terça-feira, 3 de maio de 2016

GRANDES SIM, MAS NÃO SÓ NO TAMANHO

Hoje vamos falar de necessidade e tentação, da necessidade de se alcançarem mais e melhores Podengos Grandes nacionais, cujo número é diminuto quando comparado o dos pequenos e médios e, da tentação de se alcançarem Pastores Alemães maiores, desejo tantas vezes presente no criadores desta raça pelas mais variadas razões. Como princípio geral importa dizer que a procura de maior tamanho não deverá alterar as características físicas e psicológicas dos cães, atentar contra a sua raça, diminuir o seu leque de aptidões e comprometer a biomecânica donde são advindos, alterações e menos valias geralmente associadas a este propósito por desrespeito, omissão, ignorância, despropósito, insanidade e vã glória dos seus mentores, uma vez que o tamanho é um dos parâmetros elementares de qualquer raça, um dos alicerces da sua estrutura e quando se mexe nela… o “telhado” pode abanar e cair-nos em cima. Comecemos pelos Podengos Grandes, que os temos visto mais a Norte do que a Sul, independentemente de terem pedigree ou não.
Tudo o que vamos aqui dizer agora, tornar-se-á obsoleto amanhã pelos avanços da engenharia genética, ciência que não tem isentado os cães dos seus experimentos e que também por causa isso bem depressa lhes valerá. Contudo, porque somos mais dados à selecção natural que aos cães de laboratório e esses avanços científicos são por ora bastante dispendiosos, não estando ao alcance qualquer um, vamos aqui adiantar subsídios para alcançar cães maiores por métodos naturais. Para quem não sabe, adianta-se que dois podengos médios podem gerar alguns cachorros grandes e que dois podengos grandes podem ter alguns filhotes médios, particular que coloca a sobrevivência do Podengo Grande dependente da riqueza das dietas e da escolha acertada dos progenitores, ainda que o seu reduzido número se deva mais à ausência de procura do que a outros factores, porque é desarticulado (grande de mais) para o coelho, não se presta como “cão de parar”, poucos exemplares são bem-sucedidos na caça à lebre e muitos deles acabam trucidados pelas presas dos javalis nas matilhas de caça grossa. Pelo que acabámos de dizer, subsiste uma razão económica e não genética para a raridade dos Podengos Grandes. À parte disto, eles são mais independentes que os seus congéneres pequeno e médio, mais lebréis de morfologia e comportamento.
São inúmeras as razões para não se ultrapassar o limite de tolerância nos Pastores Alemães (68 cm), muito embora saibamos que uma fêmea com a altura máxima atribuída aos machos (65cm) quando cruzada com um macho com mais 3 cm do que ela, possa gerar cães que atingirão os 73 cm de altura e a partir destes tirar outros do tamanho de Dogues Alemães. Mas serão Pastores Alemães? Na maioria dos casos não são, sendo por vezes molossos de orelhas erectas. E não o são porque tendem a trocar a marcha pelo passo de andadura, são menos activos, baixam os seus índices de prontidão, são mais indolentes e menos versáteis, tendem a carregar a garupa sobre a cernelha, selam-se com facilidade, perdem angulações traseiras, estão mais sujeitos às diferentes displasias, à panosteíte e à mielopatia degenerativa, sobrando na maioria dos casos exemplares pernaltos ou pesados em demasia, cuja fragilidade ou obesidade chegam a obstar ao uso acertado da sua máquina sensorial. Meter altura num Pastor Alemão não é difícil, difícil é torná-lo maior e preservar as suas características físicas e psicológicas, os seus índices de funcionalidade e aptidão.
Dir-nos-ão que sempre tivemos Pastores entre os 68 e 73 cm de altura e que pesam entre os 42 e os 48 kg, o que é verdade, como também é verdade que são excepções e que não diferem em nenhum aspecto dos demais, sendo ao invés superiores a eles, porque não os escolhemos tendo como base a altura mas segundo as suas capacidades laborais. Será que a sorte nos sorriu? Quem nos conhece sabe que não somos adeptos do fado, não chutamos para onde estamos virados e não esperamos acontecer. Ao invés, somos dados à observação, ao estudo e a comprovação. Todos sabemos que existe uma relação íntima entre os ecossistemas e o desenvolvimento dos cães selvagens, que se desenvolverão mais ou menos de acordo com a sua geografia, clima e cadeia alimentar para além doutros factores, sobrevivendo os melhor adaptados que também por isso se tornarão dominantes (no lugar e entre iguais).
