Os cães continuam incompreensivelmente
a matar crianças nas Ilhas Britânicas e não compreendemos porquê. Até hoje
ninguém nos deu uma razão válida que justifique a posse de cães com grande
potência de mordedura a não ser o facto de “gostarem” deles, o que é subjectivo
e de pouca ou nenhuma explicação. Não temos preconceitos contra o Pit Bull, o
Staffordshire Terrier e outros cães agora considerados unanimemente como
altamente perigosos, porque sabemos que são treináveis, já os treinámos e
grande número deles surpreendeu-nos pela positiva. Mas se não temos
preconceitos contra eles, o mesmo não se pode dizer em relação aos seus donos,
primeiros responsáveis pela sua escolha e educação. Chocados com o que se passa
por esse mundo fora, decidimos empreender um estudo sobre os proprietários
destes cães, interpelando todos os que connosco se cruzaram durante 2 meses,
num total de 152 pessoas, número a que somámos os 27 binómios que treinámos, o
que perfaz um total de 179 indivíduos de ambos os sexos, sendo 170 do género
masculino e 9 do género feminino.
Todos os entrevistados
negaram ter aqueles cães para causar dolo a alguém e todos se confessaram
apaixonados por aquelas raças, porque as acham “fixes”, meigas, dedicadas e cúmplices
dos seus donos, apesar de 90% deles ter um cão destes pela 1ª vez. Enquanto 85%
dos inquiridos procurou um cão assim, 15% adquiriram-nos por oferta (nalguns
casos quase por imposição). O grupo etário mais numeroso destes proprietários
caninos tem idades compreendidas entre os 15 e os 25 anos (85), logo seguido
pelo grupo dos 25 aos 35 anos (79). Dos 35 aos 45 anos encontrámos 11
proprietários e dos 45 aos 55 somente 4. Não encontrámos nenhum dono destes com
idade superior aos 55 anos. Todos os cães, de ambos os sexos, tinham mais de 10
meses de idade e quando inquirimos se haviam sido objecto de algum tipo de
treino convencional, apenas 36 frequentam ou haviam frequentado uma escola
canina, ainda que 1/6 deles tivessem sido coagido a isso.
Quando lhes perguntámos se
costumavam circular com os seus cães atrelados e com açaime, segundo as
disposições legais em vigor, apesar de não havermos encontrado nenhum que as
estivesse a cumprir na íntegra, 8 deles responderam afirmativamente. Todos se
mostraram revoltados contra o uso do açaime e 106 costumam soltar os seus cães
nos espaços públicos, maioritariamente à noite, caso ninguém proteste e a
polícia não esteja por perto.
Inquiridos depois sobre a
sociabilização dos seus cães com outros, 117 adiantaram que os seus pupilos têm
tendência para “se armar em parvos”, apresentando dificuldades em brincar com
outros cães, perseguindo-os e lutando pela posse dos brinquedos, mesmo que não
sejam os seus. Quanto à animosidade contra pessoas, apenas 5 confirmaram essa
tendência nos seus cães, apesar de 15 acharem que os seus fiéis amigos são
ciumentos e por demais zelosos dos pertences dos donos. Quanto ao
relacionamento dos cães com as crianças, 60% nunca tiveram essa experiência,
30% afirmaram que é satisfatório e 10% não confiam nos cães para tanto. 53 dos
inquiridos disse fomentar o aumento da potência de mandíbula dos animais. Para
que as entrevistas reflectissem a verdade e não a conveniência, não nos
identificámos e dissemo-nos proprietários de um pequeno Pit Bull que nos foi
oferecido, que queríamos saber mais sobre a raça e que andávamos por ali a
buscar conhecimento e conselhos, estratégia bastante para todos se sentirem à
vontade e falarem sem reservas.
Feitas as contas, dos
proprietários de Pit Bull, de Staffordshire e seus mestiços que entrevistámos,
95% foram homens e 5% mulheres. 90% não tiveram experiência prévia com cães
dessas raças; 85% procurou intencionalmente um cão assim; os adolescentes e os
jovens adultos são quem mais os procura (91%); apenas 20% dos cães foram objecto
de ensino, incluindo-se nestes aqueles que foram coagidos ao processo
pedagógico; 90.7% dos donos não cumpre integralmente com as disposições legais;
59% solta os cães nos espaços públicos; 65% destes cães apresentam problemas de
sociabilização entre iguais; 11% mostram hostilidade aos humanos; 30%
relacionam-se bem com crianças e 29% são convidados sistematicamente a
potenciar a sua força de mordedura. Adianta-se ainda que 20% dos cães eram
castrados e 50% estavam descritos como rafeiros (sem raça definida) no seu
cartão de identificação. Estes resultados foram obtidos em três Concelhos dos
arredores de Lisboa, cujos resultados eleitorais costumam ser iguais aos
nacionais.
