quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

A SUAR E A APRENDER A SER DONO

 

Adquirir um cão pode ser o “cabo dos trabalhos” para quem não sabe aquilo que o espera, porque a presença do animal sempre acabará por alterar as rotinas e a vida dos seus donos, porquanto é um ser vivo com necessidades específicas, cuja curiosidade reclama por novidade de vida, que mete o nariz literalmente em todo o lado, que não dispensa a excursão e que se desenvolve cognitiva e fisicamente a marchar pelo mundo à sua frente. Donos demasiado sedentários e por norma sem tempo não deverão adoptar um cão, porque a sua pouca disponibilidade, que na maioria dos casos resulta de um achaque psicológico com implicações físicas, acabará também por trazer infelicidade ao animal, transformando-o muitas vezes naquilo que ele não quer ser – num zombie engaiolado – mesmo que seja numa gaiola de ouro!

O cachorro CPA negro Thor, que tardiamente foi vendido e adquirido, em consequência disso foi naturalmente instigado a morder nos seus companheiros de cárcere e tardiamente atrelado, ao invés de ter tido o exigível tratamento individual e ser poupado às lutas hierárquicas que despontam aos 4 meses de idade. Compreende-se agora o seu desencanto pela trela e as cargas que efectua sobre os outros cães, mesmo que sejam maiores do que ele, inclusive adultos. Ele é um cão dominante mas não muito-dominante, que à falta de melhor, optou por descarregar o seu impulso à luta nos seus companheiros de canil, servindo alguns deles eventualmente como seus mestres. Esta impropriedade instaladora (ambiental) subverteu-lhe o carácter, uma vez que os cães com nobreza de carácter não mordem noutros cães, procuram outros alvos maiores. Agora importa trazê-lo para a rua, sociabilizá-lo, estender-lhe a liberdade e devolvê-lo à vida, operando assim a recuperação do seu carácter na companhia do seu dono, com quem já tem alguns laços afectivos, mas que pouco respeita. O caminhar conjunto e a divisão de tarefas agora exigidas apenas visam o aumento da necessária cumplicidade.

Nesta cruzada pela recuperação do pequeno Thor, que ao que tudo indica virá a ter no mínimo 68 cm de altura, como já disse atrás, torna-se imperativo sociabilizá-lo com pessoas e animais, pelo que a presença do CPA negro Paco nas suas caminhadas é mais do que necessária - é imprescindível - andando o cão adulto a aturar e a desmamar aquele cachorro “inquieto” (ambos na foto seguinte na companhia de duas simpáticas empregadas de restaurante).

Nesta altura do campeonato (o animal ainda não fez 6 meses), para não dar cabo do resto e atentar contra a vocação do cachorro, não o vou bombardear ou persuadir com a obediência, antes vou substituí-la pela ginástica ao seu alcance, o que lhe aumentará a moral e torná-lo-á mais seguro. Como a ginástica é feita à trela, gradualmente o cachorro ficará condicionado a aguardar pelas ordens do dono, o que obviamente aumentará o seu controlo e obstará aos seus imprevisíveis ataques de surtida. Como já possui a robustez, a destreza e a segurança para saltar para a mala do carro, os saltos para que é convidado neste momento não excedem essa altura e grau de dificuldade. No GIF seguinte vemo-lo a executar confiante a sua primeira janela, elevada a 50cm de altura e com uma área de apoio de 80cm.

A comunhão de vida e a divisão de tarefas com o dono (parceria), estão pouco a pouco a tornar o Thor mais manobrável e seguro, a alterar-lhe o comportamento e a torná-lo mais confiante na pessoa do dono. Ontem por breves instantes e na companhia do paciente Paco, deixámo-lo sentado à mesa, quieto e a olhar para a fotografia, conforme se pode ver na foto abaixo.

Com isto tudo (estava-se mesmo a ver!), o Miguel Dias também está a aprender a ser dono, a adaptar-se gradualmente para essa tarefa no intuito de garantir o bem-estar, a qualidade de vida e a longevidade do seu irreverente pequeno lobo negro, um companheiro para a vida com o qual sempre poderá contar. É evidente que isto não acontece sem esforço, que é ainda maior para quem sempre andou arredado do exercício físico. Pelo empenho, o Miguel é digno que lhe estendam uma passadeira vermelha em homenagem, porque ousou sair de casa e abraçar a vida ao lado do seu parceiro, objectivando uma unidade de propósitos difícil de destruir.

Durante o treino constatei que o Thor se encontra mais robusto, melhor dos aprumos e menos selado, com uma apresentação diferente daquela com que aqui chegou (exagerado abatimento de metacarpos, mãos atiradas para fora e dorsos selado), se calhar como resultado de pouca actividade, de uma ração inapropriada e de umas supérfluas vitaminas para aves de capoeira, periquitos, canários e pintassilgos. Quanto à linha do cachorro nada há a acrescentar – estamos na presença de um excelente exemplar de trabalho – de morfologia, carácter e máquina sensorial, com a particularidade de apresentar ainda parte do pelo encrespado no dorso, pormenor que o liga às origens da raça.

Sem comentários:

Enviar um comentário