência. Mais tarde agradecer-nos-ão e alguns deles ficar-nos-ão gratos para sempre.

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

O SANDOKAN, OS DIABOS E O PITBULL

As escolas caninas lembram as aldeias do interior, onde a convivência apertada leva a uma relação mais próxima entre os indivíduos, sendo cada um identificado por uma alcunha advinda de uma característica pessoal, chegando ao ponto de se desconhecer por completo o nome verdadeiro das pessoas, aquele que se encontra no Bilhete de Identidade e que consta no Registo Civil. Este é também o caso do protagonista desta história real, um moço voluntarioso, eléctrico, alegre, carente de aceitação, crédulo, destemido, competitivo e desafiador, orundo de Aruil, freguesia de Almargem do Bispo, concelho de Sintra e distrito de Lisboa, pequena terra escondida na serra, pouco industrial, agrícola, aqui e ali com uma oficina por perto e adornada por meia dúzia de faustosas habitações, resultantes na sua maioria do negócio das hortaliças.
O homem foi rebaptizado de “Sandokan” mais pela alma do que pelo corpo, num misto de troça e admiração, porque era franzino e praticava uma modalidade de luta, sendo comum vê-lo a correr a pé entre a Amadora e Odivelas, descalço e dar pontapés em pilares de cimento, a mando do seu treinador, um “entendido” que o haveria de fazer campeão europeu. Num dos combates para o título, defrontou o campeão e apanhou “um enxerto”, viu andorinhas fora de estação e regressou a casa a comer por uma palhinha, mas mesmo assim não desistiu, porque a pequenez do corpo não lhe aprisionava a valentia (ou a loucura). Já antes do Conde de Lippe se sabia que os saloios são melhores para romper do que para defender, para o último caso temos cá os “galegos”, que não abrem mão do que é seu e vendem cara a pele ao diabo.
Os diabos eram os seus dois mestiços de Rottweiler com Fila de S. Miguel, umas piranhas que “distribuiam fruta à esquerda e à direita” num abrir e fechar de olhos, tropa que a muitos obrigava a andar com “pézinhos de lã” (merecidamente ficaram para a história com esse nome). Os bichos haviam nascido  de um cruzamento acidental entre um cão de hotel e uma Fila residente, que longe de se fazer rogada, num ápice, se enamorou dum Rottweiler que com ela se cruzou. Não nos lembramos do nome dos bichos, será que se chamavam “Punch” e “Uppercut”? Mas de uma coisa jamais nos esqueceremos, quando o rapaz descia as escadas de acesso à pista, todos os cães se alvoraçavam e ficavam prontos para lhe morder, mesmo os mais tímidos e mansos. Escusado será dizer que foi investido como figurante de eleição, papel que adorava e ao qual emprestava subsídios nunca vistos.
Como bom saloio, inquieto e belicoso, filho de um deus que D. Afonso Henriques baniu, apesar de adepto da pinga, da mão de vaca, dos torresmos, do chouriço assado e do terço pendurado na cabine da camioneta, cuja cabeça nunca pára, o engenho não lhe falta e o toca pra diante, decidiu mais tarde adquirir um Pitbull, animal que criou irreprensívelmente e com muito carinho, no intuito de fazer dele um lutador de ringue igual ao dono. A partir daí nunca mais tivemos notícias do Sandokan, somente que o Pitbull se finou no primeiro combate. Talvez o ridículo, o desgosto, a vergonha e o “levar nas orelhas”, o tenham impedido de reaparecer. Hoje o nosso herói, se for vivo (esperamos que seja), terá perto de 40 anos e já terá dado ao mundo descendência. Para a história fica um moço endiabrado, um “peso Mosca” que se constitui na melhor das presas para os cães. Não terá o fado uma origem saloia (fado vadio), ainda que suavizada por alguns acordes hebraicos? Há quem diga que sim e no Médio-Oriente há muita gente que ainda se degusta com ele.
E porque falámos de etnias, ainda que a traços largos, vale a pena rever dois filmes da cinemateca nacional sobre essa temática: Aldeia da Roupa Branca (1938) e Ala-Arriba! (1942), respectivamente de Chianca de Garcia e de Leitão de Barros, sendo os diálogos e o argumento do primeiro da autoria de Ramada Curto e do próprio Chianca de Garcia, e do segundo de Alfredo Cortez, enquanto testemunhos do pensar e viver das diferentes gentes de Portugal. Vale a pena rever com atenção, porque estas obras têm muito para ensinar!