Diante destes dados e
doutros que ainda não mencionámos, o condutor
médio de pitt bulls e staffordshires nos arrabaldes de Lisboa pertence ao
género masculino, é nacional, solteiro, tem entre 15 e 35 anos, é estudante ou
tem um emprego precário, procurou intencionalmente um cão com essas características
pela 1ª vez, não pensa educá-lo, não cumpre voluntária e assiduamente as disposições
legais em vigor, solta o seu cão assim que pode, não opera a sua
sociabilização, não pensa castrá-lo e geralmente tem-no identificado como
rafeiro. Apesar do panorama ser pouco animador, o caso inglês é mais grave
que o nosso, pese embora o maior peso da castração por lá, que pelos vistos,
dependendo da idade em que é feita, de pouco ou nada adianta. Se aqui não temos
o número de vítimas (feridos e mortos) que vem ocorrendo na Grã-Bretanha, tal
se deve à brandura do nosso Povo, a uma legislação mais dura e à afincada
fiscalização das forças da ordem (GNR e PSP), a quem coube um papel dissuasor
determinante, pondo inclusive cobro às lutas de cães, à sua indústria e negócio.
O perfil do comum
proprietário inglês destes cães é diverso do português (dizemos isto através
dos casos que vêm a público e das notícias que nos chegam através de amigos ali
residentes), porque a sua posse não se restringe aos solteiros, distribui-se
por gente de todas as idades, é histórica e não extemporânea, sendo estes cães
considerados próprios para as famílias, o que esporadicamente resulta na
agressão e morte de crianças e adultos, como foi o caso da menina Molly-Mae
Wotherspoon, de seis meses de idade, agora levado a tribunal em Northampton,
cuja mãe tinha em casa um American Pit Bull que despedaçou esta criança até à
morte, o que infelizmente não é tão raro suceder no Reino Unido. A posse de Pit
Bulls e seus híbridos ali remete-se na sua maioria a pessoas urbanas de baixo extracto
social, rudimentares de cultura e hábitos, de alguma forma mal enraizadas na
sociedade, instáveis e algumas delas a viver em bairros problemáticos, no que
não diferem dos portugueses com igual preferência (sobram miseráveis, alienados
e pobres de espírito por todo o lado).
Tanto lá como cá, os
proprietários de Pit Bulls sentem-se descriminados, descriminação que a nosso
ver mais se deve a eles mesmos do que à população que os rodeia, porque optaram
por cães de luta, passíveis de causar grande dolo e até mortes, intimidando
justificadamente quem com eles se cruza ou é obrigado a coabitar. Se o seu
objectivo não é o de intimidar e causar vítimas, pergunta-se: porque não os
treinam convenientemente, não apostam na sua sociabilização, não castram os
mais agressivos e não cumprem com as leis em vigor? Não será a falta destas
condições que mais contribuirá para o mau nome destes cães? Não temos nada,
mesmo nada, contra aqueles que os educam, controlam eficazmente, sociabilizam e
cumprem com as disposições legais! Quem assim não procede, jamais conseguirá
esconder o desejo subjacente de causar mal aos outros, até porque se há um cão
meigo e amigo de fazer a vontade aos donos, o Pit Bull é certamente um deles!
Bem sabemos que nem todos
nascemos líderes, que muitos de nós apresentam sérias dificuldades em liderar,
que a valentia, a robustez, a clarividência, a destreza e o sangue-frio não
sobram para todos. E se assim é, como poderá qualquer um controlar um cão instintivamente
agressivo, há muito seleccionado para isso, robusto e com grande potência de
mordedura? Poderão dormir descansados os demais cidadãos e os outros
proprietários caninos?
Como ainda não descobrimos
nada que um cão de luta tenha que os outros não tenham ou outro propósito para que houvesse sido criado, também não conseguimos descortinar
uma razão válida para a sua preferência, sendo obrigados a pensar que há gente
que procura deliberadamente cães maus, quiçá pelo mau conselho da idade
(imaturidade), por candura, por desaguisados sociais e psicológicos, por
revolta e necessidade de afirmação ou a braços com patologias de vária ordem,
incluindo-se nelas o desejo de fazer mal (malvadez). Sonhar é bom, desde que
não nos afaste da realidade e se transforme num pesadelo para os outros.
Enquanto seres sociais responsáveis somos obrigados a pensar e tudo fazer pelo
bem-estar do grupo onde estamos inseridos e, adquirir um cão de luta,
dificilmente se prestará a esse propósito, a menos que venhamos a descobrir um
fim útil e universal para as suas características peculiares.
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