O dia acordou hoje
cinzento, desagradável e com chuva miudinha, daquela que se diz ser “molha
tolos” e que acaba por molhar todos, tolos e não tolos, da cabeça até aos pés.
Apesar do aparente contratempo, a Svetlana juntou-se à Carla para mais uma
sessão de treino canino, porque importava ensinar o “deita” ao Zeus, afinar o
tri-comando básico à Bull Terrier Maggie e aos CPA’s Capo e Prada. Quando temos
em mãos cachorros que se destinam a guardar pessoas e bens, nunca ensinamos o “deita”
antes dos 6 meses de idade, temendo que a sobrecarga na disciplina da
obediência acabe por neutralizar os instintos e os impulsos herdados a
potenciar. Assim sucedeu também com o Doberman Zeus, agora com 8 meses de idade,
que só foi convidado para o “deita” depois de aprovado nas distintas induções.
Maduro sexualmente, atleta
e competitivo, o Doberman não se agradou de imediato da figura, resistindo a
fazê-la por se sentir menos cómodo, demasiado travado e vulnerável. Depois de
muita insistência e de igual número de tentativas, o cachorro terminou a aula a
fazer o “deita” irrepreensivelmente, o que não o dispensa automaticamente da
recapitulação doméstica. Para facilitar a vida à sua condutora, na obtenção
deste comando de travamento, valemo-nos de uma mesa com 50cm de altura e de 1m2
de área. A Svetlana necessita de melhorar a sua técnica de condução, de se
agarrar aos automatismos funcionais e aos procedimentos que os tornam
possíveis, porque só assim conseguirá alcançar a sincronia entre os comandos
verbais e os gestuais (convém não esquecer que o adestramento canino é também
uma arte.
Dos três cães ao seu
encargo para ensinar, a Carla optou por dedicar mais tempo à CPA cinzenta
Prada, até há pouco tempo a convalescer dum tratamento por via de um descuido.
A Prada é uma atleta de nomeada, não pára quieta nem dia nem de noite e é
extremamente zelosa de tudo o que lhe pertence e não pertence, ao ponto de não
deixar comer os restantes cães da casa, não hesitando em fazer guarda cerrada a
comedouros e bebedouros. Convidada para o “Espelho de Solo”, executou os três
comandos básicos de imobilização sem maiores dificuldades. A sua condutora tem
melhorado significativamente a sua técnica, apesar de desatenta, de apresentar
dificuldades entre o querer e o fazer e de manifestar uma disponibilidade
física ainda insuficiente para as metas que pretende alcançar. Contudo, está a
evidenciar maior aplicação e afinco, literalmente a trabalhar mais e melhor.
A Prada é descendente do
famoso CPA negro Kyrios-Schwartz da Quinta do ABC e herdou dele características
únicas que a tornam vigilante e por vezes demasiado sagaz. Por detrás daqueles
olhos claros, típicos dos cães azuis que tendem a amedrontar os estranhos,
esconde-se um animal ao mesmo tempo rústico, pouco visto e sempre atento. Na
foto seguinte, com a Carla a mandá-la sentar, podemos aquilatar do magnetismo do
seu olhar lupino, que nada indicia e tudo vê, que estando presente parece
ausente.
Nas mãos do adestrador,
que entende como chefe da matilha (macho-alfa), faz tudo depressa e bem, sem se
distrair com os outros cães, sem fintar quem a conduz e sem fazer uso da manha,
estratégica a que recorre para chantagear psicologicamente a sua dona, que não
raramente acaba exausta e sedenta de um café e de um cigarro. Conduzir cães
inteligentes que aproveitam os erros dos seus condutores para os ludibriar,
jamais será uma tarefa fácil para condutores inexperientes, inconstantes e
pouco aplicados.
Foi isto o que fizemos debaixo
de telha, no último dia do mês de Outubro, véspera da Festum Omnium Sanctorum
(Festa de Todos-os-Santos), que alguns por antecipação transformam no Dia
dos Fiéis Defuntos (Dia de Finados ou Dia dos Mortos), rumando aos
cemitérios e adornando-os com flores, num País de tradição católica onde o
número de ateus é cada vez maior. Antigamente ainda se ia às igrejas por
ocasião de baptizados, casamentos e funerais. Agora, com a baixa taxa de
natalidade que temos, raros são os baptismos e os casamentos estão fora de
moda. Sobram os funerais, cerimónias que não deixam saudades a ninguém e às
quais se vai por obrigação. E por falar em mortos, a seguir ao “deita” vem o "morto”, figura importante para reforçar o sentido policial dos cães, que lhes
permitirá descansar com um olho aberto e outro fechado, sempre prontos para
passar da inacção à acção ao mais rápido possível.
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