LÁ COMO CÁ VÃO APARECENDO ALGUNS

As fotos deste artigo, enviadas pelo Márcio Tadeu Maia de Almeida Malta, um nosso leitor do Brasil, são do Aquiles, um cachorro pastor alemão fígado (chocolate) que é filho do Platão e propriedade deste nosso amigo, que desde há tempo vem mantendo correspondência connosco, enviando-nos ocasionalmente fotos dos seus cachorros. Pelo que nos é dado a observar, o Aquiles está bem e recomenda-se, para além de ser muito bonito e de se encontrar bem tratado. Parabéns Márcio!
Este leitor pergunta-nos se a variedade “liver” (fígado) pode ser registada (registrada). Márcio, se os cachorros em questão são descendentes de cães certificados e registados, não vejo por que não! Mas se os seus pais não têm qualquer tipo de registo (registro), não sei se poderá levá-los a julgamento para obter o seu registo inicial, pois ignoramos se tal prática existe no Brasil. De qualquer modo, dirija-se ao Kennel Club do Brasil e solicite essa informação, porque ninguém melhor que essa entidade o saberá informar.
Não obstante, mesmo que os cachorros não obtenham qualquer tipo de registo, eles não deixarão de ser excelentes exemplares e um marco vivo do passado selectivo da raça, hoje quase estagnada pelo abuso endogâmico, erro que você deverá também evitar. À parte disso ou reforçando o que dissemos, à imitação dos nossos filhos, os nossos cães são os melhores do mundo. Felicidades e vá dando notícias.

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

NOTA EDITORIAL

Nunca tivemos pretensões globais ou sonhos megalómanos (por isso nunca optámos por uma edição bilingue), apenas o desejo de influir no pequeno mundo ao nosso redor, neste País que amamos e que nos adoptou como filhos, porque lhe estamos gratos e muito lhe devemos. Criámos este Blog para “consumo interno”, para os nossos alunos de todos os tempos, como meio de os auxiliar e congregar no amor pelos cães, enquanto arautos da nossa mensagem e membros desta grande família (desde o início dos nossos trabalhos até hoje já passaram por nós cerca de 38.000 binómios e ministrámos ensino a mais de 60 raças caninas).
No entanto, como a língua portuguesa é uma das grandes vias de acesso neste planeta, os nossos artigos são visitados por leitores de mais de 80 países e de todos os continentes. É evidente que a maior parte deles são lusos ou luso-descendentes e que os brasileiros ocupam o segundo lugar nas visitas (34.930, cerca de 30%). Imediatamente a seguir aos leitores de Portugal e do Brasil, seguem-se os dos Estados Unidos da América (3.374), da Rússia (1.306), da França (977), da Alemanha (837), do Reino Unido (491), de Angola (365), de Espanha (276) e finalmente os da Holanda com 273. Os restantes 6.701 leitores, até à data, encontram-se espalhados pelo globo. O número de visitantes do Leste europeu tem vindo a aumentar e da Sérvia vem o 2º maior grupo. Хвала!
Como a Internet faz maravilhas, este mês tivemos ainda leitores dos seguintes países europeus: Grécia, Itália, Polónia, Suiça, Turquia e Ucrânia. China, India e Japão da Ásia, Canadá e México da América do Norte, Argentina da América do Sul, Moçambique da África Austral, das Seychelles e também 9 de Israel (Shalom, mazel tov). Infelizmente não temos visitantes dos países muçulmanos, tanto dos sujeitos à  “Sharia” como dos liberais, por isso daqui saudamos um fiel leitor do Líbano, provavelmente cristão, com o qual gostaríamos de trocar correspondência, caso esteja interessado.
Muitos destes leitores colocam-nos questões e pedem-nos conselho, o que de sobremaneira tem aumentado o nosso trabalho e enriquecido a nossa experiência. Por causa disto, a actualização do Blog tarda nos meses ou semanas de maior azáfama, quando importa dar resposta a quem nos procura (já aconteceu estarmos no Hemisfério Sul a adiantar soluções para o Hemisfério Norte e vice-versa). Considerando esta realidade, estamos a pensar levar a cabo uma edição bilingue, muito embora saibamos que ela irá agravar o nosso já sobrecarregado caderno de encargos. Para além dos comuns proprietários caninos, temos sido abordados por criadores, adestradores, etólogos e estudantes de antrozoologia, gente a quem queremos agradecer pelo contributo que nos tem prestado. Esperamos continuar assim e agradecemos a todos.

