Em Kiev, na Capital da
Ucrânia, existe um grande centro médico para veteranos de guerra, soldados
afectados por Stress Pós-traumático (PTSD), estigmatizados pelo seu particular
mental, que lutaram contra os separatistas apoiados pela Rússia no leste da
Ucrânia. Alguns destes veteranos, que a sociedade ucraniana parece ignorar ou
desprezar, como se não existissem, participam agora de uma iniciativa com cães
de terapia visando a sua difícil recuperação.
Nos seis anos que leva o
conflito que opõe Kiev aos separatistas de Donetsk e de Lugansk, já morreram
13.000 pessoas, incluindo 4.000 tropas ucranianas. Com 10.000 soldados feridos
no conflito, alguns deles esperam que a terapia canina possa sarar as suas
feridas ocultas. Quando a guerra eclodiu na Ucrânia em 2014 (à distância parece
que foi ontem), as forças armadas herdadas da União Soviética não estavam
preparadas para tão grande número de veteranos atingidos pelo PTSD.
Apesar de 500.000
ucranianos terem servido as forças armadas, a sua saúde mental é desconsiderada
e o impacto psicológico da guerra permanece um tabu. Rodion Grigoryan,
psicólogo voluntário junto dos veteranos, disse à AFP (Agence France-Presse)
que apesar de “existirem medidas positivas por parte do Estado, há uma falta de
esforço sistemático”, incluindo o precário financiamento governamental para
solucionar o problema. Por seu lado, Oksana Kolyada, ex-Ministra dos Assuntos
de Veteranos, disse à mesma agência noticiosa que “as autoridades ucranianas
não mantêm os registos relativos ao número de soldados que lutam contra o
Stress Pós-traumático.
A ex-Ministra disse ainda
que “mais de 10% dos veteranos em todo o mundo sofrem trauma pós-guerra, com
sintomas que incluem flashbacks, depressão, comportamentos agressivos e danos
pessoais.” Na Ucrânia não existem estatísticas oficiais sobre as taxas de
suicídio entre os veteranos, mas Oleksandr Tretyakov, então presidente do comité parlamentar de veteranos, disse em 2018 que pelo menos 1.000 veteranos
ucranianos se suicidaram. A somar a isto, muitos ex-soldados relatam sentir-se
mal na sociedade graças à percepção geral de que os militares levam uma vida
fácil, livres das dificuldades económicas vividas por muitos ucranianos.
Como resultado, metade dos veteranos de uma pesquisa recente patrocinada pela
UE disse sentir-se discriminada e mais de um terço relatou sentir-se isolado.
Olga Smirnova,
coordenadora do programa de terapia canina, diz que mais de mil soldados foram
beneficiados desde o seu lançamento com a ajuda de instrutores canadianos em
2015. Os terapeutas caninos usam coletes brilhantes com o nome do programa
"amigo do herói" e foram treinados para não "reagir
agressivamente", segundo diz Natalia Chuprun, que trabalha como voluntária
no programa com seu cachorro Ricky há quatro anos. Chuprun diz que a interacção
com os animais torna mais fácil o envolvimento dos veteranos com "pessoas
que se preocupam com eles", incluindo aqueles que querem ajudá-los
profissionalmente e que os cães também intervêm mos momentos de desespero dos
veteranos, acalmando-os quando sofrem ataques de pânico, ao deitar a seu lado.
Victoria, psicóloga do
hospital militar de Kiev, diz que notou uma queda na ansiedade e na depressão,
assim como um aumento do sono em mais da metade dos pacientes que participam
das sessões de terapia com cães. Oleksandr, um veterano de 38 anos que passou
um ano na linha de frente, no leste da Ucrânia, diz que a sua "vida mudou"
desde que Deep Purple, um Retriever do Labrador, lhe foi entregue no seu apartamento
nos arredores de Kiev, que o cão trouxe calma à sua vida e estabilidade aos
seus padrões de sono.
Porque ainda há por aí
muita gente a sofrer de Stress Pós-traumático, relembramos aqui os seus principais
sintomas: recordação involuntária da experiência traumática; pesadelos
frequentes; reacções desproporcionais perante pequenas coisas que fazem lembrar
o acontecimento; choro fácil sem motivo aparente; dificuldades em adormecer e
em manter o sono; recusa persistente de pensamentos, conversas, sentimentos,
locais, pessoas e situações que façam lembrar o acontecimento; guardar
distância emocional e social de pessoas anteriormente significativas e viver
num estado de alerta permanente. Tudo isto flagela os veteranos ucranianos,
esquecidos por razões estratégias e entregues aos seus dedicados terapeutas
caninos. Com o auxílio destes cães é possível que menos veteranos se suicidem e
que mais se reintegrem na sociedade. Apraz-me exclamar: há cães para tudo!
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