E a verdade é esta: nunca foi nosso propósito alcançar Pastores Alemães grandes (gigantes) mas conservar os seus históricos índices laborais, não nos escusando a procurar e a comprar exemplares assim aqui e além-fronteiras, independentemente de serem de variedade cromática recessiva ou dominante, mais ou menos procurados ou ao gosto de terceiros, porque bem cedo tivemos conhecimento da origem da raça e da biodiversidade que a constituiu. O crescimento dos nossos cães, filhos de pais padronizados, ficou a dever-se em primeira instância à riqueza das dietas que pusemos ao seu dispor, a quem nunca faltou, para além da ração apropriada, a distribuição diária de comida fresca até ao alcance da sua maturidade emocional, o que encareceu de sobremaneira os gastos no nosso núcleo de criação mas que dotou os nossos pupilos de uma envergadura invejável e de grande massa muscular. Aproveitamos a ocasião para pedirmos desculpa pela afronta aos veterinários que nos têm assistido, gente bem-intencionada que sempre nos disse que a ração “tinha tudo”.
E como é um despropósito e um atentado à saúde dos cachorros não o fazer, ao enriquecimento das dietas sucedeu o exercício adequado, ministrado a partir dos quatro meses de idade, tendo como guias os cães adultos em treino que serviram também de seus mestres, manobra de estímulo de cariz social que muito ajudou no seu desenvolvimento físico e cognitivo, tornando-os curiosos, competitivos e audazes. Ao atingirem a maturidade sexual e uma vez inseridos no grupo e escalonamento escolares, os cachorros abraçavam novos exercícios em diferentes ecossistemas, aprendiam a nadar correctamente, acostumavam-se ao trabalho nocturno e em altitude segundo as Estações do Ano que atravessavam. Normalmente aos 10 meses estavam aptos para o trabalho e já evidenciavam qual a sua verdadeira vocação, desenvolvendo-se em cada um o seu potencial, dando-se primazia até ali à ginástica cinotécnica providenciada pela pista táctica. Sim, os cães crescem mais com a multivariedade de exercícios e com a experiência viva e rica – por via ambiental.
Todo o esforço ambiental teria menor sucesso se os seus progenitores não transmitissem os impulsos herdados essenciais para a cumplicidade e para o trabalho, não fossem portadores da robustez assente em bons aprumos que lhes garantia uma envergadura invejável e não ostentassem um superior impulso ao conhecimento. Libertos da consanguinidade e da endogamia, descendentes de progenitores de elevada qualidade laboral e auxiliados por via ambiental (pelo enriquecimento das dietas e pela excursão) alguns deles foram e são gigantes, realçando o propósito para que foram criados – servir.
Pergunta-se agora: para que quer você um Pastor Alemão grande se não o alimenta convenientemente e não sente vontade de o educar e trabalhar? Para lhe fazer bem ao ego e enchê-lo de vaidade? Para meter medo a si e aos outros? Nesta matéria, como em tantas outras, “ter mais olhos que barriga” é um contra-senso, porque animais assim criados e desprezados, caso venham a ser grandes, virão a ser pouco disponíveis, pernaltos, ocos, frágeis e sujeitos a toda a sorte de lesões. Mais do que procurar tamanho no Pastor Alemão, importa dignificá-lo através do trabalho, para nós o primeiro parâmetro para a sua selecção e continuidade. E sabe que mais? Um Pastor Alemão com 70 cm de altura, quando a marchar ao lado do dono, irá exigir dele uma passada constante e rápida de um 1.2 m ou duas no lugar de uma, já que a passo pouco muscula e o galope constante não o equilibra. Assim como o gado engorda debaixo do olhar do dono, o Pastor cresce na divisão de tarefas com o seu líder. Qualquer cão dentro do limite mínimo adiantado pelo Estalão (peso e altura) poderá ser um excelente exemplar e companheiro, porque a diferença não reside na altura mas na qualidade, o que torna a procura exclusiva de maior tamanho num tremendo disparate. 

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