Deste que tive
conhecimento do abate dum Husky perdido por um polícia numa localidade inglesa,
como se fosse um animal perigoso, fiquei com a ideia do medo que alguns
britânicos nutrem pelos cães, facto que me surpreendeu pelo número de raças
caninas que aquelas Ilhas deram ao mundo. Penso que esse medo é mais assaz
entre os citadinos, que há muito perderam o contacto com o campo e os animais
(julgo não estar enganado).
É notícia em quase todos
os tablóides britânicos online com uma secção dedicada aos animais de
companhia, o resultado dum inquérito feito junto dos carteiros acerca dos
ataques caninos de que têm sido alvo. Depois de algum suspense, é-nos revelada
a raça que mais atacou aqueles funcionários do Royal Mail: surpreendentemente o
Labrador Retriever!
A raça é autóctone da Commonwealth
(Canadá) e no ano passado foram registados no Kennel Club britânico 32.507
exemplares, o que a torna na mais popular do Reino Unido e possivelmente a mais
conhecida. Todos sabemos que os Labradores são por norma simpáticos, pacíficos
e muito comilões, havendo quem lhes chame por chacota de “porcos que ladram”,
porque insatisfeitos com a quantidade de ração que lhes é recomendada, não
hesitam em foçar por toda a parte, tal qual suínos à cata de bolota, e por
outros pormenores que não vale a pena mencionar, ligados ao seu peso, gula e
rapidez em comer.
Todos sabemos que existe
uma relação entre o impulso ao alimento e o impulso à luta, que quem mal usa os
seus dentes para comer, dificilmente os usará para outra coisa, sendo o inverso
também verdade, o que possibilita transformar os Labradores em cães de guarda
(já treinámos uns quantos). Contudo, apesar de atacarem como os cães criados
para esse desempenho, são extraordinariamente corruptíveis e tendo como optar,
preferirão encher a barriga do que guardar ou atacar seja o que for, preferindo
despender energia a fazer a digestão do que gastá-la em correrias sem petisco.
E depois de gordos, ficam de “bem com vida” e a sua disponibilidade é bem
menor. À parte disto, enquanto Retrievers, mantêm o instinto de presa e adoram
transportar.
Naturalmente cativos ao
alimento e “viciados” no transporte, facilmente são distraídos do seu fervor
guardião, pelo que têm sido desprezados na guarda e aproveitados para o que
nasceram: para a detecção e o transporte. A caça aos carteiros britânicos só
pode resultar do seu despreparo e desconhecimento destes cães, porque doutro
modo jamais seriam mordidos, a menos que um estranho e único fenótipo esteja
presente nos Labradores britânicos ou a entrega do correio tenha vindo a ser feita
pelo Calimero ou por Mr. Bean, o primeiro porque treme em demasia e segundo
por ser meio desconsertado.
Ao que tudo indica, a “saga
dos cães perigosos”, tão amplamente divulgada pelos media ocidentais, sucedânea
da fábula do “Lobo-Mau”, está a surtir tal efeito que até o mais manso dos cães
é visto como uma fera no Reino de Sua Majestade, algo para o qual temos um
provérbio: onde canta galo, não canta galinha, pois com dois biscoitos ou com o
arremesso de uma simples garrafa de plástico se anula o querer de um exaltado
Labrador. De certa forma o Reino Unido é terra de fenómenos, cite-se como
exemplo o “Monstro de Loch Ness” e o número de fantasmas que assolam os seus
castelos.
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