Hoje vamos contar sucintamente
para os nossos leitores a história do Sargento Stubby, o cão de guerra mais condecorado
da I Guerra Mundial, conflito que ocorreu entre 28 de Julho de 1914 e 11 de
Novembro 1918. O Stubby foi encontrado a vaguear pelo campus da Universidade de
Yale em New Haven/Connecticut/US, em Julho de 1917, local onde os soldados do 102º Regimento de Infantaria da 26ª Divisão norte-americana treinavam para serem
enviados a França. Este pequeno cão de raça indefinida, provavelmente
aparentado com o American Bull Terrier ou com o Boston Bull Terrier, raças na
altura em fase embrionária, era tigrado de castanho e branco, media 16 cm de
altura, pesava 8 kg, tinha o nariz preto e os olhos grandes, redondos e
escuros. Os seus membros posteriores eram musculados e de recta angulação. Por
ter a cauda curta ganhou o nome de Stubby, obra do então Cabo Robert Conroy,
que veio a apaixonar-se por ele e que nunca mais o largou.
Pouco a pouco, ao acompanhar
a instrução daqueles soldados, ao conhecer os toques de clarim, ao comparecer
às formaturas e depois de ter aprendido a fazer a continência, Stubby começou a
transformar-se na mascote do 102º Regimento de Infantaria por ter um efeito
positivo sobre os seus homens, acabando por ser levado e aceite excepcionalmente
no seu acampamento, apesar da presença de cães não ser ali permitida. Chegada a
hora da partida para a Europa, a Divisão foi embarcada no “SS Minnesota” e o
Cabo Conroy conseguiu colocar clandestinamente o Stubby a bordo, escondendo-o
numa caixa de carvão até alcançarem alto mar. A maioria dos soldados alegrou-se
ao ver a sua mascote ali. Quem não ficou nada satisfeito com a novidade foi
o comandante directo de Conroy, que acabou por aceitar o cão a bordo pela
continência que lhe prestou. O Stubby acabaria por chegar à “frente ocidental”
da Guerra a 5 de Dezembro de 1918, no Chemin des Dames, ao norte de Soissons, onde
ficou dia e noite debaixo de fogo durante um mês.
Ainda mal ali tinha chegado,
debaixo dos tiros e explosões constantes a que teve de acostumar-se, provenientes
das espingardas e da artilharia pesada, o Stubby sofreu a sua primeira lesão
por exposição ao gás mostarda, sendo levado para um hospital de campanha
próximo, onde foi tratado ao lado dos seus companheiros de duas pernas, saindo
de lá perfeitamente recuperado mas com uma maior sensibilidade ao gás. Graças a
essa sensibilidade, durante um matutino ataque alemão com gás às trincheiras da
sua Divisão, enquanto a maioria dos soldados dormia, o pequeno cão de guerra
reconheceu o gás e correu a avisar toda a trincheira, ladrando e mordendo os
soldados para que acordassem, acção que evitou muitas lesões e poupou muitas
vidas.
Nas trincheiras aprendeu
também a diferenciar os soldados de língua inglesa e dos de língua alemã, a
ladrar nos locais onde os feridos de língua inglesa se encontravam até que os
paramédicos cuidassem deles e os resgatassem, servindo em simultâneo de guia no
regresso dos soldados perdidos à segurança das trincheiras. Certo dia em
Argonne, Stubby detectou um espião alemão dentro das trincheiras americanas e
este dirigiu-se-lhe em alemão. O pequeno cão reconheceu o idioma e atacou o
soldado inimigo, mordendo-lhe nas pernas, desequilibrando-o e mantendo-o no seu
lugar até à chegada de tropas americanas. Por haver capturado esse espião,
Stubby foi promovido a Sargento por indicação do Comandante do 102º Regimento
de Infantaria onde servia, sendo o primeiro cão a merecer essa graduação nas Forças
Armadas dos Estados Unidos, ultrapassando assim o posto do seu dono, o Cabo
Robert Conroy. Depois da reconquista de Château-Thierry pelos americanos, as
senhoras daquela cidade francesa fizeram-lhe um casaco de camurça onde orgulhosamente foram postas as suas muitas medalhas.
Este herói canino do exército
norte-americano foi ferido pelo menos mais uma vez, quando numa batalha alguns
soldados alemães em retirada se serviram de granadas, vindo alguns estilhaços a
alojar-se no seu peito e pernas. Stubby foi primeiro enviado para um hospital
de campanha e depois para um Hospital de Recuperação da Cruz vermelha, onde foi
sujeito a uma cirurgia adicional e recuperou plenamente, animando enquanto
convalescia os soldados ao seu redor e aumentando a moral dos combatentes no regresso às trincheiras. Durante a guerra tornou-se ainda hábil em ouvir os
carregamentos das peças de artilharia alemães antes do seu disparo. Ao serviço
do 102º Regimento de Infantaria serviu nas trincheiras 18 meses, participou em
4 ofensivas e em 17 batalhas.
De volta a casa, Stubby
foi objecto de inúmeras homenagens, liderou muitos desfiles de tropas, visitou
a Casa Branca por duas vezes, conheceu os presidentes Woodrow Wilson, Calvin
Coolidge e Warren G. Harding, sendo muitas vezes condecorado pelo seu heroísmo,
inclusive com a Medalha da Humane Society pelo General John Pershing,
Comandante-geral das Forças Armadas dos Estados Unidos da América. Quando
Conroy e Stubby se estabeleceram em Georgetown, o cabo cursou direito e o cão
tornou-se na mascote da Georgetown Hoyas (equipa de basquetebol masculino da
Universidade de Georgetown).
Para se ter uma ideia das
condecorações atribuídas a este cão, passamos a citá-las: 3 listras de serviço;
Ying Patch da Yankee Divison; Medalha de Honra Francesa; 1ª Medalha Anual da
Convenção Americana; Medalha dos Veteranos de New Haven da I Guerra Mundial;
Medalha da Grande Guerra da República Francesa, Medalha da Campanha de ST.
Michel e Purple Heart.
Em 1926, não se sabe se
com 9 ou 10 anos de idade, Stubby morreu, merecendo um obituário de meia página
no New York Times, obituário bem mais extenso que os normalmente dedicados às
pessoas notáveis daquela época. Em 1956 Robert Conroy entregou Stubby ao Smithsonian
Institute, onde se encontra preservado e exposto com as suas medalhas (molde de
gesso envolto na sua pele).
Este pequeno cão de guerra
foi ainda objecto de um retrato pelo famoso artista Charles Ayer Whipple e continua
a ser lembrado e homenageado tanto nos Estados Unidos como na Europa, merecendo
inclusive quatro livros que pretendem explicar para as crianças o que foi a I
Guerra Mundial.
Está previsto para 2018 um
filme de banda desenhada em sua honra, com as vozes de Logan Lerman, Helena
Bonham Carter e Gérard Depardieu. A música estará a cargo de Patrick Doyle e a animação
será feita no Estúdio Mikros Image, de acordo com um projecto oficial aprovado pela
Comissão do Centenário da Primeira Guerra Mundial dos Estados Unidos.
Aqui para nós que ninguém
nos ouve: assim como o cão valeu àqueles homens, o que seria dele sem a sua
ajuda? Teria aprendido por si o suficiente para sobreviver? Homens e cães só fazem
grandes equipas se cada um deles fizer a sua parte. Nós continuamos a equipar
homens e a educar cães para que isso aconteça uma e outra vez, vezes sem conta.
Quanto ao Stubby, duas palavras bastam para defini-lo: lealdade e coragem!
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