quinta-feira, 26 de novembro de 2020

O MUNDO À NOSSA VOLTA: MARADONA MORREU

 

Continuo sem querer compreender por que razão o futebol e os futebolistas têm tamanho destaque neste mundo, quando há actividades e indivíduos que melhor contribuem para o bem-estar global sem apelar ao milenar, primitivo e irracional tribalismo. Na minha geração todos os miúdos saudáveis aprendiam a jogar à bola na rua (futebol), mesmo aqueles que não tinham jeiteira nenhuma, que normalmente eram empurrados para a baliza como guarda-redes. Eu não escapei à regra e jogava regularmente como defesa nas equipas de bairro/escola, por ter pouca habilidade, não me furtar ao choque e dificilmente deixar passar adversário e bola ao mesmo tempo, sendo por isso alcunhado de “caceteiro”. Por norma, por causa de um livre ou de uma falta por assinalar, os jogos acabavam “à pera” e ninguém se furtava à peleja independentemente dela culminar à pedrada ou não! Nunca tive pretensões a ser futebolista e também não tinha como, porque faltava-me habilidade para isso e tinha um pé direito totalmente “ceguinho”, o que nunca me impediu de coleccionar cromos de futebolistas e de ouvir os relatos na telefonia (também pouco mais havia). E quando o Maradona apareceu, eu sou um pouco mais velho do que ele, inevitavelmente, segui a sua carreira nos campos e os seus faits divers fora deles.

Num convivi directamente com ele e nem sequer lhe pedi alguma vez um autógrafo, mas quem o conheceu e com ele privou, diz que era um indivíduo simples, afável e solidário, que apesar de transpirar futebol por todos os poros, preocupava-se com a pobreza e era amigo dos pobres. Também ele nasceu pobre e deslumbrou-se com a riqueza, malbaratando aquela que alcançou até se tornar desgraçadamente num toxicodependente. Por causa disso, não falta por aí quem diga que Maradona só foi um exemplo dentro das 4 linhas, onde o seu génio e talento inigualáveis o distinguiram dos demais, mas eu discordo ao saber que os homens aprendem com os seus erros, pelo que o exemplo do Maradona fora dos relvados deverá paralelamente ser considerado para que outros não caiam nos mesmos erros e desgraças.

Quanto ao futebolista, recordo-me bem de Di Stefano, de Pelé, de Eusébio, de George Best, de Gerd Müller e de tantos outros, para além de ainda observar Lionel Messi e Cristiano Ronaldo, ele foi e é incomparavelmente superior a todos e até ao momento nenhum lhe chegou sequer aos calcanhares, muito embora tivesse apenas 1,67 m, tamanho que hoje é considerado desprezível para um futebolista profissional. Em Nápoles foi rei, devolveu o orgulho aos argentinos depois da derrota na Guerra das Malvinas ao marcar 2 golos à Inglaterra nos quartos-de-final do Campeonato do Mundo de Futebol de 1986, que a Argentina viria a vencer. Os dois golos marcados ficaram para a história, um deles extraordinário e outro extra-regulamentar. O extraordinário aconteceu quando Maradona fintou todos os jogadores ingleses desde o meio-campo até à baliza adversária e fez golo, o extra-regulamentar, alcunhado mais tarde como “a mão de Deus”, fê-lo com auxílio da mão.

Maradona será sempre uma referência e uma lenda no mundo do futebol. Alguém disse, e não me recordo quem foi, que os génios nunca morrem, desaparecem, mas nunca ouvi dizer que retornavam, como por certo virá a acontecer com Maradona, no futebol ou noutra modalidade desportiva, quando de um ignoto rincón ou favela surgir outro menino pobre com um talento pouco visto e ávido de triunfar, uma luz vinda das trevas para muitos alegrar. Neste sentido, homenagear Maradona, é também solidarizarmo-nos com as crianças pobres, esquecidas e mal nutridas da América Latina, antro donde saem inesperados heróis que aumentam a nossa esperança, como se a miséria fosse o melhor dos esmeris para o talento. Descansa em paz, Diego Armando Maradona Franco, a tua corrida será reiniciada brevemente por outro. 

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