segunda-feira, 22 de maio de 2017

BENEFICIAMENTOS ENTRE AS LINHAS DE TRABALHO E A DE BELEZA NO CPA

Uma das razões que levou à edição deste blogue, para além da divulgação das nossas actividades, foi a de revelarmos em primeira mão e não pela boca de outros aquilo que experimentámos e o que aprendemos para melhor podermos aconselhar os interessados que nos procurarem, assim como denunciar o plágio doutros e rejeitar autorias que nos são estranhas ou alheias, que insistem em atribuir-nos por conveniência, incompreensão ou manifesta maldade. E porque importa desambiguar e esclarecer de uma vez por todas qual a nossa opinião acerca dos beneficiamentos entre as linhas de trabalho e a de beleza no CPA, vamos agora fazê-lo através da resposta directa a perguntas concretas.
EXISTE UMA CLARA DIFERENÇA ENTRE A LINHA ESTÉTICA E AS DE TRABALHO NO CPA OU NÃO? Estamos perante uma só raça e a diferença entre as linhas resulta de díspares critérios de selecção para o fim procurado. Se podemos falar de uma só linha estética, apesar das suas múltiplas variantes, somos obrigados a falar de várias linhas laborais de acordo com os trabalhos ao alcance da raça, que poderão ser específicos ou históricos. Basicamente, as diferenças entre a linha estética e as laborais são morfológicas e cognitivas, logo psicossomáticas, dentro da biodiversidade ainda presente na raça, que a linha estética desconsidera e as laborais aproveitam mercê dos princípios que presidiram à formação do Cão de Pastor Alemão (CPA). Estas diferenças não são abissais como se de duas ou mais raças se tratassem, mas assentam em pequenos detalhes fisionómicos que garantem uma maior desenvoltura e versatilidade biomecânica. E quando assim é, assistimos em simultâneo a uma maior capacidade de aprendizagem, na já conhecida relação entre o desenvolvimento físico e o cognitivo. A grosso modo mas sem faltar à verdade, considerando a diferença de linhas, uns preocupam-se mais com a forma e outros com o conteúdo e nenhum deles poderá dispensar o outro em prol da continuidade e do bom-nome da raça.
PODERÃO AS DIFERENTES LINHAS SUBSISTIR SEM A CONTRIBUIÇÃO RECÍPROCA? Lá poder, podem mas não devem, até porque é difícil pôr um elefante a dançar ao compasso de uma formiga, sabendo-se da inescusável unidade entre a morfologia e o desempenho. Se a criação isolada de CPA’s para shows de conformação tem contribuído para uma menor aptidão laboral desses exemplares, ao ponto de serem para isso desprezados, a criação em separado das linhas laborais tem gerado animais incaracterísticos e arredados do Estalão, evoluindo a rumo próprio e para parte incerta até à sua transmutação para outros grupos somáticos caninos. Assim, o equilíbrio entre a morfologia e o desempenho deverá sempre ser respeitado, considerando em primeira mão o bem-estar dos animais e depois o seu aproveitamento, para que não aprisionemos um lobo no corpo de uma pulga ou alcancemos um lobo com alma de cordeiro. Por tudo isto, na nossa opinião, o beneficiamento entre as linhas de trabalho e a estética no CPA é de todo desejável. Mais, a separação de linhas nunca deveria ter acontecido (ficou a dever-se à isenção do trabalho) e o desprezo pelas variedades recessivas muito menos, atendendo a necessária biodiversidade.
QUANDO É QUE SE JUSTIFICA O BENEFICIAMENTO ENTRE AS DIFERENTES LINHAS?  Quando qualquer uma delas começa a perder características, quer elas sejam morfológicas ou laborais. É comum, depois de várias gerações, que os cães de trabalho percam algumas características morfológicas, atendendo que o tiveram como principal princípio selectivo. Do mesmo, os cães de estrutura, seleccionados quase exclusivamente pela sua morfologia, nas mesmas circunstâncias e em igual período de tempo perdem algumas (por vezes muitas) das suas características laborais. Em ambos os casos a solução é óbvia: há que operar um beneficiamento interlinear, porque só a biodiversidade poderá restituir às proles vindouras aquilo que a endogamia e a consanguinidade roubaram a cada um dos seus progenitores.
QUANDO RECORRER A UM CÃO DE LINHA ESTÉTICA PARA BENEFECIAR OUTRO DE LINHA LABORAL? Quando o cão de trabalho for de cor recessiva e igual à dos seus pais e avós (red sable, negro, azul ou cinzento) convém que isso aconteça à 3ª geração, porque estas variedades, quando criadas isoladas, tendem a curvas de crescimento mais curtas e gerar exemplares mais leves e mais pequenos, por vezes até incaracterísticos, mais próximos do inicial e pouco diferenciado cocktail comum a Pastores Belgas, Holandeses e Alemães. As variedades laborais preto-afogueada e lobeira só necessitarão da contribuição de um exemplar de linha de beleza caso tendam a “carregar a garupa às costas” (com ela mais alta que a cernelha) ou a sua biomecânica se mostrar imprópria para o trabalho a realizar.
