sábado, 27 de dezembro de 2014

BALI NÃO É SÓ PAISAGEM, TAMBÉM TEM O KINTAMANI!

A Ilha de Bali é um destino turístico de eleição, daqueles que quem pode, não desperdiça. Território e Província da Indonésia, é uma das suas 13.667 ilhas e o último bastião hindu naquelas paragens. Parte integrante das Pequenas Ilhas de Sonda, faz parte dum arquipélago com 547 ilhas. Situa-se entre as Ilhas de Java e Lombok, a sua capital é Dempassar e é o maior destino turístico da República Indonésia. Para além das paisagens e praias paradisíacas, da riqueza e carácter único da sua cultura, da afabilidade das suas gentes, dos seus templos, danças e pinturas, que fascinam, Bali também tem um cão autóctone, a aguardar o reconhecimento da FCI: o Kintamani, muito pelo esforço da equipa comandada pelo Sr. Hartaningsih.
A Eurásia, a Ásia, o Sudoeste Asiático e a Oceânia, são fartas em cães primitivos, em pequenos lobos familiares, tipo pária e semi-selvagens, que nalguns casos supriram e continuam a suprir as necessidades de proteína animal das populações, ainda que no passado tenham desempenhado outro tipo de parceria pela domesticação operada, sobressaindo os molossos de montanha e um largo número de variedades de spitz, homogeneidade alcançada mais tarde, pela mistura dos cães nativos com outros que acompanharam as sucessivas migrações humanas, tanto de cariz político como religioso, como foi o caso do Império Mongol, das viagens marítimas chinesas e da expansão do budismo e do islamismo, que no seu todo fizeram proliferar do médio-oriente à Oceânia cães muito idênticos, dos pontos de vista morfológico, psicológico e social. Neste grupo podemos inserir o Kintamani, ainda que menos sujeito a influências exteriores e por isso mesmo totalmente arredado do contributo das actuais raças europeias, embrionárias ou modernas. Uma vez padronizado, o Kintamani, considerando as suas características atávicas, saúde e performances atléticas, tanto poderá contribuir para a formação de novas raças como para o melhoramento das actuais, dependendo isso da utilidade canina procurada.
Como já se disse atrás, o Kintamani é um cão tipo spitz, natural da Ilha de Bali e da Cidade de que lhe deu o nome, que pode ser também encontrado em Sukawana. Ganha crédito a possibilidade de descender do Chow-Chow, que há 600 anos atrás foi introduzido na Ilha por chineses, como a tradição oral sempre disse e agora comprovada por exames genéticos recentes, deitando por terra a hipótese de ter resultado da mistura “lobo-raposa-cão”, alvitrada por alguns. Apesar de ter sempre convivido com os restantes cães semi-selvagens (cães de rua) e de terem uma origem comum, as diferenças morfológicas entre ambos são por demais evidentes, sendo aparentado com o Dingo e com outras raças asiáticas, o que lhe garante a origem nos cães selvagens de Bali e não dos provenientes da eurásia. As fêmeas ainda conservam o hábito de cavarem e parirem num covil, marca indubitável do seu atavismo e ancestralidade. Há quem diga, por analogia, que o Kintamani lembra a mistura entre um Malamute e um Samoiedo.
Estamos na presença de um cão médio, de orelhas erectas, olhos amendoados e castanhos, testa larga, de eixos craniofaciais superiores paralelos, com 50% de crânio e focinho, rectangular, de dorso paralelo ao solo (nalguns casos com a garupa ligeiramente mais alta do que a cernelha), de peito pouco profundo, recto ou pouco angulado de angulações traseiras, de cauda dobrada a partir da linha média, de fácil transição para o galope e de pele negra, de pêlo longo e ainda mais comprido e intenso do pescoço para o peito. A cor preferida é o branco, com um tom mais avermelhado na parte superior do revestimento e com orelhas cor de damasco, apesar de subsistirem exemplares unicolores brancos, pretos e beges, e bicolores castanho e branco, dourado e preto e preto e branco, estes últimos mais próximos dos cães de rua presentes em Bali. A altura dos machos vai dos 45 para 55cm e a das fêmeas dos 40 para os 50cm.
Segundo as informações que nos chegam, provenientes dos seus criadores e de quem o conhece, o Kintamani é um cão muito independente, territorial, agressivo dentro do seu espaço, inteligente, resistente e suave, leal e amigo do dono, com um raro sentido de alerta, sendo muito procurado como animal de estimação, passando a vida empoleirado em muros e telhados, graças à ligeireza de pés e a uma agilidade acima da média. Diante desta descrição, porque escrever apaixonadamente sobre cães é fazê-lo por amor à verdade, podemos concluir que é mais um cão de alarme do que um típico cão de guarda, um cão mais para ser apreciado do que para ser usado, que devidamente acompanhado nos seus ciclos infantis, poderá ser usado na detecção de explosivos e de estupefacientes, como cão de show e de agility. A tremenda independência que patenteia, comum à maioria dos spitzs, irá obrigar a um treino afectuoso e persistente, melhor conseguido a partir dos brinquedos e por uma liderança mais suave ou dissimulada, pois quem já se dedicou ao treino de cães primitivos e viveu a seu lado, sabe que a inteligência humana tem que se sobrepor à sua astúcia, para que imposição não inviabilize a parceria desejada. À parte disto, porque lhes é contranatura, quando verdadeiramente condicionados, saturam-se e alcançam a senilidade mais cedo, ainda que fisicamente não denotem qualquer fragilidade.
Há que louvar e incentivar o esforço dos balineses pela selecção, divulgação e exaltação do Kintamani, caso único na Indonésia e que só dignifica quem abraçou essa aposta. Para nós, que nos dedicamos ao trabalho, ele não é um produto acabado, mas poderá ser, como atrás já o dissemos, um melhorador de raças fustigadas por impropriedades de vária ordem. Elevar o Kintamani é salvá-lo da extinção e dotar a cinotecnia intercontinental de uma raça pouco vista, que melhor ajudará à compreensão do lobo familiar como um todo. Para nós há uma raça oriental incontornável: o Chow-Chow, um melhorador de raças por excelência, que transmite resistência, carácter e maior impulso ao conhecimento, quando combinado com a maioria dos lupinos, independentemente de serem primitivos e sem fim à vista ou objecto de selecção continuada com objectivos específicos.

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