Hoje
é DOMINGO DE RAMOS, o
domingo anterior ao da Páscoa em que se continua a celebrar a entrada triunfal
de Jesus em Jerusalém, festividade do calendário litúrgico cristão que sempre
me transporta até à infância, a vários momentos passados numa ermida erigida entre
os séculos XVI e XVII, por demais rústica, pouco vestida, com uma pia baptismal
nada convidativa, escura, coberta de azulejos, de ícones enegrecidos e com um altar
em forma de urna, o que lhe conferia um aspecto sinistro aos olhos de uma
criança, que inquieta, aguardava ansiosamente que a missa terminasse – assim acontecia
comigo. Mas quando chegava o Domingo de Ramos todo o peso sacrificial da
quaresma parecia desaparecer por artes mágicas, a ermida ganhava vida com os ramos de de oliveira e de palmeira e com a algazarra das crianças, Deus parecia
visitar o seu povo e ter descido àquela alegre festa.
Na véspera engraxava os sapatos e tomava o banho semanal, adormecia com a roupa engomada aos pés da cama e logo após me levantar, depois de lavar a cara, molhava o cabelo para melhor o poder pentear e fazer o risco ao lado. Era-me passada revista às unhas e aconselhado muito cuidado com a fatiota e os sapatos, para além das recomendações relativas ao tratamento a dar ao senhor prior e a outras pessoas proeminentes da paróquia, o que era de todo desnecessário no caso do padre, porque não gostava de mostrar os dentes e tinha um aspecto inquisitorial e tenebroso por detrás de uns óculos garrafais. O fato (só tinha um), a camisa e laço estavam reservados apenas para os domingos, épocas solenes e festivas, porque nos restantes dias a bata escolar era substituída pelo bibe. Davam-me 5 tostões (1/4 de cêntimo) para pôr no saco da colecta e não raramente era convidado para a fazer, o que sinceramente gostava depois da maçadora “sequência do levanta e ajoelha”. Apesar da austeridade, das obrigações e da pompa para inglês ver, os homens chegavam a virar os fatos e a escassa indumentária das senhoras era de todos conhecida, no Dia de Ramos era-nos devolvido o direito de voltarmos a ser crianças, isto sem abusar, para que o dia não acabasse a estalo ou com um valente puxão de orelhas!
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