Anteontem
bem cedinho, a classe em instrução desta escola rumou às lezírias do Rio
Sorraia, onde se reencontrou com a Maria para dar início aos trabalhos
matinais, tendo como pano de fundo a lezíria, o bruar do rio como música
ambiente e os pássaros ripícolas a cantar sob uma névoa passageira. A
obediência linear deu início aos trabalhos e aconteceu sobre um amplo espaço
relvado. A foto acima espelha um desses momentos. Como da obediência linear
passámos à dinâmica pelo recurso ao “passo de corrida”, convidei seguidamente
todos os binómios para um “salto de precisão” sobre um caixote de lixo
circular, feito em madeira, com um raio e 50 cm e elevado a 1 metro de altura.
“SALTO DE PRECISÃO”
é todo o obstáculo vertical que não tem balizas, por vezes de superfície
irregular, elevado minimamente a 1 metro e com uma largura máxima de 50 cm,
salto de difícil execução técnica que é destinado aos binómios mais
experimentados, operacionais e evoluídos no intuito de aumentar a sua
capacidade de resolução, reduzindo a zero o risco de acidentes ou qualquer
atropelo ao seu bem-estar. Toda a classe venceu aquele obstáculo introdutório
cómoda e alegremente. Na foto que se segue vemos o desempenho vitorioso do binómio
Catarina/Titã.
Tendo
em vista a necessária aptidão do CPA Dobby, foi necessário proceder-se a uma
troca de condutores, passando o Jorge Filipe para o Dobby e a sua cadela CPA
para Maria. Na foto abaixo vemos o desempenho do primeiro caso. A prestação do
Dobby foi excelente e o Jorge confessou nunca ter experimentado um cão com
tanta força.
Atendendo
às condições climatéricas, à idade, à carga horária e ao preparo dos cães
evoluímos para os saltos sobre muros, iniciando a tarefa sobre um de alvenaria
com 1,8 m de altura. Como era a primeira vez que o Dobby enfrentava tal
desafio, o Jorge foi mais uma vez chamado para ajudá-lo. O cão não se acobardou
com o muro e até se agradou da experiência. Para aliviar o o esforço do
voluntarioso condutor de ocasião, mandei colocar a Maria do lado de lá de muro,
para se prestar como subsídio de ânimo para o animal, sendo essa a razão pela
qual aparece uma cabeça saliente no muro (no canto superior direito da foto).
Com
um coreto elevado no centro de uma praça continuámos a prático dos saltos sobre
muros, desta vez para cima do referido coreto. Todos os binómios foram
convidados a fazê-lo e até a SRD Titã, para espanto da sua dona, venceu aquela
parede. Se repararmos na foto com atenção, vemos que a Catarina se pôs em bicos
de pés para conduzir a cadela, postura que não estranharíamos numa performance
do Mr. Bean (o actor Rowan Atkinson). Quando um condutor é baixo e é obrigado a
ajudar o seu cão a transpor uma superfície mais alta do que ele, ao invés de
segurar a trela pelo cabedal de remate da trela, deverá segurar a corrente do
estrangulador para que o seu braço tenha mais alcance.
O
êxito da SRD Titã neste salto ficou a dever-se à prestação do Adestrador, que a
introduziu previamente à tarefa, transmitindo-lhe a motivação e a confiança
necessárias. Desde que lhe contrariemos a tendência de baixar a cabeça à
entrada dos obstáculos, a Titã vence-los todos. Descendente de cães de caça e
de propensão caçadora, aborda os obstáculos ao nariz, levantando depois os
olhos, o que a obriga a reduzir a marcha, a perder o embalo e a um esforço por
demais desusado. Pouco a pouco, por força do condicionamento, esta cadela
abandonará o seu modo natural de abordagem e substitui-lo-á pela abordagem à
vista, concentrando a sua atenção na linha de transposição dos obstáculos.
Depois
de andar dias a fio a tentar que o CPA Dobby saltasse para cima daquele coreto,
a Maria desistiu contrariada do seu intento. Mais uma vez o Jorge veio em seu
auxílio, ela em auxílio do cão e o coreto foi finalmente vencido. Os humildes
jumentos têm uma importante lição a dar aos homens que têm mais olhos do que
barriga, porque quando se apercebem que a carga que lhe colocam em cima é
demasiada, negam-se a andar, mesmo que vivamente molestados. Não há nada que me
impeça de ter o cão que quero, mas isso não me garante que seja o ideal para
mim e eu para ele, que o consiga controlar e corresponder às expectativas para
que ele foi criado. É aqui que entra o “milagre” do adestramento, que foi feito
para os resilientes e que outra coisa não faz do que coadunar homens com cães –
força Maria!
