Ao dar uma olhadela pelas publicações e jornais franceses que têm
páginas dedicadas aos animais, fiquei surpreso com uma notícia que falava da
reintrodução do urso em terras gaulesas, cujo título dizia: “PYRÉNÉES:
UNE MAJORITÉ FAVORABLE À LA RÉINTRODUCTION DE L’OURS SELON UNE CONSULTATION SUR
INTERNET” (Pirinéus: Uma
maioria favorável à reintrodução do urso de acordo com uma consulta na internet).
Dispus-me a ler o artigo e fiquei a saber que a consulta pública feita na
Internet foi organizada pela PREFEITURA DOS PIRINÉUS ATLÂNTICOS e pela REGIÃO DA OCCITÂNIA.
De acordo com os resultados publicados ontem acerca desta consulta
pública na internet, levada a cabo entre os dias 25 de Junho e 25 de Julho
deste ano, 88,9% dos participantes emitiu uma opinião favorável à reintrodução
dos ursos e apenas 8,9% se manifestou contra, os restantes votos foram neutros
ou em branco. Das 5.970 respostas registadas, 26,5% vieram dos 6 departamentos
dos Pirinéus, sendo 71,6% a favor e 25,4% contra, muito embora os resultados
sejam outros junto dos habitantes dos municípios da Montanha Bearn onde a
introdução dos ursos está prevista, porque ali os votos a favor caíram para
58,6% e os contra subiram para 41,4%. De qualquer modo, UMA
CLARA MAIORIA DE CERCA DE 6.000 INTERNAUTAS MANIFESTOU-SE A FAVOR DA INTRODUÇÃO
DOS URSOS.
A Prefeitura da Região dos Pirinéus e da Occitânia fez saber através de
comunicado que “o argumento para fortalecer a população de ursos é dominado por
preocupações ecológicas, patrimoniais, éticas e económicas”. Aqueles que opõem
a tal ideia afirmam “a incompatibilidade desta acção com a pastorícia, consideram-na
um ataque ao desenvolvimento da região e à sua segurança, uma acção inútil e
dispendiosa. Entretanto, O MINISTRO DA TRANSIÇÃO ECOLÓGICA E SOLIDÁRIA, NICOLAS HULOT (na foto seguinte), que é também um
jornalista e um activista ambiental, que em 1990 criou uma fundação com
propósitos ambientais da qual é presidente, é esperado para breve nos Pirinéus
Atlânticos PARA APRESENTAR O SEU PROJECTO DE INTRODUÇÃO
DE DOIS URSOS ESLOVENOS.
A maioria dos portugueses
desconhece que já tivemos ursos em todo o território continental e que O ÚLTIMO FOI MORTO EM 1843 PELA
POPULAÇÃO NO GERÊS. Quem se interessar por este assunto
deverá adquirir o livro “URSO
PARDO EM PORTUGAL – CRÓNICA DE UMA EXTINÇÃO”, da autoria de PAULO CAETANO e MIGUEL BRANDÃO PIMENTA,
editado em Novembro do ano passado pela Editora Bizâncio e que vale a pena ler.
Apesar da sua população reprodutora poder ter-se extinguido em meados do Séc.
XVII, assistindo-se entretanto a entrada de animais errantes vindos da Galiza, ATÉ À PRIMEIRA METADE DO SÉC.XIX, TIVEMOS
URSOS PARDOS NO PAÍS, mas a perca de habitat obrigou-os à
subida do território até chegarem ao seu último reduto no Gerês. Hoje ainda
subsistem nas regiões espanholas das Astúrias e dos Pirinéus.
Apesar da relação entre os
portugueses de outrora com os ursos nunca ter sido pacífica, porque os
consideravam animais daninhos a necessitar de destruição, exactamente como os
lobos e os linces, O
URSO PARDO NÃO DESAPARECEU POR CAUSA DA CAÇA QUE LHE FOI MOVIDA,
que foi acessória, “MAS
PORQUE O TERRITÓRIO FOI COMPLETAMENTE MODIFICADO AO LONGO DOS SÉCULOS, ACIMA DE
TUDO PELA ACÇÃO DO FOGO” – segundo disse Paulo Caetano, um dos
autores da obra atrás citada, acrescentando ainda que “ o nosso problema com o
fogo, agora tão actual, não é nenhuma novidade, tem mais de tês séculos”.
Autores dos Séculos XVII e XVIII referem que naquela época o Gerês estava
destruído pelo fogo.
A
FLORESTA AUTÓCTONE FOI SUBSTITUÍDA PELA MONOCULTURA DO PINHAL (hoje
pela do eucaliptal),
ENQUANTO OS URSOS NECESSITAVAM DE BOSQUES RICOS EM FRUTOS SILVESTRES E MEL QUE
LHES PROPORCIONASSEM ABRIGO, condições que o pinhal não tinha
para lhes oferecer. E, como um mal nunca vem só, a isto juntou-se a caça. Quando
um jornalista questionou Paulo Caetano sobre a possibilidade de os ursos
regressarem a Portugal, ele foi peremptório ao dizer que iriam morrer à fome,
já que não encontrariam um habitat apropriado e, mesmo que essa limitação fosse
ultrapassada, “AS
AUTORIDADES NÃO SABERIAM LIDAR COM ESSA SITUAÇÃO, COMO NÃO SOUBERAM LIDAR COM A
REGRESSÃO DO LINCE, a não ser criando-o em cativeiro e, mesmo
assim, seguindo Espanha”.
Em Espanha, o urso também
foi regredindo no território e refugiou-se nas altas montanhas, nas Astúrias,
onde também esteve ameaçado, mas as autoridades espanholas adoptaram medidas de
conservação e os dois grupos populacionais da espécie estabilizaram. Nas
Astúrias, "as populações acarinham muito o tema do urso, quer seja na
cidade como nas aldeias, e não têm medo, não existindo registos de
ataques", descreve o co-autor do livro “URSO
PARDO EM PORTUGAL – CRÓNICA DE UMA EXTINÇÃO”. Ao contrário,
nas zonas dos Pirenéus onde ainda sobrevive uma população muito residual de
ursos, que foi reintroduzida, estes são "constantemente perseguidos e
abatidos". É lá, do lado francês, que o Ministro Nicolas Hulot quer
reintroduzir os ursos, o que não vai ser nada fácil para eles nos dois lados
dos Pirinéus, porque “se de um lado chove, do outro troveja!”
Para que os ursos sejam
reintroduzidos, seja lá onde for, o mesmo é válido para lobos e linces, é
necessário um bom trabalho de sensibilização junto das populações, para que as
pessoas percebam que eles, ao invés de serem uma ameaça, poderão vir a ser uma
mais-valia económica como sucede nas Astúrias, onde são uma atracção turística muito
procurada. Ao falar do Urso Pardo lembrei-me automaticamente do Galo-Montês (Tetrao
Urogallus), também outrora conhecido como “Tetraz” e extinto em Portugal há
quase um século, um galináceo muito maior que uma perdiz, de cantar único, que
já chegou a habitar no Gerês e que subsiste ainda em pequeno número no Norte de
Espanha.
Lamentamos
hoje o que destruímos no passado, sem sabermos ao certo o que nos reserva o
futuro. Sim, já tivemos Ursos Pardos em Portugal!
PS. Para quem se
interessar pelo Galo-Montês, aconselhamos a compra do livro “O GALO-MONTÊS
(LINN) – REGRESSO AO GERÊS”, da autoria de MIGUEL DANTAS da GAMA, da EDITORA
CANHÕES DE PEDRA (custava 4.75€).
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