segunda-feira, 26 de novembro de 2018

MILAGRE OU PESADELO EM COLMENAR DE OREJA?

Primeiro vamos a um excerto da notícia divulgada pelo jornal espanhol “EL PAÍS” on-line há 4 dias atrás: “… Duas mulheres, mãe e filha, de 57 e 41 anos, foram encontradas mortas depois de serem atacadas pelos seus cães em casa na urbanização Balcón del Tajo, em Colmenar de Oreja - localidade com cerca de 8.000 habitantes no sul da Comunidade de Madrid, de acordo com fontes confirmadas pelas Emergências Madrid … O ataque ocorreu depois de uma hora da tarde, de acordo com o porta-voz da emergência. A Guarda Civil indicou que os corpos das duas mulheres tinham muitas dentadas. Com estas já são cinco pessoas que ao longo de 2018 morreram em Espanha por ataques de cães”.
Os dois cães a quem são imputados os homicídios são dois Dogues de Bordéus criados pela senhora de 57 anos, a primeira vítima, seguindo-se-lhe a filha quando a procurava. Estes cães, mais outros quatro que segundo a polícia não participaram no ataque, foram sedados e posteriormente enviados para o Centro de Boas Vindas da Comunidade de Madrid, a rogo da polícia e por ordem do Ministério do Meio Ambiente. Os cães irão permanecer nestas instalações, ligadas ao Ministério da Agricultura, a aguardar os procedimentos ordenados pelo Instituto Armado, que é autoridade responsável pela sua custódia.
O caso à partida parece estar resolvido, mas estará mesmo? Serão os cães os únicos responsáveis pela morte das senhoras? Terão elas contribuído, ainda que involuntariamente, de alguma forma para o trágico acontecimento? Que tipo de coabitação mantinham com aqueles cães? Já alguma vez se tinham manifestado agressivamente contra os seus donos ou outros? Teriam sido objecto de algum tipo de treino? Quem normalmente os alimentava e saía com eles quando necessário? Qual era a relação dos animais com os maridos das vítimas? Já foram calculadas as circunstâncias exactas em que tudo ocorreu? Na família destes cães (ascendente, colateral e descendente) foram ou são visíveis fenómenos ligados à agressividade? Qual é o sexo dos cães? Eram ou não castrados? Estavam num canil ou viviam à solta e encontravam-se amatilhados? O que pensam os maridos das vítimas acerca do ocorrido? O que dizem vizinhos e empregados sobre os cães?
Se os cães falassem, ninguém melhor do que eles responderia a estas questões, mas como não falam, alguém terá que encontrar respostas para o ocorrido mediante testes e apreciações, já que os animais terão que ser desnudados simultaneamente dos pontos de vista genético, ambiental e social, desnudo que só será completo quando ouvidas as pessoas ao seu redor e apreciado o seu relacionamento com eles, para se poder aquilatar da sua autonomia, a quem obedeciam e grau de submissão.
Nesta matéria, até prova em contrário, dou sempre o benefício da dúvida aos cães, que segundo a justiça popular, plena de cinófobos, já se encontram condenados ainda antes de o serem. O meu cepticismo advém-me do muito que presenciei, já vi e ouvi, da experiência vivida com cães ao longo de décadas, da maldade que tenho observado e do facto dos cães poderem ser facilmente induzidos ou ludibriados. Também porque sei que muita gente tem em casa, ao invés de cães, uns ilustres desconhecidos, acabando invariavelmente surpreendida da pior forma possível. Nestes episódios de triste e má memória, há sempre que considerar se o sucedido, aconteceu por ignorância, desrespeito ou indução, porque os cães são reactivos e também não se escusam a agradar.
Já treinei alguns Dogues de Bordéus, não posso dizer muitos porque não os há cá, e todos os que me foram confiados, apesar do temor que os acompanha, nunca se mostraram deliberadamente agressivos ou dispostos a encetar acções ofensivas por si mesmos, o que não impede que ao sentirem-se ameaçados partam para cima seja de quem for, que avancem sobre qualquer um quando tal lhe for ordenado ou que defendam um perímetro quando condicionados para isso. A maioria dos Dogues de Bordéus, e agora falo pelo parecer de entendidos internacionais sobre a raça, quer é festas quanto baste, que os deixem em paz, entregues a uma política de “come e dorme”, a raros galopes e a excursões feitas em passo de andadura (já vi excepções que confirmam a regra).
Por tudo isto tenho dúvidas que estes cães sejam os únicos responsáveis pelo sucedido, mas também sei que os "milagres" acontecem, que há gente que se põe a jeito sem saber, que sem querer deixa de ludibriar a morte que a todos espreita e alcança. Oxalá os cães sejam os únicos responsáveis pelo homicídio das duas senhoras, porque doutro modo estaremos novamente perante um pesadelo.

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