quinta-feira, 24 de outubro de 2019

CÃES: BIOTECNOLOGIA AO SERVIÇO DA ARQUEOLOGIA

Cães primeiro usados para farejar túmulos em investigações criminais, têm vindo a descobrir túmulos da Idade do Ferro na Croácia que datam de quase três mil anos. Estes cães farejam baús que contêm ossos e artefactos humanos num forte situado numa colina das montanhas Velebit, ao longo da Costa do Adriático. De acordo com alguns especialistas, o uso dos cães pode ser uma boa maneira de identificar sítios arqueológicos, porque é menos destrutivo que muitos métodos tradicionais. Além disso, “o nariz dos cães não comete erros”, disse Vedrana Glavaš, professora associada de arqueologia da Universidade croata de Zadar e principal autora do estudo publicado no “Journal of Archaeological Method and Theory”.
Depois de ter encontrado alguns túmulos numa necrópole perto do Forte pré-histórico de Drvišica, que remonta ao século XVIII AC., Glavaš, na esperança de vir a encontrar mais, contactou Andrea Pintar, uma adestradora que trabalha com cães usados para farejar túmulos em investigações criminais. Em 2015, Pintar levou para aquele local remoto Pastores Alemães e Malinois. Glavaš enviou os cães pela primeira vez para os túmulos que haviam sido desenterrados no ano anterior, mas que não se encontravam visíveis, sem informar da sua localização aos treinadores. “Sempre usamos pelo menos dois cães para confirmar a posição”, disse Glavaš, acrescentando que o segundo binómio não foi informado onde o primeiro indicou o túmulo. Os cães descobriram as três sepulturas, muito embora os restos humanos, artefactos associados e o solo circundante tenham sido previamente removidos.
Aquela área foi também exposta ao vento, ao sol e à chuva durante a escavação. Glavaš disse que a rocha porosa ao redor do solo escavado absorveu provavelmente o odor suficiente da decomposição, o que possibilitou aos cães detectá-la. Os cães foram depois soltos numa área onde se suspeitava haver mais restos, sinalizando seis novos túmulos que viriam a ser escavados. Os cães foram extremamente precisos em todos os casos e os túmulos consistiam em pequenos baús de pedra inseridos no meio de círculos de paredes, cada um com cerca de 5 metros de diâmetro. Cada baú continha ossos pequenos, com dedos e pés de vários indivíduos, possivelmente várias gerações da mesma família, para além de fivelas e outros artefactos. O principal autor do estudo adiantou que ossos escavados eram provavelmente de pessoas bastante pobres devido ao clima severo e ventoso da área, condições que levaram à dificuldade de cultivar.
Apesar de Glavaš ter usado cães com sucesso noutros locais da Croácia e na Alemanha, ainda lhe falta escavar alguns túmulos localizados pela sua equipa em Drvišica por falta de tempo e dinheiro (onde é que eu já ouvi isto?). Angela Perri, pesquisadora de arqueologia de pós-doutorado da Universidade de Durham, que não participou do estudo, disse que o uso de cães para farejar túmulos é uma técnica particularmente promissora, porque não é destrutiva e pode ser usada nas situações em que o radar de penetração no solo ou outras técnicas não funcionem. A mesma Perri, que estuda os primórdios da domesticação e do uso dos cães, disse que esta técnica é somente a mais recente na longa história humana em usar os cães como biotecnologia. Quanto a Glavaš, parece não ter dúvidas ao afirmar: “Muitos arqueólogos estão à procura de locais de sepultamento. Acho que os cães podem resolver os seus problemas.”

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