Nesta altura do campeonato
é bom ter um cão, porque doutro modo ver-me-ia obrigado a tomar Vitamina D3
sintética e mais umas não sei quantas drogas. Na companhia do Paco, o meu
Pastor Alemão negro, com o qual tenho uma relação privilegiada pela
cumplicidade que fomos desenvolvendo ao longo do tempo, todos os dias saímos à
rua e damos a volta ao quarteirão num raio de 100 metros ao redor da minha
casa. Raramente encontramos alguém e até é melhor nem encontrarmos, porque ao
contrário do passado recente, em que as pessoas corriam para o cão, quem se
cruza agora connosco vira a cara para o lado e acelera o passo temendo ser
infectado, porque a morte anda por aí e nunca se sabe quem vai levar consigo.
O cão também estranha
tamanho sossego e avança desconfiado como se uma tempestade tivesse para
rebentar, olhando para tudo quanto é canto na esperança de ver vivalma. Mas
não, a cidade está deserta como nunca esteve, já não se vêem nem ouvem as
crianças, as gaivotas perderam a sua ousadia e regressaram ao mar, somente os
pássaros continuam a chilrear, agora como nunca antes. Para dar pulmão ao cão e
não o deixar emperrar, depois de o ter aquecido convenientemente, convido-o
para uns quantos obstáculos urbanos ao alcance da sua capacidade de resolução, mas
sem o espanto e a surpresa dos que anteriormente nos viam trabalhar.
Não é muito cómodo para
quem conduz um cão, particularmente nos exercícios de ginástica, fazê-lo de
máscara na cara e de luvas postas, porque os olhos ficam embaciados e as mãos
transpiram em demasia. Na ausência de outra solução que me proteja, esqueço-me
dos entraves e dedico-me ao animal, estimulando-o para ir adiante e
recompensando-o como se fora um campeão (do meu coração já é!). Porém, é o que
me parece, o animal já não demonstra mais aquela alegria em sair, quiçá por
abominar tanto silêncio e vazio. Como quem lidera ou comanda não tem o direito
de desanimar e de se deixar abater sobre os outros, solto o resto da
jovialidade que me resta e levo o cão a seguir-me por toda a parte.
Felizmente que estamos na
Páscoa, ocasião litúrgica em que os cristãos celebram a paixão, morte e
ressurreição de Jesus Cristo, Filho unigénito de Deus, que se fez homem e
morreu por todos nós para nos trazer vida para além da morte. Ao ressuscitar, Ele
venceu a morte e com Ele nós também a venceremos. Debaixo desta Fé, que é dom
de Deus e não meu, caminho com o cão pelas ruas onde a morte espreita,
indiferente ao medo geral, porque sei que não estou só, apesar de ser um
cidadão triplamente de “alto risco”.
Hoje aspirei ânimo do sol
que me batia na cara e regressei a casa mais alegre do que nunca. Vale a pena
viver e não desesperar, o melhor é não estar só, eu tenho um companheiro de
quatro patas que julga cuidar de mim, quando sou eu que o protejo e guio por léguas
sem fim, exactamente como Alguém sempre fez comigo. Havemos de reencontrar-nos,
Boa Páscoa para todos!
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