A RAÇA QUE SOBREVIVEU AO IMPÉRIO

A foto acima tem perto de 70 anos e os dois retratados são fáceis de identificar. Em primeiro plano temos Adolf Hitler, o fuhrer e visionário do III Reich, sentado numa cadeira de campo e a seu lado, também sentado, um Pastor Alemão. Do homem de Braunau am Inn importa-nos que a terra lhe seja pesada, que não ressuscite como foi ou encarne noutro igual, apesar de ser curiosa a posição das suas mãos, provavelmente atormentadas por tremeliques, a menos que o homem estivesse a dizer algo parecido com “Ò Abreu dá cá o meu” ou a sofrer de androginia. Mais nos importa o cão e em particular a sua variedade cromática, que é parcialmente afogueada e notoriamente descendente de cães negros unicolores. Tempos houve em que exemplares destes eram também registados como negros.
O III Reich já passou à história, acabou num bunker em Berlim,  finou-se, o que não significa que todos os seus males partiram com ele, pois há ainda quem sofra por sua causa e não consiga esquecer os seus horrores. Afortunadamente o Cão de Pastor Alemão sobreviveu-lhe e continua entre nós tal como foi, apesar de quase extinto pelos predicados estéticos, gostos de ocasião e sucessivas modas em que se viu enleado, que lhe proibiram o trabalho para o qual havia sido criado. Pouca gente sabe que os cães negros foram uns dos primeiros padreadores da raça e a foto isso comprova. A paixão pelos Pastores Alemães negros creditou a Acendura, fê-la crescer e recriar a magnanimidade dos pastores doutrora, tanto física como cognitivamente, enquanto outros desprezavam a variedade por ser recessiva. Quem já teve um Pastor Alemão negro e pôde apreciar todo o seu manancial, dificilmente optará por outra variedade de Pastor Alemão, porque sabe que os negros são únicos e próximos de uma relação telepática com os donos.
Diz-se que há males que vêm por bem, assim foi o caso da foto introdutora, porque através dela pretendemos homenagear o cão da nossa eleição e incentivar outros à sua perpetuação, para que ontem como hoje, o Cão de Pastor Alemão seja procurado, respeitado e admirado, enquanto auxiliar de renome e companheiro sempre fiel. Essa tem sido a nossa experiência e nunca fomos desapontados.

terça-feira, 10 de setembro de 2013

A MENINA DO CÃO VERMELHO VAI PARA MEDICINA

Talvez naqueles pequenos flashes que antecedem a nossa partida deste mundo, nos lembremos como agora de uma menina franzina, morena, alegre, extrovertida, resoluta e responsável, ladeada por um Pastor Alemão Vermelho, valente e muito atento, numa harmonia que todos desejam e poucos alcançam. Assim andou a Joana entre nós, primeiro com a Xita e depois com o Flick. Veio muito nova para a Acendura (perto dos 10 anos de idade) e desde cedo mostrou potencial e garra, levando-nos a admirá-la e a apostar nela. Não nos defraudou. Connosco aprendeu a controlar as suas emoções e ir adiante, a adquirir a serenidade necessária ao bom desempenho, a fazer parte de um todo que sempre a estimou e que invariavelmente lhe pedia mais. Cumpriu com distinção.
Passámos com ela horas infindas numa relação quase paternal, aguentámos as suas tagarelices e os seus desalentos, o amadurecer dos seus anos e assistimos ao alcance das suas vitórias. Aqui recebeu o nome de “Jauna” e muitas vezes serviu de exemplo para miúdos e graúdos. Participou com os seus cães em várias exibições da Escola, acampou connosco e acompanhou-nos em muitas actividades no exterior. Esperamos ter contribuído para que tenha passado uma adolescência bem vivida e descontraída, pois esse era um dos nossos objectivos. Mas para mim, enquanto adestrador e condutor de homens, porque os cães não aprendem sozinhos, fica o seu exemplo de coragem, ocorrido na Serra do Socorro, quando num ataque simulado e perante o ensurdecimento do Flick, não hesitou em deitar-se sobre o figurante, protegendo-o com o seu corpo e livrando-o de qualquer dolo (deveria ter na altura 13 ou 14 anos).
O tempo passa e o futuro é dos novos, a menina do cão vermelho cresceu e entrou para Medicina. Estamos em crer que virá a ser uma excelente médica e uma profissional digna de mérito, porque a conhecemos há algum tempo e assistimos ao seu desabrochar. O progresso académico da Joana Moura não pode ser dissociado do alento e ajuda do pai, homem que em todos os momentos a acompanhou e incentivou. A Joana tem tudo para dar certo! Resta-nos agradecer à “Jauna” o muito que nos deu, a alegria e a irreverência que nos trouxe, o incómodo que nos doou vida e o sucesso que alcançou. Se Deus ouve os seus, a Joana jamais andará só, sairá vitoriosa e venceremos com ela. Já não temos conselhos a dar-lhe, somente dois comandos: “De pé e em frente”.