Os portugueses são por
norma gente muito desenrascada, o que seria uma vantagem caso não andassem em
contínuo desenrascanço. Numa das intermináveis viagens de ônibus que fiz para o Sul do Brasil, vindo de São Paulo Capital,
mais precisamente do Terminal Rodoviário do Tietê (oficialmente baptizado por “Terminal
Rodoviário Governador Carvalho Pinto”), no meio da noite e em lugar ignoto, dou
com um casal de portugueses, gente de provecta idade, que ia sentado lado a
lado, alguns lugares à minha frente que, apesar do adiantado da hora, não
paravam de sussurrar um para outro. Mais adiante começaram a aparecer as luzes
de um lugarejo e o motorista anunciou uma mui desejada paragem. Inesperadamente
oiço o português a perguntar para a mulher:” Tens um lenço?” Ela disse-lhe que
não e ele disse-lhe que não importava, que sabia como desenrascar-se.
Aproveitando-se da escuridão e da sonolência dos restantes passageiros, antes
de levantar para ir ao seu destino, o homem assoou-se à cabeceira do seu banco
e voltou a colocá-la no seu lugar, saindo na maior das calmas como se nada se
passasse. Quando entrou um novo passageiro e foi para o seu lugar, eu nem quis
ver o que aconteceu, apesar de não ser necessário, porque os impropérios eram
mais do que muitos.
Neste último Domingo,
manhãzinha cedo, dou com um indivíduo a apanhar o cocó do cão que trouxe à rua.
Entregue ao seu dever cívico-higiénico, o asseado homem deixou o cão solto, um
latagão com mais de 40kg, nada confiável, de raça suspeita, amigo de atacar
outros cães e de ameaçar pessoas. Por sorte, parece que ela não protege só os
audazes mas também os tontos, não passou por ali vivalma, nem pessoa nem
animal, a não ser eu, que dispensava ver aquela insanidade fratricida e anti-social
(sem querer, o homem estava a borrifar-se nos outros). O acontecido,
afortunadamente sem nefastas repercussões, resultou do desenrascanço que
desconsidera os procedimentos e protocolos. Você, quando estiver na via pública
e o seu cão defecar, não proceda da mesma maneira, prenda primeiro o animal e
faça a extracção das suas fezes depois. A sociedade ficar-lhe-á grata,
principalmente as crianças, os mais idosos e os cães toy, alvos preferenciais
da fúria de cães obstinados.
Mais,
deixar o seu cão solto na incerteza do seu retorno não será seguramente a
melhor das opções, porque poderá afastar-se para onde não deve e ficar na “boca
do lobo”, entregue aos dentes de um mais valente do que ele ou ir para a
estrada e ser atropelado, para já não falarmos do dolo que poderá causar a
terceiros. Nunca se esqueça que o desenrasca é uma solução temporária forçada
pelas circunstâncias, enquanto o apego aos procedimentos salva vidas. Será que
é por causa do excesso do desenrascanço que o desejado Quinto Império teima em
chegar-nos?
PS: Caso não tenha onde
prender o seu cão, mande-o sentar e mantenha-o seguro pela trela. Se o acostumar
a fazer as necessidades sempre no mesmo sítio, basta escolher o local mais indicado
para isso, que obviamente deverá ter algo onde possa prendê-lo.
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