Vamos aos factos. Nicky,
um Pastor Belga Malinois de oito anos, nascido na Holanda e incorporado na
Unidade K9 do Departamento de Polícia de Las Vegas/USA, que já havia sido
brutalmente esfaqueado na cabeça em serviço, acabou abatido a tiro, no dia 31
de Março deste ano, ao que parece por fogo amigo, durante a perseguição
empreendida por 4 polícias a um presumível duplo homicida. Na última
Quarta-feira, dia 06 de Abril, no Cemitério de Craig, local destinado ao
sepultamento de cães-policia, onde já descansam 50, realizou-se o seu funeral e
sepultamento, que contou com a presença de todos os binómios disponíveis
daquele corpo policial, para além de muitos outros elementos do Departamento de
Polícia de Las Vegas, numa cerimónia oficial que para além da evocação do
falecido, teve direito aguarda de honra e a uma salva de tiros protocolar,
culminando com a entrega da bandeira americana ao Sargento Eric Kerns, que
proferiu o seu elogio fúnebre e que foi seu parceiro nos últimos 3 anos. A
notícia chegou-nos através de agências noticiosas inglesas e norte-americanas.
Diante da solenidade do
acto realizado pergunta-se: não terá sido exagerado? Não creio que tenha sido.
E não creio porque um cão-polícia é para todos os efeitos, tanto no papel como
na vida, um agente igual aos seus parceiros humanos, merecendo o mesmo respeito,
admiração e honras, por dividir com eles idênticas missões e o próprio destino,
salvando-lhes muitas vezes a pele ao alertá-los, ajudá-los e socorrê-los,
chegando a dar a vida por eles, muito embora não saiba ao que vai e responda
segundo a preparação que recebeu, engano que jamais será reparado e que obriga
os seus parceiros a louvá-lo pelo sacrifício da sua vida. E assim sucedeu no cerimonial
fúnebre do Nicky: um polícia que morreu no cumprimento do dever.
Será justo tornar cães
inocentes em “carne para canhão”? Justo não será certamente, contudo conveniente,
face ao especismo que justifica o seu uso, porque são recrutados e morrem para
poupar vidas humanas (os cães de guarda encontram-se sujeitos ao mesmo fado).
Como usamos os cães para este fim há milhares de anos e a humanidade se
encontra em constante evolução, é possível que no futuro tal deixe de suceder e
venham a ser substituídos por máquinas ou por outros meios igualmente pouco
dispendiosos, porque é um contra-senso dizer que gostamos deles e industriá-los
depois para a morte. Sim, chegará o dia em que deixaremos de malbaratar a vida
dos outros animais nas nossas guerras, como ainda há pouco tempo aconteceu com
os cavalos.
Ainda que a perca dum cão
destes seja para a restante comunidade uma baixa se somenos importância (alguns
relativizá-la-ão de imediato e outros até a ridicularizarão), para os seus
parceiros não o é, porque não existem dois cães iguais e quando morre um cão
destes, desaparece também e para sempre parte da vida dos seus companheiros. E
isto é tão verdade que já chorei e ainda choro a perca de alguns cães que me
acompanharam ao longo do meu trajecto, animais únicos que jamais vi
reencarnados e que deixaram profunda saudade, por vezes até remorsos, por ter
sido com eles pouco condescendente face à sua finidade. E se há coisas ainda
por explicar, o amor pelos cães é uma delas, porque não há termo nem conceito
capaz de explicá-lo cabalmente.
Quem foi militar
profissional, quer queira quer não, sê-lo-á para sempre, porque até sem dar por
isso, aqui e ali, nisto e naquilo, as marcas da sua formação virão ao de cima e
levá-lo-ão a ver o mundo com outros olhos, numa primeira fase a necessitar de disciplina
e na derradeira carenciado de amor (é nesta em que me encontro). Ao olhar para
a apresentação dos membros do Corpo Cinotécnico do Departamento de Polícia de
Las Vegas presentes naquele funeral, que contrastava com a dos restantes
polícias ali presentes, lamentei-os pela falta de brio militar, má
uniformização e parco espírito de corpo, lembrando-me em tudo uma polícia dum
país meridional da CEE, que com fardas da cor de “fato-de macaco”, por vezes
até gastas, desbotadas e russas, vem para a rua no cumprimento do seu dever,
julgando com isso ter-se tornado mais operacional.
O Nicky morreu e já foi
sepultado, breve outros cães-polícia terão o mesmo destino e repetir-se-á a
mesma homenagem. Chorará quem tiver de chorar mas os cães não chorarão
certamente!
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