O QUE SE GANHA NOS BENEFICIAMENTOS INTERLINEARES? Tanto se pode ganhar como perder quase tudo, porque importa que os se progenitores se completem, que suprimam as menos valias um do outro e não que as agravem. Os exemplares de linha estética, caso o beneficiamento tenha sido o correcto, ganham maior equilíbrio psicológico, longevidade, maior envergadura, rusticidade e superior impulso ao conhecimento (melhor capacidade de aprendizagem). Por seu lado, os exemplares de linha laboral ganham as características físicas que mais ajudam o seu desempenho. Temos por experiência própria que por detrás de um excelente cão de trabalho está um exemplar de linha estética, desde que a sua contribuição não exceda os 4/8. Os exemplares nascidos dos beneficiamentos interlineares são chamados de “meia-linha”, nascendo uns mais tangíveis à linha estética e outros à laboral. E sabem que mais, nenhum cão de linha estética ou laboral bate no seu todo um bom meia-linha!
O QUE SE PODE PERDER NOS BENEFICIAMENTOS INTERLINEARES?  O benefício procurado, quando às suas proles são transmitidas as menos valias de ambos os progenitores. Exemplo disso é quando os cães meia-linha saem pernaltos ou afectados pelo nanismo, demasiado nervosos, desinteressados ou medrosos, desaprumados, de ossatura leve, peito estreito e mãos atiradas para fora, abatimento de metacarpos, descodilhamento, costelas demasiado planas, dificuldades na transição de andamentos, portadores de um quadro intolerância alimentar muito vasto e afectados pela insuficiência pancreática exócrina (a lista é interminável). A melhor maneira de acautelarmos o que pretendemos transmitir às ninhadas é saber se as mais-valias presentes nos seus progenitores estavam também presentes nos seus ascendentes há pelo menos 3 gerações, o que equivale a dizer que somos obrigados a conhecer pormenorizadamente a famílias de cada um deles para os usarmos em consciência e com menor margem de erro.
TODOS OS CÃES MEIA-LINHA PODERÃO SER CONSIDERADOS EXEMPLARES DE TRABALHO? É evidente que não, só o serão quando testados e aprovados no trabalho, que deverão desempenhar cabalmente sem lhes resultar qualquer entrave, incapacidade, insuficiência, impropriedade ou lesão.
COMO SE DISTINGUE UM EXEMPLAR DE MEIA-LINHA DOS EXEMPLARES DE LINHA ESTÉTICA E DE LINHA LABORAL? Há por aí muitos falsos cães de trabalho, cães de meia-linha que mais devem à sua existência à beleza que ao trabalho propriamente dito, resultantes de experiências mal conseguidas ou da tentativa frustrada do aproveitamento de um exemplar extraordinário. Um cão de meia-linha sempre carrega a contribuição do seu progenitor de beleza, nomeadamente em assimetrias morfológicas que não são visíveis nem nos exemplares de exposição nem nos de trabalho, sendo comum verem-se cães de envergadura intermédia, de costelas planas com garupas arredondadas e vice-versa, ossaturas invejáveis com divergência de mãos, pés de lebre com membranas interdigitais redondas, excelentes implantações de orelhas em crânios de stop elevado, exemplares de pelo duro com caudas farfalhudas, antagonismo da cor dos olhos em relação ao manto, média angulação dos membros traseiros, etc.  Do ponto de vista psicológico, não havendo intromissão humana, os cães de meia-linha, ao ganharem envergadura, robustez e força, tendem a aflorar os seus instintos e a participar em brigas entre iguais, porque lhes falta a serenidade, a sobriedade e a nobreza que os cães laborais nunca perderam, pelo que a contribuição de dois cães de meia-linha equilibrados é preferível, em todos os aspectos, aos interlineares nos beneficiamentos.
O QUE É A POLÍTICA DE QUADRO ABERTO E PARA QUE SERVE? Entende-se por “Política de Quadro Aberto” o princípio selectivo que procura devolver a cada ninhada de CPA’s os benefícios de todas as variedades cromáticas ainda presentes na raça, quer elas sejam dominantes ou recessivas, para se estabilizar a polivalência que notabilizou o Deutscher Schäferhund. Estamos a tratar de beneficiamentos entre as diferentes variedades cromáticas, robustecendo cada uma delas com os méritos de outras, como sucedeu no passado e que terminou quando se começou a beneficiar cada variedade cromática isoladamente, despropósito que aumentou substantivamente a consanguinidade e a endogamia, primeiras responsáveis pela menor procura, demérito e declínio do Pastor Alemão actual, que na maioria dos casos se encontra irremediavelmente moribundo e em profunda agonia solicitando amiúde o auxílio dos veterinários, que nem sempre têm como lhes valer.
Assim, criar isoladamente uma variedade cromática dentro do CPA, para além de uma involução, é enveredar deliberadamente por uma ruptura com o seu passado e grandeza, assim como fazer orelhas moucas ao que Stephanitz disse: “Se o cão é bom, a sua côr não pode ser ruim”. Os benefícios da “Política de Quadro Aberto”, que exige canicultores sapientes e experimentados, não se resumem apenas a um aumento cognitivo e operacional, porque dão também aos cães melhor equilíbrio físico e psicológico, saúde, rusticidade, pulmão, resistência e longevidade, condições que o seu bem-estar não dispensa. Há pois que combater a eugenia negativa e os seus terríveis reflexos nos cães. 

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