Um
cão bom para segurança é naturalmente resiliente, entendido muitas vezes como
muito teimoso, dono de vontade própria e dado a uma série de argumentos que chega
a pôr os nervos em franja a quem o procura ensinar. E, quanto mais potentes forem
os seu impulsos herdados ao conhecimento, à luta e ao poder, maiores e mais
variados serão os argumentos que usará para levar a sua avante, o que para
donos ou condutores nervosos, coléricos e inexperientes poderá transtorná-los e
levá-los a um profundo estado de revolta, impotência que indevidamente poderá induzir
alguns à agressão, a atitudes agressivas ou à aplicação de repelões e safanões.
Todavia, pergunta-se: se o cão não fosse assim, viria lutar mais tarde contra
um homem armado e jamais se renderia? Como todos já deveríamos saber, um cão
para guarda nunca deverá experimentar a derrota e muito menos às mãos de quem
confia. Ao invés, deverá lutar progressiva e arduamente para alcançar sempre
alcançar, pelo que deverá ser testado até ao limite sem contudo atingir a
ruptura, porque se exige que as suas incursões, perseguições e capturas se constituam
numa experiência feliz, de modo que a experiência anterior sirva de ânimo e de estimula
para aquela que imediatamente a sucede.
Debaixo
deste propósito, quando trabalhamos seriamente, não devemos deitar mão a cobaias
ou figurantes com alturas iguais ou inferiores a 165 cm de altura e com pesos
iguais ou inferiores a 50 kg. E isto porquê? Porque poderemos estar com isso a
instigar os animais contra crianças devido à sua semelhança, o que obviamente
ninguém deseja (julgo eu). Idealmente, considerando a altura média dos homens
de hoje, um figurante ou cobaia deverá ter no mínimo 176 cm de altura e entre
75 e 78 kg de peso. Se porventura for maior e um pouco mais pesado do que isso não
haverá qualquer problema, porque o cão precisará de estar preparado contra
qualquer tipo de intruso ou invasor, adequando as suas arremetidas e esquivas
de acordo com as características do seu opositor, porque doutro modo será
facilmente dominado ou eliminado. Nunca é de mais relembrar que treinar cães
para guarda é uma assunto muito sério, exige muito preparo; muita
responsabilidade e reconhecida competência, considerando a redução a zero dos ataques
inusitados e a salvaguarda da vida do animal. Por tudo isto, para além do seu
pouco préstimo, pôr “franganitos” atafulhados em fatos de ataque ou
sobrecarregados com uma manga, por mais engraçado que nos pareça, poderá reverter-se
numa trágica opção, considerando o bem-estar e a segurança das crianças e o
necessário preparo do cão – melhor será brincar às casinhas!
Preocupados
com a combatividade de um cão para tão nobre serviço, somos obrigados a
entender para que servem a ginástica e a obediência. A ginástica dá-lhe o
suporte atlético e anímico para as suas missões e a obediência o seu controlo.
Em nenhuma destas disciplinas deverá o dono fazer uso da força bruta, perder as
estribeiras ou sujeitar o cão a penosas repetições, porque o animal ao reparar
em tamanho desnorte, ao invés de se submeter, antes se tornará cada vez mais
manhoso, o que num cão duro poderá ter sérias repercussões. À falta de melhor,
os condutores menos aptos, alguns deles dificilmente ultrapassarão esta fase de
inaptidão, usam e abusam do comando inibitório “não”, acabando assim por
malbaratar um comando que futuramente poder-lhes-á fazer muita falta. Sejamos sinceros:
feliz é o cão que nunca ouviu um “não” e qualquer um só estará verdadeiramente
pronto quando o “não” for varrido do seu controlo! Como as confrontações com o
dono são indesejáveis e poderão tornar-se perigosas, há que evitar a todo o
custo situações de litígio, este deverá manter a têmpera e aprender a trocar ou
a brandir argumentos com o cão, visando o uso complementar do animal.
O
melhor argumento a favor do dono vem dos comandos que o cão já absorveu e que
são susceptíveis de mudar o seu comportamento por abandono ou distracção, quer
eles sejam direccionais, lúdicos ou de alerta (ensinar cães nunca deixou de ser
um acto inteligente). Vamos a uma situação concreta, a de um cão que ao cruzar
com os outros sempre tenta alcançá-los e nem sempre coma melhor das intenções.
Um condutor menos pensado e mais dado ao improviso dirá um “não” antes do
cruzamento e aplicará em seguida um puxão para a direita ao animal. Ao fim de
uns tantos berros e puxões, o cão acabará por ceder! Para além de se
desconhecer para onde foi a preocupação com o bem-estar do animal, pergunta-se:
será isto benéfico para um cão de guarda? E se não é benéfico para um cão de
guarda, muito menos será para um cão mais simpático e submisso, que deste modo
verá aumentados os seus medos. Proceder assim, para que não restem dúvidas, é
substituir o comando de “à frente” pelo histórico atirar de uma pedra na
direcção do animal para o “pôr a andar” (infelizmente ainda há quem persista em
permanecer na Idade da Pedra lascada).
Numa situação destas, na altura em que pretensamente soltaria o “não”, deverá o condutor captar a atenção do animal para si próprio, valendo-se de comandos que o garantam e de recompensas que o estabilizem. Ao proceder assim, ao operar a troca de alvos, gradualmente, o cão em questão irá familiarizar-se com os demais, aceitando-os como membros do seu grupo e não como inimigos, com os quais um dia teria de ajustar contas. Ao ver tanta sarrafada fico na dúvida se o adestramento é uma indústria e se os cães são robots. O ensino de um cão enquanto prática de amor e tal como a verdadeira amizade, requer e demora tempo, dispensa os sobressaltos e exige constante cumplicidade. E depois, sempre se perde mais tempo a ensinar os donos do que a educar os cães, porque os primeiros demoram a compreender e a fazer-se compreender aos animais. Seria bom que guardasse-mos na nossa memória que a primeira coisa que nos vem à cabeça pode não ser a certa quando estamos a adestrar, porque esta nobre arte está para além dos comuns instintos e actos impensados, cresce com a observação, exige rara sensibilidade e jamais dispensará o uso da razão.
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