quinta-feira, 24 de março de 2022

EU QUERIA QUE ME INDICASSE UM CANITO QUE FOSSE BOM PARA MIM!

 

Aos sábados da parte da tarde, num canal de televisão privado, num programa realizado em casa de um cantor, num bonito arrabalde de Lisboa onde não faltam burros e cães, adianta-se um número de telefone para quem quiser falar com a vedeta, que não é nada do meu agrado, mas que parece agradar a muitos, a troco de se habilitar a uma choruda quantia de dinheiro. O programa chama-se Alô, alô qualquer coisa e é a meu ver um imbecilidade cheia de sorrisos. Sem saber como, o meu telefone parece também ter entrado para a lista das chamadas de valor acrescentado, porque numa tarde, quando me encontrava com mais dois binómios a fazer a milha diária, alguém através do telemóvel faz-me o seguinte pedido: “Eu queria que me indicasse um canito que fosse bom para mim!” O meu interlocutor não era uma pessoa que me fosse próxima, nunca o vi mais gordo nem mais magro, a não ser por breves instantes em duas ocasiões, factos que não o impediram de procurar conselhos gratuitos e de querer ver o seu pedido satisfeito.

Há uns anos atrás, após completar o adestramento do seu cão, uma aluna de características coléricas perguntou-me que tipo de Pastor Alemão seria o indicado para ela. A resposta foi pronta e breve: “Nenhum!” Ao cavalheiro da chamada por telemóvel disse-lhe que não o conhecia suficientemente bem, que não lhe conhecia as mais-valias e que diante disso não tinha como aconselhar-lhe um cão, resposta que apesar de correcta parece não ter sido do seu agrado, porque já vão alguns meses e não voltou a importunar-me, o que se saúda. Não há cães feitos à medida para ninguém, nem mesmo pessoas e muito menos haverá para quem não tem nada para dar. Apesar dos cães serem um fenómeno de adaptação, mesmo assim exigem algumas condições cuja ausência pode dificultar ou impedir a sua aquisição. Só depois de eu saber o que tenho para dar a um cão é que parto para a sua escolha ou não, porque doutro modo posso estar a atentar contra as características individuais do animal e por conseguinte contra o seu bem-estar.

Nem todos os cães são indicados para todas as pessoas, chegando alguns à inversão de papéis com os donos e outros a quem nem se lhes pode levantar a voz, uns manifestamente teimosos e outros de propensão agressiva, pelo que uns podem exigir donos experientes e outros não, mas nenhum dispensa a temperança, a paciência, o cuidado aturado e a afeição. Exactamente como o “dono ideal”, o “cão ideal” ainda não veio – está para chegar! Importa, pois, coadunar o perfil psicológico do dono com o do cão para que se completem e não andem em constante confrontação (às turras). À parte disto, porque a aquisição de um cão é um projecto da família, há que considerar todos os membros do agregado familiar na hora de escolher o cão, para que vá ao encontro das expectativas de todos e não se constitua num problema acrescido. Convém relembrar que há cães que necessitam de mais exercício físico que outros, alguns que têm maiores necessidades energéticas e outros ainda, poucos, que só estão bem dentro de casa. Como um cão para ser feliz precisa de um dono feliz, há que escolher o cão em função do dono. Assim, quando não conheço o eventual dono de um cão, não lhe posso aconselhar nenhum e muito menos pelo telefone.

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