quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020

GOSTAR DE CÃES PODE SER UMA MALDIÇÃO

Enquanto os europeus encaram o bem-estar animal como uma das suas principais preocupações e indústrias gigantescas giram em torno dos animais de estimação, possibilitando emprego a muitos e entrada de divisas, há lugares no mundo onde ter um cão é uma maldição, como ainda acontece no Afeganistão, uma República Islâmica essencialmente agrícola, primeiro produtor mundial de ópio (estima-se que 80 a 90% da heroína consumida na Europa provenha do ópio produzido ali), sendo o negócio ilegal desta droga a sua principal riqueza, riqueza que irá também sustentar actividades subversivas e terroristas. As mulheres afegãs sustentam uma sociedade que as discrimina e escraviza, os Direitos Humanos não são considerados, a violência doméstica é aceite naturalmente, os crimes de honra sucedem-se e para “compor o ramalhete”, o narcotráfico, o branqueamento de capitais, a fraude e a corrupção institucionalizaram-se numa terra onde rapidamente se passa de vivo a morto.
No passado dia 07 de Fevereiro, Sexta-feira, Sahba Barakzai decidiu ir até às montanhas mais perto de sua casa, na zona oeste do Afeganistão, levando consigo a família (pai e duas irmãs) e o seu amado cão Aseman, um Husky Siberiano de 7 meses cujo nome significa “céu”, numa alusão aos seus olhos azuis. Aquela caminhada veio a transformar-se numa tragédia, quando um grupo não identificado de homens se aproximou daquela família e matou o cachorro a tiros, dando como justificação que uma mulher não podia ter um cão?! Mas Sahba suspeita que há algo mais por detrás da morte do cachorro, que poderá ter sido uma retaliação contra a sua pessoa, uma vez que ensina karaté a meninas há uma década e fundou um clube de ciclismo para adolescentes e jovens em Herat, a 3ª maior cidade do Afeganistão. Convém adiantar que há menos de duas décadas as mulheres estavam proibidas de ir à escola e de trabalhar, não podendo sair de casa sem um acompanhante masculino. Setayesh, irmã de Sahba, disse à BBC que ainda é tabu para as meninas andar de bicicleta em Herat e que parte da comunidade reagiu inicialmente de modo agressivo, mas sua irmã estava determinada a persistir.
Perante o sucedido com seu cão, cujos assassinos também confiscaram o cadáver, Shaba parece ter compreendido o “recado” e deu ouvidos aos receios da família, encerrou os seus clubes desportivos e decidiu “pôr-se a léguas”, a atravessar a fronteira para o vizinho Irão, país onde espera estar em segurança. Não obstante, continua inconformada com a morte de Aseman, que podia ter vivido com ela 14 anos e que acabou abatido aos sete meses de idade (“coisas” do Afeganistão, já é uma sorte estar viva!).
Gostar de cães em alguns lugares pode ser uma maldição, tanto para eles como para os seus donos, porque poderão vir a ser abatidos por represália ou como forma de intimidação. Onde a vida dos animais pouco importa, pouco mais importará a vida dos seus donos e demais gente, e o Afeganistão é um claro exemplo disso, tanto por culpa própria como pela pressão dos países vizinhos. Há quem diga que ao afegãos nasceram para a guerra e que por isso são invencíveis. Eu não os vejo assim, acho que os afegãos não acreditam na paz e nos seus benefícios, persistem no tribalismo e matam para não ser mortos, tudo para garantirem as migalhas que comem e os chorudos lucros de quem os arma e envia para a morte. São assim há milhares de anos, provavelmente ainda antes da “Seidenstraße” (Rota da Seda).

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