domingo, 15 de março de 2020

NÓS POR CÁ: O VÍRUS DO MEDO E OS ARAUTOS DO PÂNICO

Desde a invenção da escrita que rara é a geração que se escapa a uma peste, uma pandemia ou uma guerra e em todas houve sobreviventes. Há 100 anos atrás, uma tia que não cheguei a conhecer, foi vítima da chamada “Pneumónica”, repousa desde então num cemitério que inaugurou, agora ao lado da sepultura de uma comediante saloia de franja que encafuaram a seu lado. Foi a única vítima mortal daquela estirpe do vírus da Influenza A do subtipo H1N1 entre 5 irmãos e deixou duas filhas. Consigo compreender os momentos de angústia que ela e os seus contemporâneos experimentaram então, porque um século depois, estou a ser confrontado com o vírus Covid-19. Essa tia, que se chamava Maria dos Prazeres (provavelmente foi encontrá-los na Jerusalém celestial), segundo me disseram, não era pessoa dada a chiliques e a tremeliques e eu também não, apesar de me encontrar “na linha da frente” dos preferidos do actual vírus, que sem faltar à verdade poderá ser apelidado de “Vírus do Medo”.
Apesar do medo de morrer nunca me ter tirado o apetite ou o sono, cumpro agora com as indicações dadas pela Organização Mundial de Saúde e pela Direcção Geral de Saúde, porque considero a vida o melhor dos bens, não pretendo antecipar a minha morte e muito menos a de outros. Como tenho a morte como certa e não pretendo vender barato a pele ao diabo, pois hei-de ir quando chegar a minha vez, conservo a calma e o discernimento no meio do pânico e da angústia que leva muitos a ficar pregados às televisões, a esvaziar supermercados, a andar de máscara de cá para lá e de lá para cá, a automedicar-se, a sentir estranhas palpitações e até inexplicáveis faltas de ar, sintomas que na maioria dos casos, afortunadamente, não espelham a presença do vírus, mas o medo de morrer, porque não são fruto de infecção, mas produto da ansiedade.
Os portugueses são dos povos europeus que mais consomem antidepressivos e ansiolíticos, 30% da nossa população tem mais de 65 anos de idade, dos quais 200.000 já ultrapassaram os 80 e ainda temos 700.000 asmáticos. Estes compatriotas cuja idade não é para brincadeiras e cuja saúde inspira cuidado face ao Covid-19, estão constantemente a ser bombardeados com notícias, maioritariamente repetidas, desde que o sol nasce até que se põe, sobre o coronavírus, funcionando as televisões e as rádios, mais as primeiras do que as últimas, como verdadeiros arautos do pânico, esquecendo-se que há gente que treme, sofre, chora e desespera ao ouvir as suas emissões e as suas ênfases calamitosas, mais ligadas às audiências do que ao bem-estar geral. Por outro lado, tenho dúvidas que isto faça bem às crianças ou que facilite o seu entendimento do momento que estamos a viver. Este ribombar de mensagens desesperadas, proferidas por locutores que cacarejam mais alto do que galos matinais, ao dar menos tempo de antena à esperança – mata! As direcções de informação dos diferentes canais televisivos, para quem esta situação é também novidade, têm que fazer a diagnose dos seus telespectadores e compreender que informar não é semear o pânico.

Sem comentários:

Enviar um comentário