Temos
hábitos enraizados entre nós, dos quais dificilmente nos livraremos, de nos
valermos dos outros quando precisamos deles e de esquecê-los logo após sermos
servidos, algo associado à antropológica ingratidão, aqui potenciada pela
crendice popular, uma vez que todos conhecemos a estória da travessia, quando
um homem ao atravessar uma ponte, temendo que ela ruísse pela força das águas revoltas,
ia dizendo para si mesmo: “Deus é bom e o diabo também não é mau!”. Ao chegar
são e ileso à outra margem, desassombradamente e fazendo um vigoroso manguito,
exclamou vitorioso: “Que se lixem os dois!” Se fazemos isto a Deus, com maior
facilidade continuaremos a fazê-lo uns aos outros, sendo esta a nossa
verdadeira natureza. Este mau hábito de extorquir gratuitamente informação a outrem
(Deus lhe pague, que agora não tenho troco), sempre acaba por desvalorizar o
serviço prestado, porque a tudo o que é gratuito pouco valor é dado.
Assim fazemos também com Cristo, hoje entrado no esquecimento de muitos, apesar de ter alcançado gratuitamente a salvação eterna para todos, mesmo para aqueles que por pretenso direito à diferença, necessidade de exaltação, sandice, patologia, ignorância ou vaidade, se dizem adeptos de doutrinas longínquas que ignoram e que jamais conseguirão seguir pelo peso das suas imperfeições pessoais. Assim, sem olhamos a meios e apostados no que queremos, chegamos a atribuir honrarias a alguém de quem mais tarde zombaremos. Neste sentido, porque fui obrigado a abrir os olhos muito cedo e não preciso de ser graduado em malícia (tenho-a para dar e vender), agradeço que não me ensebem e que sejam francos e honestos comigo, usando da mesma franqueza que uso quando valho a quem me procura, apesar de saber há muito que a gratidão deste mundo habita nos quartos traseiros de uma mula. Dito isto, não sei o que será mais fácil de mudar - se nós próprios ou o mundo.
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