Há
por aí quem pense e em vão espere, que ao cruzar dois cães “puros” de raças
diferentes, venha a obter cachorros com 50% de uma raça e 50% da outra no que
concerne às suas características cognitivas, físicas, psicológicas e
funcionais, incluindo-se nas últimas a máquina sensorial, a biomecânica, a
interacção, a parceria e a complementaridade. Quem é experiente na canicultura
sabe que tal é difícil de acontecer mesmo em indivíduos da mesma raça quando se
intenta realizar um verdadeiro beneficiamento. Por outro lado, a probabilidade
de se obterem cachorros na simbiose desejada é maior no cruzamento das raças de
raiz comum, como acontece com o Pastor Alemão, Belga e Holandês, muito embora
esses cruzamentos, agora considerados como beneficiamentos atendendo à procura incessante
de maior operacionalidade, possam produzir exemplares mais ou menos desprezíveis
consoante o acerto dos critérios que presidiram à selecção dos seus progenitores.
Dependendo
do número de cães usados para a formação das distintas raças e do seu
distanciamento em relação ao estalão actual, assim alcançaremos mais ou menos
cachorros com as características desejadas, muito embora haja raças que sejam
maioritárias na construção de híbridos e mestiços, como é caso do Cão de Pastor
Alemão. Se tomarmos como exemplo o Doberman, que foi formado a partir de várias
raças e que não é dominante na construção, os seus híbridos tenderão a obedecer
a outras dominâncias, a apresentar características e comportamentos só presentes
na protoconstrução da raça e comuns ao indivíduo escolhido para cruzar com o
Doberman. E, quando assim sucede estamos perante uma roleta russa e as
mais-valias procuradas podem tardar a chegar ou a nunca aparecer. Por tudo
isto, apesar de ampla e repetidamente ter sido tentado, o cão perfeito, o
portador só de virtudes, ainda está por chegar.
Quanto aos cruzamentos entre cães com pedigree e cães sem raça definida (rafeiros), duas situações podem acontecer de acordo com os particulares do cão “puro” e da construção do rafeiro: se o cão “puro” utilizado for dominante na construção, os cachorros sair-lhe-ão maioritariamente; se não for, os cachorros obedecerão a outras dominâncias. Os lupinos, inclusive o Husky, tendem a fazer prevalecer as suas características e comportamento sobre os vulpinos, verdade que talvez se explique pela presença ancestral do lobo em todos os cães. Por norma, ainda que não absolutamente, os cães com pedigree tendem a marcar mais a sua descendência do que os sem raça definida. O actual retorno à raíz comum de Pastores Alemães, Belgas e Holandeses, tendo em conta o que se espera destes cães, é a tentativa de doar a cada um deles aquilo que as distintas selecções lhes roubaram, por enquanto uma opção mais barata diante dos preços actuais da clonagem, processo de reprodução assexuada que virá a dominar a canicultura.
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