Há 25 anos atrás a
Acendura Brava empenhou-se na criação Pastores Alemães para alcançar uma linha
de trabalho capaz de ombrear com os melhores exemplares da raça das décadas de
30, 40 e 50 do século passado. O nome “Acendura” espelha esse mesmo propósito
porque advém do verbo latino “acendrar” que significa lapidar e purificar.
Lapidar e purificar o quê? Lapidar as menos valias presentes nos cães que
escolhemos através de beneficiamentos acertados e purificar ou libertar os
nossos cachorros da acção castradora da endogamia e da consanguinidade,
valendo-nos para isso de várias linhas de criação e das diferentes variedades
cromáticas ainda aceites pelo estalão da raça. Nunca foi nosso objectivo criar
uma nova raça ou abastardá-la, somente restituir-lhe o bom-nome que pouco a
pouco foi perdendo, perca que levou consigo a extraordinária capacidade
cognitiva, a excelente máquina sensorial, a versatilidade biomecânica, a
valentia e a presença ostensiva outrora presentes nestes cães, qualidades que
fomos encontrar nalguns nichos de criação nacionais e estrangeiros, sem nunca
rompermos nem nos afastarmos em absoluto dos exemplares de exposição, enquanto
parte integrante da raça e constituído em subtipo pelos “maravilhados” que
nutrem uma especial aversão pelo trabalho.
A procura das mais-valias
laborais nos Pastores Alemães levou-nos no sentido contrário, à produção de
pistas tácticas que nos ajudassem a escolher acertadamente os reprodutores do
nosso interesse, mediante a sua aprovação em exercícios e obstáculos que
certificavam a sua coragem, rusticidade, cumplicidade, concentração e índices
atléticos, pelo que foi o trabalho a adiantar-nos qual o cão desejável e não o
parecer subjectivo de uns tantos dogmáticos, que imaginam a partir do que vêem
e que nunca chegam a ver aquilo que imaginam. Interessava-nos alcançar um cão
que aos 12 meses estivesse física e psicologicamente apto e maduro para
qualquer serviço destinado à raça, o que nos levou imediatamente para a
seguinte construção: 20%
de Negro, 30% de Lobeiro e 50% de Preto-afogueado ou 1/8 N, 3/8 LB e 4/8 PA,
sendo esta a construção embrionária e básica dos cães da Acendura Brava que os
liga à proto-selecção e que os torna recessivos na variedade negra.
O uso de exemplares de
diferente variedade cromática não se remeteu apenas à diversidade da sua cor
mas também e em primeiro lugar à riqueza da sua personalidade e solidez de
carácter. O recurso às três variedades cromáticas transportou-nos para outras
há muito desaparecidas e esquecidas. Para a produção específica das diferentes
variedades cromáticas servimo-nos de equações próprias para a sua obtenção com
qualidade, sempre dentro duma política reprodutora de quadro aberto por
conhecermos quais as limitações genéticas da criação isolada de cada uma delas.
Depois de uma década de
testes e de criação exaustiva, suportada pelo adestramento a terceiros, venda
de ninhadas e pelo hotel canino, alcançámos o tipo de cão que melhor nos servia:
um clássico companheiro rectangular de “121” (1 parte de espádua, duas de dorso
e 1 de garupa) curioso, também próprio para o serviço nocturno e sob condições
mais exigentes, sempre disponível e interactivo, próprio para qualquer tipo de
terreno, um marchador de alta cadência mas de fácil transição nos andamentos
naturais, com igual desempenho dentro e fora de água, rústico, resistente e de
grande disponibilidade atlética, intimidador, compacto e ao mesmo tempo veloz,
nobre de carácter e de fácil sociabilização entre iguais, difícil de assustar e
altamente persistente. Um cão ligeiramente maior e substancialmente mais
robusto que os exemplares de exposição, com maior envergadura, de stop mais pronunciado,
crânio mais pesado, excelente de ossatura e aprumos, de dorso mais paralelo ao
solo, de costelas mais redondas, membranas interdigitais menos rasgadas
(redondas), menos propenso ao pé chato e ao abatimento de metacarpos, com uma
garupa equilibrada e bem desenvolvida, de média angulação traseira
independentemente da sua cor ou tipo de manto.
