O
cavaleiro tauromáquico João Moura foi ontem, quarta-feira, dia 24 de janeiro de
2024, condenado pelo tribunal de Portalegre a uma pena de quatro anos e oito meses
de prisão, com execução suspensa, por maus-tratos a animais de companhia. O
agora condenado estava acusado pelo Ministério Público de 18 crimes neste
âmbito. De acoro com o despacho da acusação do Ministério Público, alguns
dos cães apresentavam uma "magreza acentuada" ou um "estado
caquéctico", enquanto outros eram portadores de lesões ou escoriações e
infecções provocadas por parasitas ou mesmo doenças. Uma cadela, com quase oito
anos de idade, que "sofria de insuficiência hepática e renal aguda",
além de apresentar um "estado de caquexia" e "cortes profundos
na zona do metacarpo sem sinais de cicatrização", acabou por morrer no dia
da operação da GNR. Garcia Pereira, advogado da SOS Animal, diz que a
condenação de João Moura é uma satisfação muito amarga e que não apaga o enorme
sofrimento que foi imposto àqueles animais. Por sua vez, Luis Semedo, advogado
de João Moura, diz que o tema das touradas não devia ter feito parte do
julgamento e que ainda não sabe se vai ou não apresentar recurso. “As touradas
não têm nada a ver com este julgamento mas vieram a este julgamento porque
estas associações que se constituíram assistentes quiseram que essa situação
viesse a julgamento”, disse Luís Semedo, à saída do tribunal de Portalegre.
Não
duvido que o cidadão João António Romão de Moura foi julgado pelos seus crimes
e não pelo facto de ser cavaleiro tauromáquico, muito embora houvesse quem o
quisesse condenar por causa disso também e fazer dele um exemplo para os seus
colegas de actividade, que mercê dos actos de Moura acabaram por sofrer um rude
golpe na sua aceitação e credibilidade junto dos não-aficionados que não se
opõem às touradas, não obstante muitos deles tratarem os seus cães
principescamente. Sabe quem conhece o meio, que a enraizada cultura marialva
não peca por excesso de meiguice e cuidado com os seus cavalos, que muitas
vezes, à revelia da técnica e da arte, lhes extrai à bruta e “à meia-volta” (de
improviso) aquilo que os animais não têm para dar ou para o qual não se encontram
ainda conveniente preparados, pois não são só os toiros que sangram
abundantemente no lombo, os cavalos também sangram invariavelmente na barriga
pela acção das rosetas das esporas (raro é o cavaleiro que entra à praça de
esporins, haverá algum?). Este modo pouco pedagógico de estar no mundo equestre
taurino começa logo no maneio e estende-se ao desbaste dos animais,
perpetuando-lhes traumas que muitos identificam como “crenças”.
João Moura nasceu neste meio e não pode ser condenado pelas suas origens culturais, pelo que eu posso não gostar de touradas, o que não implica que lhe deseje mal ou que lhe negue a defesa e o perdão. Condená-lo-ei quando violar as leis que ele e eu somos obrigados a respeitar, pondo em causa direitos e liberdades de pessoas e animais, como foi o caso. Pondo de parte o cavaleiro de Monforte e pronunciando-me sobre as touradas em Portugal, cujo futuro estará sempre ligado a Espanha, estamos a assistir a um conflito multigeracional entre uns que não querem largar as suas tradições e outros que as abominam. Todos sabemos disso e assistimos a posições extremadas, não sendo inocente o aumento da idade mínima para quem pretende assistir a uma tourada, porque a violência aceite na infância, na maioria dos casos, não provoca estranheza na idade adulta. Já os adultos que não foram criados com ela, depressa denunciarão a sua crueldade. Não parece restar dúvida de que as touradas são um remanescente da milenar antiguidade clássica e da sua mitologia – até quando durará este circo cruel? Já deixámos de deitar pessoas às feras, quando deixaremos de ser feras para os animais? O problema é mais educacional do que cultural, porque doutro modo ainda estaríamos a advogar a escravatura, por exemplo. No meio disto tudo, sem culpa alguma, há a lamentar o sofrimento atroz e a morte dos galgos que foram parar as mãos de João Moura, que provavelmente ainda não reflectiu o suficiente sobre a desumanidade do seu comportamento que o levará a ter remorsos.
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