Adquirir
um cão pode ser o “cabo dos trabalhos” para quem não sabe aquilo que o espera, porque
a presença do animal sempre acabará por alterar as rotinas e a vida dos seus
donos, porquanto é um ser vivo com necessidades específicas, cuja curiosidade
reclama por novidade de vida, que mete o nariz literalmente em todo o lado, que
não dispensa a excursão e que se desenvolve cognitiva e fisicamente a marchar
pelo mundo à sua frente. Donos demasiado sedentários e por norma sem tempo não
deverão adoptar um cão, porque a sua pouca disponibilidade, que na maioria dos
casos resulta de um achaque psicológico com implicações físicas, acabará também
por trazer infelicidade ao animal, transformando-o muitas vezes naquilo que ele
não quer ser – num zombie engaiolado – mesmo que seja numa gaiola de ouro!
O
cachorro CPA negro Thor, que tardiamente foi vendido e adquirido, em
consequência disso foi naturalmente instigado a morder nos seus companheiros de
cárcere e tardiamente atrelado, ao invés de ter tido o exigível tratamento
individual e ser poupado às lutas hierárquicas que despontam aos 4 meses de
idade. Compreende-se agora o seu desencanto pela trela e as cargas que efectua
sobre os outros cães, mesmo que sejam maiores do que ele, inclusive adultos.
Ele é um cão dominante mas não muito-dominante, que à falta de melhor, optou
por descarregar o seu impulso à luta nos seus companheiros de canil, servindo
alguns deles eventualmente como seus mestres. Esta impropriedade instaladora
(ambiental) subverteu-lhe o carácter, uma vez que os cães com nobreza de
carácter não mordem noutros cães, procuram outros alvos maiores. Agora importa
trazê-lo para a rua, sociabilizá-lo, estender-lhe a liberdade e devolvê-lo à
vida, operando assim a recuperação do seu carácter na companhia do seu dono,
com quem já tem alguns laços afectivos, mas que pouco respeita. O caminhar
conjunto e a divisão de tarefas agora exigidas apenas visam o aumento da
necessária cumplicidade.
Nesta
cruzada pela recuperação do pequeno Thor, que ao que tudo indica virá a ter no
mínimo 68 cm de altura, como já disse atrás, torna-se imperativo sociabilizá-lo
com pessoas e animais, pelo que a presença do CPA negro Paco nas suas
caminhadas é mais do que necessária - é imprescindível - andando o cão adulto a
aturar e a desmamar aquele cachorro “inquieto” (ambos na foto seguinte na
companhia de duas simpáticas empregadas de restaurante).
Nesta
altura do campeonato (o animal ainda não fez 6 meses), para não dar cabo do
resto e atentar contra a vocação do cachorro, não o vou bombardear ou persuadir
com a obediência, antes vou substituí-la pela ginástica ao seu alcance, o que
lhe aumentará a moral e torná-lo-á mais seguro. Como a ginástica é feita à
trela, gradualmente o cachorro ficará condicionado a aguardar pelas ordens do
dono, o que obviamente aumentará o seu controlo e obstará aos seus
imprevisíveis ataques de surtida. Como já possui a robustez, a destreza e a
segurança para saltar para a mala do carro, os saltos para que é convidado
neste momento não excedem essa altura e grau de dificuldade. No GIF seguinte
vemo-lo a executar confiante a sua primeira janela, elevada a 50cm de altura e
com uma área de apoio de 80cm.
A
comunhão de vida e a divisão de tarefas com o dono (parceria), estão pouco a
pouco a tornar o Thor mais manobrável e seguro, a alterar-lhe o comportamento e
a torná-lo mais confiante na pessoa do dono. Ontem por breves instantes e na
companhia do paciente Paco, deixámo-lo sentado à mesa, quieto e a olhar para a
fotografia, conforme se pode ver na foto abaixo.
Com
isto tudo (estava-se mesmo a ver!), o Miguel Dias também está a aprender a ser
dono, a adaptar-se gradualmente para essa tarefa no intuito de garantir o
bem-estar, a qualidade de vida e a longevidade do seu irreverente pequeno lobo
negro, um companheiro para a vida com o qual sempre poderá contar. É evidente
que isto não acontece sem esforço, que é ainda maior para quem sempre andou
arredado do exercício físico. Pelo empenho, o Miguel é digno que lhe estendam
uma passadeira vermelha em homenagem, porque ousou sair de casa e abraçar a
vida ao lado do seu parceiro, objectivando uma unidade de propósitos difícil de
destruir.
Durante o treino constatei que o Thor se encontra mais robusto, melhor dos aprumos e menos selado, com uma apresentação diferente daquela com que aqui chegou (exagerado abatimento de metacarpos, mãos atiradas para fora e dorsos selado), se calhar como resultado de pouca actividade, de uma ração inapropriada e de umas supérfluas vitaminas para aves de capoeira, periquitos, canários e pintassilgos. Quanto à linha do cachorro nada há a acrescentar – estamos na presença de um excelente exemplar de trabalho – de morfologia, carácter e máquina sensorial, com a particularidade de apresentar ainda parte do pelo encrespado no dorso, pormenor que o liga às origens da raça.
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