Há que subtrair os
exageros que se ouvem e lêem acerca das mais-valias caninas, porque provêm de
cinófilos confessos, os cães estão na moda e estas circunstâncias têm vindo a
transformá-los numa panaceia, a exemplo do que se passou com o Aloé Vera e outros produtos naturais (um
apicultor dirá sem grande dificuldade que o Própolis
é a solução para todas as maleitas).
É evidente que ainda não
se descobriram todas as vantagens que um cão de companhia tem para oferecer,
até porque a sua existência tal como o conhecemos hoje é relativamente recente,
tornou-se mais visível a partir da última década do Séc. XIX e o recurso
sistemático aos cães de terapia sucedeu apenas há 30 anos atrás, ainda que os
cães-guias levem um século de existência. Por outro lado, a exaltação dos
méritos caninos está associada a múltiplos factores, dos quais destacamos a
migração humana do campo para as cidades, o stress urbano e o viver citadino, o
descontentamento e suspeita relativos aos medicamentos sintéticos, o aumento da
riqueza, maior justiça social e a menor taxa de natalidade nas famílias do
Mundo Ocidental, sendo este último facto responsável pela maior procura e
apreço pelos cães, que hoje como nunca tendem a substituir os filhos e que são
objecto de uma veneração nunca vista, como se o lobo familiar fosse uma
divindade finalmente revelada.
Recentemente vários
investigadores têm levado a cabo e publicado estudos onde avaliam os benefícios
dos cães de companhia nas famílias com filhos autistas, comprovando que a
presença destes animais é benéfica tanto para os pais como para as crianças,
porque nos primeiros oferece-lhes cumplicidade, reforça-lhes os esforços e
liberta-os do stress, contribuindo assim para uma harmonia familiar menos
desgastante, uma vez que facilitam a interacção com as crianças e ajudam-nas a
ser mais responsáveis.
Já em
Abril de 2014 investigadores da Universidade de Missouri-Columbia/USA haviam
chegado a estas conclusões e agora investigadores da Universidade de
Lincoln/UK, financiados pela Fundação norte-americana HUMAN ANIMAL BOND RESEARCH INITIATIVE (HABRI), vieram comprová-las.
Diz-nos a experiência que nem todos os cães se prestam como animais de
companhia e um grupo muito menor conseguirá desempenhar a tarefa, isentando
pais e crianças de riscos desnecessários. Para que tudo corra sem novidade e os
resultados esperados sejam alcançados, é necessário que os cães sejam objecto
de escolha, fáceis de se ambientar, cúmplices e submissos, pouco territoriais,
calmos e com fracos ou inexistentes impulsos à defesa, à luta e ao poder,
porque doutro modo, como reacção ao stress provocado, poderão descarregar
sobre as crianças portadoras deste distúrbio neurológico, caracterizado por
dificuldades na interacção social, na comunicação verbal e não-verbal, e por um
comportamento repetitivo e restrito.
Ao longo da nossa
existência pudemos comprovar os benefícios caninos sobre crianças com
distúrbios neurológicos iguais ou similares, indivíduos que nunca tratámos como
anormais e dignos de pena mas que convidámos como iguais para o nosso meio
apostados na sua recuperação. Certamente haverá outros animais que se prestarão
para a tarefa mas nenhum deles tornará a desejável interacção mais fácil que o
cão, um animal que criámos para servir e que assim tem permanecido ao longo dos
tempos, um companheiro que ao invés de ser Deus atribui aos seus donos um estatuto
quase divino, prontificando-se a tudo para os fazer feliz.
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