O teste genético para cães
está a transformar-se num grande negócio e com facilidade as empresas que o
fazem podem vender falsas esperanças, segundo alertam na revista académica e
interdisciplinar NATURE
os cientistas LISA
MOSES, STEVE
NIEMI e ELINOR
KARLSSON num artigo intitulado “PET
GENOMICS MEDICINE RUNS WILD”, respectivamente uma pesquisadora
veterinária do Centro de Bioética da Harvard Medical School, em Boston, Massachusetts/USA,
um veterinário que é Diretor do Departamento de Recursos Animais da
Universidade de Harvard, em Cambridge, Massachusetts/USA e uma Professora
Assistente da Escola Médica da Universidade de Massachusetts, Worcester,
Massachusetts que é também e directora de genómica de vertebrados no Instituto
Broad de Harvard e MIT, Cambridge, igualmente em Massachusetts/USA.
Apesar da ciência estar
ainda atrasada e a maioria dos testes se basear em estudos pequenos e pouco
abrangentes, da sua precisão e diagnósticos não terem sido validados e da
maioria dos veterinários não saber o suficiente sobre as limitações dos estudos
ou sobre a genética em geral para poder aconselhar os proprietários
preocupados, os testes genéticos para animais de estimação vão de vento em popa
e as empresas já começam a oferecer testes iguais para gatos, quando são
precisas mais informações e proceder-se à adopção de alguns padrões que temos
na saúde humana.
Diante destas
considerações, segundo os cientistas atrás citados, estes testes genéticos
deverão ser refreados, porque doutro modo algumas empresas continuarão a lucrar
com a venda de informações potencialmente enganosas e invariavelmente
imprecisas, que farão sofrer desnecessariamente donos e cães, para além de
desperdiçar oportunidades para melhorar a saúde dos animais de estimação e impedir
que os seus estudos possam ser válidos para a saúde humana. Diante disto, as
pessoas aumentarão a sua desconfiança em relação à ciência e à medicina. Não
obstante, os gastos globais com animais de estimação aumentaram 14% e os gastos
anuais mundiais são estimados ao redor de 109 biliões de dólares.
Como se antevê, a genética
é uma das mais recentes adições nesta indústria em expansão e em todo o mundo
já existem 19 laboratórios confirmados que comercializam testes genéticos,
testes que alguns veterinários usam para ajudar a diagnosticar animais doentes
ou para recomendar que os sadios sejam submetidos a testes caros e por vezes
evasivos, como é o caso das biópsias à medula óssea. Também alguns criadores de
cães valem-se destes testes para tentar reduzir a incidência ou despistar
doenças hereditárias. Nos Estados Unidos, como seria de esperar, uma cadeia de
hospitais veterinários está a recomendar testes genéticos para todos os cães,
adiantando que os resultados tanto possibilitam cuidados de saúde
individualizados como podem orientar o adequado treino comportamental!?
Os autores do presente
artigo crêem que 3 grandes problemas afectam os testes genéticos para animais
no seu estado actual, a saber: FALTA
DE VALIDAÇÃO, RESULTADOS
OU INTERPRETAÇÃO IMPRECISOS e CONFLITOS
DE INTERESSE. Sobre os dois primeiros adiantamos que os
argumentos usados são verdadeiramente validados por evidência científica. Dito
isto, passamos à transcrição do que disseram sobre o 3º problema – o conflito
de interesses. Não havendo regulamentações governamentais nem autopoliciamento
efectivo nesta indústria, há muitos conflitos de interesse associados à
obtenção de lucros dos proprietários dos animais, coisa fácil de acontecer
quando uma corporação proprietária de um banco de dados é também dona da mesma
clínica e fabricante de rações específicas para animais de estimação.
Depois de alertarem para o
“tsunami” de dados genómicos que se avizinha, estes cientistas americanos reclamam
pela CRIAÇÃO DE DIRECTRIZES para
a validação destes testes, que deveriam proceder de um selecto grupo de
interessados e que compreenderia vários grupos de trabalho, directrizes que
especificassem quais os padrões a ser adoptados, um documento semelhante às
directrizes que regulam o uso das novas tecnologias nas pesquisas em animais de
laboratório desenvolvidas pelo Subcomité de Ciência da British Small Animal
Veterinary Association. O ideal, segundo os autores do artigo, é que essas
instruções tivessem alcance global e que se constituíssem em lei à medida que
os testes genéticos crescessem.
Entendem os mesmos
pesquisadores que os actuais bancos de dados existentes, produzidos pela
indústria, universidades e agências governamentais, deverão ser estendidos a
todas as partes, garantindo em simultâneo o anonimato dos animais e dos seus
proprietários. De acordo com o mesmo parecer, as empresas poderão ser
incentivadas a dividir dados quando as directrizes propostas exigirem tamanhos
de amostra que só poderão ser obtidos através do agrupamento de dados. Para
melhorar a transparência, as partes interessadas poderão aproveitar o conhecimento
acumulado nas últimas duas décadas por cientistas que pesquisam a genética
humana e que têm estado a lidar com questões relativas à divisão de dados e com
a privacidade do paciente.
Moses, Niemi e Karlsson
apelam neste artigo ao recrutamento de ferramentas e conhecimentos, nomeadamente
de bioinformáticos, cientistas da computação e outros com experiência em Big Data, já que serão necessários para
gerir e analisar o enorme volume de informações recebidas. É também sugerido
que estes especialistas poderão ser persuadidos a entrar no florescente campo
da genética dos animais de estimação pelos ganhos financeiros ou por oferecer
possíveis avanços para a solução de doenças humanas. Solicita-se ainda a
formação e a educação de conselheiros genéticos entre veterinários e outros que
trabalhem com a saúde dos animais, profissionais que forneceriam apoio e
aconselhamento aos proprietários dos animais após testes genéticos e que também
poderiam agregar-se aos seus colegas do aconselhamento genético humano nos
principais centros médicos académicos.
O
artigo termina apelando a ÉTICA
DOS DADOS, considerando que há questões que poderão exigir um
diálogo público já encetado e a nomeação de conselhos consultivos
especializados, que deverão ter acesso irrestrito a todos os resultados obtidos
por empresas de testes com fins lucrativos, para que não haja omissão de
quaisquer resultados na venda de animais de estimação, o que ainda acontece e
que a continuar poderá desgastar a confiança pública na ciência. O que importa
guardar disto tudo? Que os actuais testes genéticos para cães não são totalmente
fiáveis, por serem pouco abrangentes, carecerem de parâmetros e de haver poucos
que os saibam interpretar. Por outro lado, constata-se que a medicina e a
veterinária andam cada vez mais interligadas e que qualquer avanço científico
acaba por contribuir para o enriquecimento de uns poucos.
PS: Este artigo foi-nos
sugerido pelo nosso amigo e leitor João Carreiras, também ele investigador, pai
de dois portentos e por ora residente em Sheffield/ENG/UK.
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