segunda-feira, 28 de agosto de 2023

DOENÇAS CARDÍACAS RELACIONADAS COM DIETAS CANINAS

 

Desde que a Food and Drug Administration (FDA) (1) alertou pela primeira vez sobre uma possível ligação entre uma doença cardíaca canina potencialmente fatal e alimentos para animais de estimação “sem grãos” em 2018, proprietários e veterinários continuaram a relatar casos de cães a desenvolverem cardiomiopatia dilatada relacionada à dieta ou CMD. A CMD é uma doença que aumenta o volume do coração, deixando-o mais fraco e menos capaz de bombear o sangue. Algumas raças maiores de cães, como Golden Retrievers e Dogues Alemães, são susceptíveis à doença. A contagem mais recente da FDA relativa a cães e a um número muito menor de gatos com CMD relacionada com a dieta foi de 1.382 casos, 255 dos quais foram determinados entre 1 de agosto de 2020 e 1 de novembro de 2022. Em 2019, a FDA denunciou 16 marcas de ração para cães associadas à forma rara desta doença cardíaca, muito embora não tenha sugerido aos proprietários que parassem de dar aquelas marcas aos seus animais de estimação, que geralmente contêm altos níveis de ervilhas, lentilhas e batatas. Pesquisadores e veterinários ainda não sabem exactamente como é que essa comida para cães e gatos pode causar danos no coração de alguns animais de estimação, mas um estudo publicado em 2021 sugeriu que o responsável poderia ser o alto nível de ervilhas em certos alimentos destinados aos pets.

Esta descoberta foi apoiada em maio, quando cientistas canadianos publicaram um estudo sobre os efeitos de uma dieta de 28 dias em oito cães beagle adultos, uma raça escolhida porque não é conhecida por ser susceptível a problemas cardíacos. Os pesquisadores veterinários da Universidade de Saskatchewan alimentaram os cães com uma desta três dietas: uma dieta tradicional; uma dieta sem grãos rica em lentilhas e uma dieta sem grãos rica em ervilhas, repetindo o experimento com as outras duas dietas para que todos os beagles experimentassem as três. Os pesquisadores observaram “alterações semelhantes às da CMD” em cães que consumiram a dieta de ervilhas durante 28 dias. Ainda não está claro aquilo que as ervilhas podem estar a prejudicar os corações dos animais de estimação, disse a autora sénior do estudo, Lynn Weber, professora de ciências biomédicas veterinárias da Faculdade Ocidental de Medicina Veterinária da Universidade de Saskatchewan. Uma possibilidade é a quantidade de fibra nas ervilhas. “Suspeito que se removermos todas as ervilhas de todos os alimentos para cães e gatos, ainda teremos um problema”, disse Weber, observando que são necessárias mais pesquisas para descobrir o que há nas ervilhas e possivelmente noutros ingredientes que levem a danos cardíacos.

A melhor evidência que relaciona a CMD a certas dietas é que o coração dos cães melhora quando eles mudam para uma dieta tradicional, disse a Dra. Aly Cohen, veterinária associada do Riney Canine Health Center e instrutora clínica do Maddie's Shelter Medicine Program da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de Cornell. O pico no número de relatórios – 608 entre o dia 1 de maio de 2019 e 31 de julho de 2020 – ocorreu logo depois que a FDA divulgou as marcas dos alimentos para animais de estimação que pareciam estar ligados ao desenvolvimento da CMD. A porta-voz da FDA, Veronika Pfaeffle, observou que a investigação da agência sobre o assunto continua, mas alertou contra a leitura excessiva das novas estatísticas. “Embora os números de eventos adversos possam ser um sinal potencial de um problema com um produto regulamentado pela FDA, por si só, eles não fornecem dados suficientes para estabelecer uma relação causal com o(s) produto(s) relatado(s)”, disse Pfaeffle por e-mail. A FDA não fez recall de nenhum produto alimentar para animais de estimação e a agência não planeia divulgar mais actualizações públicas até que “haja novas informações científicas significativas para divulgar”. Embora a taxa de novos casos pareça ter diminuído, os especialistas dizem que o problema pode ser mais generalizado do que o número de relatórios sugere.

