Numa
das minhas deambulações domingueiras, onde me dispenso de falar ou pensar em
cães, privilegiando a natureza que me rodeia e que exerce sobre mim um forte
apelo, inesperadamente e num local pouco provável, dou de caras com um cão de
lata, que atendendo à sua morfologia serviria na perfeição como monumento e
evocação ao histórico rafeiro nacional. Encantado com aquela escultura de chapa
soldada, puxei do telemóvel e tirei-lhe várias fotos com o objectivo de
dividi-la com os leitores deste blogue, porque através dela muito há a aprender
e a reflectir sobre as características e a biomecânica destes cães sem raça definida
(SRD), agora que tomam pouco a pouco o lugar dos seus primos com pedigree nos
centros de adestramento e sobre eles pouco ou nada se tem dito ou escrito,
muito embora haja por aí uma autora militar que já se tenha debruçado sobre
eles de forma superficial e pouco técnica num pequeno livro, porque resolveu
fazê-lo ou porque lhe foi imposto pelas mais variadas circunstâncias,
nomeadamente os destinatários da sua sucinta obra, muitos deles com cães assim.
E mais não digo sobre o livro e a sua autora, de quem na verdade esperava muito
mais, porque ninguém me paga a publicidade e o apressado livrito não merece
grande destaque. Vamos ao inesperado cão de lata.
É
evidente que não vou aqui falar de híbridos, que os há muito actualmente, mas
dos rafeiros históricos mediterrânicos sem o contributo das raças caninas mais
recentes, daqueles de quem se dizia só Deus saber aquilo eram e donde vinham e de
quem o presente cão de lata dá testemunho. Estamos a falar de cães cuja cabeça
oscilava entre o bracóide e molosso, com eixos longitudinais crânio-faciais
divergentes, não raramente com focinhos vulpinos, orelhas semi-erectas, onde a
presença alana é transversal a quase todos, para além de pescoços a lembrar os
lebréis. Maioritariamente animais quadrados, pernaltos, com o peito pouco
profundo, descodilhados, mãos atiradas para fora, com abatimento de metacarpos,
dorso côncavo, com a traseira mais alta que a cernelha ou garrote e de recta ou
média angulação, com caudas curtas ou não muito longas. Cães de entrada fácil
ao galope, propensos ao passo de andadura, dados a medos de vária ordem, que
acusam de sobremaneira a repreensão e o castigo, notoriamente instintivos, carentes
de forte incentivo e maioritariamente submissos, sobressaindo alguns
manifestamente inibidos.
Do ponto de vista biomecânico há que evitar a todo custo sobrecarregar-lhes a frente e dotar a sua traseira de mais músculos, poder e impulsão, também de maior distância entre eixos, para evitar que se enterrem no solo e consigam com isso levantar a cabeça, aliviar a espádua e combater o selar progressivo do seu dorso. Para se operar a sua correcção morfológica duas coisas são indispensáveis: o treino atlético precoce, mas consensual e a aquisição da marcha como andamento preferencial. O pré-treino destes cães deverá começar pelo extensor de solo, aparelho indutor à marcha solta e leve. Estes cães, invariavelmente esterilizados hoje, necessitam de ser viva e continuamente recompensados (reforço positivo), até porque são pouco seguros de si próprios, libertos de exercícios repetitivos e alvo de profunda afeição. Hoje vou ficar por aqui, só tirei 3 fotos ao cão de lata e precisava de mais para continuar este artigo. Não sei quem foi o autor do dito cão, mas se soubesse, correria para ele a dar-lhe os parabéns!
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