Ao
lado da estátua a um ilustre professor tetraplégico (João Fernandes Pratas
1880-1954), que do seu leito preparou e propôs a exame da instrução primária
403 alunos, debaixo de profundo respeito, ali detivemos os nossos pequenos
guerreiros e grandes companheiros num gesto de sentida homenagem.
Tal
qual dois botões de roseira-brava, arbusto de flores brancas, trepador, perene
e caducifólio usado nas lezírias como incremento à biodiversidade, as nossas
senhoras pousaram junto a uma planta espontânea com exuberantes flores roxas,
mostrando-se alegres e empenhadas no processo educacional dos seus cães.
Ir
à lezíria e não ver cavalos é como visitar Lisboa e não conhecer Belém. Já com
o percurso estudado, numa caminhada plana a perder de vista, chegámos a uma
exploração pecuária onde avistámos vários poldros de diferentes pelagens,
maioritariamente ruços e baios, animais dóceis e já com algum maneio que se
aproximaram de nós e dos nossos cães, o que serviu perfeitamente os nossos
intentos, já que para lá fomos por causa da sociabilização interespécies. Na
foto abaixo vemos a abordagem feita pela Maria e pelo CPA Dobby, com a senhora
a relembrar-se da sua meninice, quando era só e apenas a “Zezinha”.
Ao
contrário da SRD Titã, que a princípio os estranhou, a Catarina adorou os
poldros e de tal maneira se encantou que se pudesse levava um para casa.
Disposta a levar aquela parceria mais longe, a dona da Titã manifestou o desejo
de aprender a montar a cavalo. Será ela uma versão actual do “homem dos 7
instrumentos”?
A
sociabilização da CPA Gaia aconteceu com o Jorge a dar palha ao gado, a cadela
a escapar-se aos beijos dos poldros e a Liliana a gozar a situação, momento
descontraído de um dia passado no campo e naquilo que ele tem para oferecer.
Depois
de abandonarmos com tristeza a lezíria e já com algum apetite a pesar-nos (o
campo tem destas coisas), demos entrada num jardim onde fomos surpreendidos por
um “Chaimite”, viatura blindada ligeira de transporte de tropas com tracção
4x4, desenvolvida e fabricada em Portugal, onde foi a primeira viatura blindada
produzida em série no nosso país. Posteriormente foi vendida aos exércitos do Perú,
Filipinas, Líbia e Líbano, sendo hoje um símbolo da Revolução dos Cravos, uma
memória da Guerra Colonial e de quantos nela combateram (1961-1974). Ao ver
aquela viatura não quisemos mandar a Maria para a guerra, somente exaltar o
predomínio da paz, aquela que vivemos e que nos traz felizes, a mesma que leva
o cão a não temer o carro blindado.
Para
fortalecer o espírito de grupo, procedemos a uma “MANOBRA
DE EXTRACÇÃO CANINA”, manobra que envolveu 3 homens e um cão a
ser evadido. O Adestrador lançou o cão, este escalou o muro e o dono ajudou-o a
fugir, participando ainda na manobra outro interveniente não-visível: o
indivíduo que suspendia o dono. O GIF seguinte é elucidativo quanto ao 2º e 3º
momentos da manobra.
Participaram nos trabalhos os seguintes binómios: Catarina/Titã; Jorge/Dobby; Jorge/Gaia; Maria/Dobby; Maria/Gaia e Paulo/Bohr. A reportagem fotográfica ficou a cargo do Paulo Jorge e a sua edição coube ao Adestrador. A Maria foi nossa anfitriã e almoçámos todos na sua casa, uma selecção de carnes grelhadas escolhida pelo Jorge Filipe, não faltando doces e bebidas espirituosas. Estamos imensamente gratos pela disponibilidade e extraordinária hospitalidade da Maria, que entretanto nos convidou para umas festas populares a realizar-se no próximo mês de agosto. A ida à lezíria foi um sucesso. Futuramente pensamos andar mais uns kms na estrada nacional 118 e ir ao encontro dos ribatejanos borda-d’água, dos viandeiros, para sabermos mais sobre as suas idiossincrasias e demais cultura. Estou em crer que cães e donos regressaram felizes a casa.
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