O Dr. William Rausch diz que o seu consultório de cardiologia ainda vê cerca de um caso novo por semana. E como os estudos descobriram que os cães podem desenvolver CMD durante anos sem sintomas, “isso sugere que, para cada caso que vejo, há muito mais [cães] a andar por aí que parecem normais, mas que estão a desenvolver a doença”, disse Rausch, cardiologista veterinário em consultório particular e professor adjunto da Universidade de Washington em Seattle. O Pet Food Institute, um grupo industrial que representa a maioria das empresas de alimentos para animais de estimação nos EUA, agradece a atenção da FDA ao assunto, disse Sherri Kirk, porta-voz da organização, por e-mail. “Os nossos membros continuam a desenvolver pesquisas para determinar os ingredientes mais seguros e da mais alta qualidade para fornecer ração completa e balanceada para ajudar os cães a terem uma vida longa e saudável.” Em contrapartida, na maioria dos casos, os cães não apresentam quaisquer sinais até apresentarem insuficiência cardíaca, disse a Dra. Terri DeFrancesco, professora de cardiologia e cuidados intensivos da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Estadual da Carolina do Norte. Os principais sintomas da cardiomiopatia dilatada relacionada com a dieta ou CMD, são: actividade diminuída; cansaço; letargia; tosse; falta de ar e diminuição do apetite.

Para os donos de cães e gatos, a descoberta de que alimentos cuidadosamente escolhidos podem ter danificado o coração do seu animal de estimação pode ser doloroso. Julie Carter ficou chocada quando seu golden retriever Oliver, de 3 anos e meio, foi diagnosticado primeiro com sopro no coração e depois, após um ecocardiograma, com CMD completo em fevereiro de 2018. Pouco tempo depois, o outro golden retriever de Carter foi também diagnosticado com CMD, mas num estágio anterior ao de Oliver. Depois de explicar a condição, o veterinário de Carter perguntou que tipo de comida Oliver estava a comer. “Foi realmente horrível pensar que eu poderia ter sido responsável de alguma forma por causa da escolha de sua dieta”, disse a residente de Florham Park, Nova Jersey, à NBC News. Carter foi obrigada a trocar de ração para os dois cães, fazendo uso de uma com uma fórmula mais tradicional e iniciou-lhes a medicação para o coração. Mas o dano no coração do Oliver foi muito grande e seis meses depois morreu. O outro cão de Carter, Riley, foi finalmente recuperado. Antes do primeiro comunicado anunciado pela FDA, alguns veterinários já observavam casos de CMD que pareciam estar relacionados com certos alimentos para cães. “O primeiro caso que vi foi em 2017”, disse DeFrancesco. A cardiologista veterinária disse que costumava relatar todos os casos, mas com a cobertura jornalística do assunto e a perca do funcionário que cuidava dos relatórios da FDA, ela foi obrigada a parar.

É provável que os relatórios enviados à FDA sejam apenas a ponta do iceberg, porque muitos proprietários e veterinários não têm tempo para preencher os formulários, disse DeFrancesco. DeFrancesco acredita que o CMD relacionado com a dieta é provavelmente multifactorial, com alguns animais de estimação a herdar uma susceptibilidade genética que é desencadeada por certos tipos de dietas. “Milhões de cães comem estas dietas, mas milhões não contraem CMD”, disse ela, acrescentando que aconselha os donos de animais de estimação a evitarem fórmulas não tradicionais porque não se pode saber antecipadamente se um animal de estimação pode ser susceptível. Existe uma maneira simples para os donos de animais de estimação determinarem se uma marca de ração não tradicional é boa para os seus cães: verificar o seu coração, disse o Dr. Joe Bartges, professor de medicina interna, radiologia intervencionista e nutrição no Centro Médico Veterinário do Universidade da Geórgia. “Existem biomarcadores que podem verificar se o músculo cardíaco foi danificado”, disse Bartges, acrescentando que os veterinários podem realizar um exame de sangue que mede os níveis de uma proteína chamada BNP.

Cohen, da Cornell, aconselha os proprietários a evitar quaisquer alimentos para animais de estimação que tenham entre os 10 principais ingredientes ervilhas; lentilhas; grão-de-bico, batata ou batata-doce. Mesmo com a cobertura noticiosa da CMD relacionada com a dieta, ainda há proprietários que não estão familiarizados com o assunto. Carter, que participa de um grupo CMD no Facebook, ouviu recentemente falar doutro proprietário de um golden retriever cujo cachorro morreu devido à doença. “O seu golden retriever de 5 anos morreu há dois meses depois de ser alimentado com uma das dietas ligadas a esta doença”, disse Carter. “A perca dele atingiu-me muito, especialmente considerando a idade e a raça de seu cachorro. Abaixei a cabeça na mesa e chorei.” Está tudo dito, não há mais nada a acrescentar!

(1)FDA - FOOD AND DRUG ADMINISTRATION, é uma agência federal do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos, um dos departamentos executivos federais dos Estados Unidos que regula e fiscaliza os alimentos para pessoas e animais entre outras tantas coisas. 

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