domingo, 21 de agosto de 2016

RIO 2016: SEMEAR EXPECTATIVAS PARA PRANTEAR

Parece que os portugueses têm uma necessidade imensa de pranto e de lamento, no que me lembram a avó de uma amiga minha, senhora já falecida, que se dizia santa e digna do Céu, ao ponto de desejar a morte pelo tanto que padecia, à imitação do que Cristo havia sofrido, pelas dores ósseas que a atormentavam e obrigavam a ficar imóvel, ainda que às escondidas se levantasse e andasse normalmente quando assim o entendia. 

No embarque para os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, a situação repete-se em eventos desde género, foram muitas as expectativas depositadas nos nossos atletas, que contagiados e extasiados pela esperança à sua volta, prometeram aquilo que não conseguiram: as medalhas e um lugar no pódio. Agora com os jogos a chegar ao fim, onde falhámos estrondosamente por uma “unha negra”, em que no melhor dos casos fomos os primeiros dos últimos, todos lamentamos a esperança que em vão alimentámos. E como nesta coisas há sempre quem procure razões para o logro e quem necessite de justificar-se, seguimos com atenção as declarações dos nossos malfadados atletas, todas elas díspares e ao mesmo tempo iguais.
É evidente que no embrião deste bruar de falsas expectativas está a comunicação social, hoje mais do que nunca a necessitar de mais leitores e de maior número de audiências, a quem a esperança e o infortúnio servem perfeitamente aos seus interesses, mormente quando se trata de uma representação nacional e o patriotismo vem ao de cima. Todos sabemos que justificar derrotas não é fácil, a menos que reconheçamos a superioridade dos nossos opositores, reconhecimento quase omisso nas declarações dos nossos atletas, que alvitraram outras justificações, umas já gastas e outras que chocaram pela novidade e desplante, rematando-as quase todos com a importância de se sentirem bem com eles próprios, como se tivessem ido ali representar-se a si mesmos, custeado a sua deslocação e não tivessem que responder perante a Nação, que não encafuou nenhum deles contra vontade num avião rumo às Olimpíadas - todos foram para lá por terem alcançado os mínimos olímpicos exigíveis e estarem em condições.
Confrontados com o logro, uns disseram que a sua participação serviu de experiência, outros que passaram o calendário de treino adoentados, houve quem se queixasse do clima, de um treino inadequado por ausência de condições, do calendário das provas, quem se contentasse por ter chegado a uma final, quem prometesse que para a próxima faria melhor, quem nada dissesse depois de haver desistido e ainda quem justificasse o seu mau resultado pela pequenez do País, segundo a saga do eterno pranto que sempre nos tem acompanhado. Sobressai nisto tudo uma organização nacional que nos parece mal estruturada, tirada do desenrasque e votada ao “deus dará”, decorrente de uma filosofia e psicologia imprestáveis a quem a possibilidade do milagre não é estranha. Não obstante, apesar dos 17 milhões de euros gastos, há que dar os parabéns à Telma Monteiro por nos ter dado a única medalha que alcançámos.
Corrijam-nos se estamos enganados: a experiência ganha-se nos meetings internacionais; quem esteve doente durante a preparação, não deverá participar; o clima é igual para todos e num clima como o nosso há que aproveitar as estações do ano que mais se aproximam do encontrado no local dos Jogos; se não há condições de treino, não se justifica a participação dos atletas; o calendário das provas é o mesmo para todos e considera os seus tempos de recuperação ; ser 4º numa final é ser o primeiro dos últimos; promessas não são certezas; quem desiste deverá justificar o porquê e a sua futura participação deverá ser repensada e, a grandeza de um país não depende da sua área mas dos homens que nele habitam. Dos países europeus e entre todos os participantes, fomos o último dos medalhados, em parceria com o caribeño Trinidad y Tobago e com os Emirados Árabes Unidos, apesar da Bélgica, da Croácia, da Holanda e da Sérvia terem uma área menor que Portugal (há muitos mais). 
Alguma coisa vai ter que mudar na filosofia e no trabalho do Comité Olímpico Português, das Federações e também dos clubes, que parecem meras agências de viagens (“O Rio de Janeiro continua lindo!”), mais voltadas para o turismo do que para a representação e dignificação nacionais. É preciso mudar a política do desporto em Portugal, que carece de investimento e de ser levado a sério, mudança que deverá começar nas escolas, onde a Educação Física é desprezada e não conta para nada. Será que em Tóquio iremos ter mais do mesmo? Deseja-se que não mas também já não estranhamos!

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