Parem de mentir! Estou
farto de ouvir dizer que todas as raças caninas nascem boas e que são os donos
que as fazem más, que os indivíduos de determinada raça necessitam de um dono
experiente, decidido e disponível, como se todos os donos fossem experientes, disponíveis,
seguros e valentes, quando sabemos que sucede exactamente o contrário, como se
a liderança, o sangue frio e a coragem fossem uma questão de opção. E mesmo que
assim fosse, as possíveis vítimas dos cães teriam essas características, nomeadamente
as crianças e os idosos que são os alvos preferenciais dos seus ataques? Há por
aí demasiada gente a palrar sobre cães, na sua maioria urbana e provavelmente
bem-intencionada, que ao abraçar teorias, coloca em risco a sua vida, a dos
seus e a dos outros. Por outro lado, e isto é importante que se diga, há por aí
quem procure, deliberadamente, cães “filhos da mãe” para assustar ou fazer mal
a outrem, acabando sempre por encontrá-los! E quando o disparate acontece e
alguém vai desta para melhor, as razões dos ataques são na sua maioria
desconhecidas?!
Em BRUGNERA,
comuna italiana da Região de Friuli-Venezia Giulia, Província de Pordenone, no
nordeste do país, um homem de 74 anos foi atacado e morto por dois AMSTAFF
pertencentes a um parente seu vizinho que os tinha para defesa, quando os foi
alimentar. O defunto já conhecia os cães há anos e nunca tinha havido até
ali algum mal-entendido entre eles. Quando o septuagenário gritou de dor, a
sua esposa veio em seu socorro, acabando também ela mordida, ainda que sem
gravidade. Antes da chegada de socorro e vendo a aflição em que os seus
pais se encontravam, o filho do casal pegou numa arma e abateu um dos cães. O cão
sobrevivente foi confiado a um veterinário até ser decidido o seu futuro, os
donos dos cães irão responder a tribunal e o Prefeito de Brugnera, Renzo Dolfi,
estendeu as suas condolências à família enlutada.
Apesar de ser possível,
não creio que o dono dos cães tenha mandado a vítima alimentá-los face ao
serviço a que se destinavam, a menos que fosse por demais ignorante, sofresse
de algum delírio súbito ou intentasse livrar-se do septuagenário. O mais
provável e nisso deverá basear-se a defesa dos proprietários dos cães, é que o
idoso tenha entrado no recinto confiado aos animais de livre e espontânea vontade,
provavelmente com restos de comida. E dizemos isto porquê? Porque a vítima e os
cães já se conheciam há anos e também devido ao facto da sua esposa ter sido
mordida sem gravidade, o que aponta para a comida como causa provável do ataque
e não para a territorialidade presente na raça dos animais. É possível, perante
a dificuldade em distribuir a comida, que o idoso tenha repreendido ou impedido
algum dos cães de alcançá-la, o que seria motivo mais do que suficiente para
ser atacado, atendendo à habitual sofreguidão canina por comida confeccionada,
carne crua e ossos.
Todavia, pergunta-se: cães
menos poderosos e com uma menor potência de mordedura teriam morto aquele homem
quase instantaneamente como foi o caso? É evidente que não, como é evidente que
há uma vontade latente do dono dos animais em se constituir justiceiro e causar
sério dolo a terceiros. No caso dos Amstaff, que receberam uma infusão de
territorialidade que os Pitbulls seus primos-irmãos não têm, o que os torna
mais propensos para atacar pessoas do que os seus parentes dos ringues, sabe-se
ainda que em algumas linhas da raça proliferam indivíduos que se descontrolam
quando cheiram sangue, tornando-se praticamente impossível detê-los, pormenor que tem levado alguns a dar-lhes dietas sensíveis à vegetariana.
Este fim-de-semana assisti
a uma exibição onde um cão pretensamente ia resgatar uma criança. Atendendo ao
tamanho e fragilidade do resgatado, o tratador do cão achou por bem açaimá-lo e
agiu correctamente, porque os acidentes acontecem e tanto a procura como a captura
de uma pessoa dependem do mesmo instinto canino – o de caça, sendo por isso
difícil encontrar um cão que desempenhe cabalmente estes dois distintos
serviços (por alguma razão usamos labradores e outros cães de boa índole na
detecção de drogas). Se usássemos Amstaffs no resgate de pessoas que não os
seus donos, teríamos obrigatoriamente que açaimá-los, particularmente diante de
resgatados feridos. Cães com esta potência de mordedura, caso aguentassem,
estariam melhor no Alasca do que nas nossas cidades, porque lá seriam úteis
para defender os seus donos da gula e dos ataques dos ursos pardos, podendo
também dar uma preciosa ajuda aos russos da República da Carélia.
Um cão assim é uma arma e
as armas não deverão ter venda livre diante dos direitos humanos, conforme
temos visto noutras latitudes, onde as vítimas inocentes não param de aumentar
e jamais pararão enquanto qualquer um puder adquirir a arma que pretender. Como
a maluqueira da corrida aos cães perigosos não difere da corrida às armas de
defesa, vale a pena perguntar: os cães de raça perigosa têm eliminado mais
bandidos ou pessoal de casa? Quem mais atacam, quem lhes faz frente ou crianças
e idosos? Há em tudo isto muito desrespeito, ignorância, cobardia e maldade. Um
cão destes, mesmo que cesse os seus ataques imediatamente à ordem, pode já ter
provocado danos irreversíveis numa vítima acidental.
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