À
imitação de tantas coisas inexplicáveis ou ainda por explicar, a sorte dos
principiantes só acontece esporadicamente e não dura para sempre. Na hora de
comprar um cão de determinada raça surge de imediato uma questão: a quem
comprar. Esclareço deste já que não sou contra quem vende cães nem tampouco
contra quem os vai buscar aos abrigos – só a favor de ambos - porque fui
proprietários de uns e de outros e nenhum me desapontou. Mas se porventura
procura um cão de raça a quem deverá comprá-lo: a um profissional com uma linha
de criação própria ou a alguém inexperiente que decidiu fazer uma ninhada?
Permitam
que vos conte uma história acontecida aquando das minhas andanças pelas
benditas terras brasileiras num concurso de cavalos Manga Larga. Naquela
competição, dois cavalos de idêntica qualidade chegaram à final, havia que
escolher um vencedor e a escolha não estava fácil. Depois de algum meditar, o
juiz acercou-se de um dos proprietários e disse-lhe em voz baixa: “Me
desculpe, o senhor tem um cavalo tão bom ou melhor do que o do seu concorrente.
Contudo, ele é criador da raça faz muito tempo e você é primeiro cavalo da raça
que tem. Assim, vou atribuir o primeiro lugar ao cavalo do seu concorrente,
pelo que ele tem feito pela raça.” Ao aperceber-me daquele critério,
revoltei-me a princípio, mas depois percebi quanto foi sábio, porque o cavalo
do proprietário experiente era resultado do saber e o do outro produto da
sorte. O primeiro produzia cavalos de qualidade e o segundo comprou aquele
cavalo cujas características podia não transmitir à sua prole. Com os cães
passa-se exactamente o mesmo e com as pessoas também, quando dois pais bonitos
dão um filho feio e vice-versa.
Escolher
entre comprar um cão a um profissional com uma linha de criação definida ou a
um criador ocasional não é fácil, porque os dois têm vantagens e desvantagens
face ao cão perfeito que está para vir. Quando compramos um cão pertencente a
uma determinada linha de criação, sabemos à partida com o que contamos, quais
são as suas características principais, as suas virtudes e defeitos, as doenças
a que concorre e a sua esperança média de vida, informação detalhada que é
fornecida pela endogamia e pela consanguinidade, cujo excesso é por demais lesivo
dos indivíduos seus resultantes. A somar a isto, porque os criadores
profissionais vivem dos cães, um pequeno grupo deles é tentado a tirar da
barriga dos cães para o seu bolso, a desleixar-se no seu cuidado, colocando
invariavelmente cachorros para venda com reprovável apresentação, demasiado
leves e a lembrar o algodão.
Já
os criadores ocasionais, particularmente aqueles que fazem a sua primeira
ninhada, apresentam cachorros bem nutridos e de excelente apresentação,
eventualmente menos fustigados pela endogamia e pela consanguinidade, não
olhando a despesas para os criar, levando tudo à risca e dispensando aos
cachorros o mais esmerado dos cuidados. Como criadores inexperientes que são, é
possível que tenham sido aldrabados na compra dos progenitores dos cachorros,
acabando por comprar cães de sofrível ou de dúbia qualidade, portadores de
doenças e defeitos que ignoravam e que mais tarde se virão a manifestar nas
ninhadas. Gente assim, mercê de pouco conhecimento, acaba por comprar cães por
simpatia, normalmente à revelia da qualidade, o que não obsta por vezes, por
via da sorte, que venham a produzir excelentes exemplares (a dita sorte dos
principiantes). Contudo, como estes cachorros não pertencem a uma linha de
criação definida a quem possamos recorrer para estudo prévio, não passam de uns
ilustres desconhecidos que se irão desvendando ao longo das suas vidas.
No meu modesto entendimento, resultante de ter sido criador e de ter acompanhado e treinado dezenas de milhares de cachorros, devemos comprar o cachorro do qual obtivermos maiores informações sobre os seus ascendentes, relativas à sua saúde, morfologia, psicologia, inteligência e biomecânica para diminuirmos a margem de erro na escolha. Obviamente que nada disto dispensa a análise dos impulsos herdados presentes no cachorro escolhido, para que a sua maior ou menor potenciação se coadune com as nossas expectativas. Para que isso aconteça temos que saber de antemão para que queremos o animal. Posso comprar um cachorro a um criador amador? Posso, se tiver como descortinar a sua herança genética, o que raramente é possível e que me remete automaticamente para os criadores profissionais com diferentes linhas de criação. A regra é esta: Depois de avaliados os prós e os contras, primeiro escolhe-se a linha e só depois o cachorro.
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