Continuo
sem querer compreender por que razão o futebol e os futebolistas têm tamanho
destaque neste mundo, quando há actividades e indivíduos que melhor contribuem para
o bem-estar global sem apelar ao milenar, primitivo e irracional tribalismo. Na
minha geração todos os miúdos saudáveis aprendiam a jogar à bola na rua (futebol),
mesmo aqueles que não tinham jeiteira nenhuma, que normalmente eram empurrados para
a baliza como guarda-redes. Eu não escapei à regra e jogava regularmente como
defesa nas equipas de bairro/escola, por ter pouca habilidade, não me furtar ao
choque e dificilmente deixar passar adversário e bola ao mesmo tempo, sendo por
isso alcunhado de “caceteiro”. Por norma, por causa de um livre ou de uma falta
por assinalar, os jogos acabavam “à pera” e ninguém se furtava à peleja
independentemente dela culminar à pedrada ou não! Nunca tive pretensões a ser
futebolista e também não tinha como, porque faltava-me habilidade para isso e
tinha um pé direito totalmente “ceguinho”, o que nunca me impediu de coleccionar
cromos de futebolistas e de ouvir os relatos na telefonia (também pouco mais
havia). E quando o Maradona apareceu, eu sou um pouco mais velho do que ele,
inevitavelmente, segui a sua carreira nos campos e os seus faits divers fora deles.
Num
convivi directamente com ele e nem sequer lhe pedi alguma vez um autógrafo, mas
quem o conheceu e com ele privou, diz que era um indivíduo simples, afável e
solidário, que apesar de transpirar futebol por todos os poros, preocupava-se com
a pobreza e era amigo dos pobres. Também ele nasceu pobre e deslumbrou-se com a
riqueza, malbaratando aquela que alcançou até se tornar desgraçadamente num
toxicodependente. Por causa disso, não falta por aí quem diga que Maradona só
foi um exemplo dentro das 4 linhas, onde o seu génio e talento inigualáveis o
distinguiram dos demais, mas eu discordo ao saber que os homens aprendem com os
seus erros, pelo que o exemplo do Maradona fora dos relvados deverá paralelamente
ser considerado para que outros não caiam nos mesmos erros e desgraças.
Quanto
ao futebolista, recordo-me bem de Di Stefano, de Pelé, de Eusébio, de George
Best, de Gerd Müller e de tantos outros, para além de ainda observar Lionel
Messi e Cristiano Ronaldo, ele foi e é incomparavelmente superior a todos e até
ao momento nenhum lhe chegou sequer aos calcanhares, muito embora tivesse
apenas 1,67 m, tamanho que hoje é considerado desprezível para um futebolista
profissional. Em Nápoles foi rei, devolveu o orgulho aos argentinos depois da
derrota na Guerra das Malvinas ao marcar 2 golos à Inglaterra nos quartos-de-final
do Campeonato do Mundo de Futebol de 1986, que a Argentina viria a vencer. Os
dois golos marcados ficaram para a história, um deles extraordinário e outro
extra-regulamentar. O extraordinário aconteceu quando Maradona fintou todos os
jogadores ingleses desde o meio-campo até à baliza adversária e fez golo, o
extra-regulamentar, alcunhado mais tarde como “a mão de Deus”, fê-lo com
auxílio da mão.
Maradona será sempre uma referência e uma lenda no mundo do futebol. Alguém disse, e não me recordo quem foi, que os génios nunca morrem, desaparecem, mas nunca ouvi dizer que retornavam, como por certo virá a acontecer com Maradona, no futebol ou noutra modalidade desportiva, quando de um ignoto rincón ou favela surgir outro menino pobre com um talento pouco visto e ávido de triunfar, uma luz vinda das trevas para muitos alegrar. Neste sentido, homenagear Maradona, é também solidarizarmo-nos com as crianças pobres, esquecidas e mal nutridas da América Latina, antro donde saem inesperados heróis que aumentam a nossa esperança, como se a miséria fosse o melhor dos esmeris para o talento. Descansa em paz, Diego Armando Maradona Franco, a tua corrida será reiniciada brevemente por outro.
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