O linha ou canil que nos
serviu de base foi a Rheine-Möselring, que como é sabido apresentava grande
dimorfismo sexual, disparidade que combatemos pelos beneficiamentos com cães
negros doutra procedência no Inverno, que fizeram subir as fêmeas e entravar o
pernaltismo nos machos. Os nossos machos tipo, que não se intimidam perante
qualquer tipo de agressor e que não tremem diante de disparos, medem entre 66 a
70 cm de altura, pesam entre 40 a 48 kg, têm um perímetro torácico de 86 cm, um
coeficiente de envergadura de 1.7, uma velocidade instantânea de 45 km/h e entre
60 e 70 pulsações por minuto, quando adultos e em descanso. As fêmeas, que apresentam
as mesmas qualidades dos machos, sendo por isso próprias para tomar parte em
matilhas funcionais, medem entre 62 e 66 cm, pesam entre 38 e 44 kg, têm um
perímetro torácico de 82 cm e algumas delas podem atingir velocidades iguais ou
superiores às dos machos, o que coloca em paralelo a sua força de impacto.
Por força da prévia
selecção operada nesse sentido, as cadelas tendem a ninhadas numerosas, de 6 a
10 cachorros, pesando entre 400 e 600g à nascença, consoante o seu número e
tratamento dado às matriarcas. A esperança média de vida dos cães da Acendura
oscila entre os 12 e os 15 anos. Os exemplares lobeiros, por razões genéticas,
duram menos que os demais, de 10 a 12 anos. Os mais longevos são os Red Sable
que chegam a viver 16 anos como temos vindo a ter e a dar notícia.
A contribuição da
variedade preto-afogueada (capa-preta) dotou os cães negros de maior
envergadura e antecipou a maturidade emocional dos lobeiros. Os lobeiros
transmitiram melhor máquina sensorial aos preto-afogueados e uma maior curva de
crescimento aos negros. Os negros dotaram os outros dois de maior equilíbrio
psicológico, tornando-os precoces nas suas investiduras e aumentou-lhes o efeito
surpresa, mais-valias que apontam para a sua salvaguarda e superior desempenho.
Em termos atléticos, como prestação
antecedente e propiciatória para os cães de guarda, só usámos e recomendámos
como progenitores aqueles que alcançavam uma cadência de marcha de 7km/h
durante 120 minutos, os que atingiam os 45km/h de velocidade instantânea, que
saltavam uma vertical de 120 cm sem lhe tocar, que ultrapassam obstáculos tipo
alvo com 40 cm de diâmetro, que não temiam o arco do fogo; que ultrapassavam muros
de 2.5 m de altura, que saltavam em extensão no solo 3.25 m, 2.80 m na ponte-quebrada,
que eram aprovados sem reticências nos obstáculos compostos e de múltipla
utilização, os capazes de rastejar e de transportar na boca objectos de
diferentes materiais (aço inclusive) com um peso mínimo de 3 kg, de subir e
descer desacompanhados escadas elevadas a 6 m de altura, que mostravam especial
aptidão em obstáculos oscilantes e que consigam trabalhar sem entraves em
túneis e outros obstáculos abaixo da linha do solo (a nível de pistagem e de
guarda as exigências não eram menores).
O trabalho que levámos a
cabo, bem-sucedido pelo estudo e pela dedicação, ainda hoje torna possível a
identificação de um descendente de 4ª geração da Acendura Brava, como nos
sucede quando vemos um Pastor Alemão digno desse nome, ao ser testemunha e vivo
representante das glórias passadas que alardeia e transporta.
Sem comentários:
Enviar um comentário