Anteontem
pela manhã, domingo, num arrabalde abrigado do mar pela majestosa Serra de
Sintra, a convite de um aluno meu que deseja saber mais sobre Pastores Alemães,
fui apreciar uma ninhada de um imigrante estrangeiro, indivíduo que se mostrou
pouco simpático e algo nervoso, o que não é nada bom para o imprinting dos cachorros,
que espelharão não só a sua genética como também o seu primeiro contacto social
com humanos, marca irreversível que carregarão ao longo da sua existência.
Assim, na escolha de cachorros, para além da apreciação individual de cada um
deles, há que considerar também o particular do seu criador, não me
transmitindo aquele nenhuma confiança, pelo que jamais lhe compraria qualquer
cachorro. Convém dizer de antemão que pretensamente íamos procurar um cachorro para
guarda.
Ao
entrarmos no recinto onde os cachorros se encontravam, fomos recebidos como
visitas assíduas da casa, com apatia, indiferença e silêncio por cães e cachorros
como se não existíssemos. Somente um cão adulto e mais interactivo se predispôs
a brincar com um menino que nos acompanhava, mostrando-se por demais dócil
dentro do seu território e estar acostumado a “ir à procura da rolha”, a
apanhar tudo o que lhe jogarem, o que nada abona em favor da sua sobrevivência.
Os restantes cães adultos que nos foram dados a observar, a matriarca da ninhada
inclusive, mostraram-se quedos e mudos, como se para ali fossem transplantados
por algum encantamento, não estranhando a intrusão nem esboçando qualquer
tentativa de defesa do seu território. Enquanto isto, os cachorros passaram o
tempo todo deitados, o que dificultou a sua avaliação mas que revelou de
imediato qual o seu carácter.
Estranhamente,
porque não é todos os dias que vejo cachorros dentro da curva de crescimento da
raça, os cachorros apresentavam-se bem desenvolvidos, dentro do peso desejável
para a idade, com a envergadura própria para o seu tamanho, com excelentes
aprumos dianteiros e traseiros, com boas cabeças e osso, boa inserção de
orelhas e caudas padronizadas – morfologicamente quase irrepreensíveis!
Contudo, faltava a estes cães de encher o olho, rusticidade, curiosidade, vivacidade,
irreverência, movimento, beligerância, espírito competitivo e sentimento de
pertença. E, quanto mais olhava para eles, mais a minha cabeça se confundia, ao
ponto de confundi-los a espaços com uma ninhada de chinchilas, também elas
agradáveis à vista mas sem préstimo para guardar seja o que for!
Ao analisar aqueles cachorros à luz dos principais impulsos herdados que o ofício guardião requer, apercebi-me que eram carentes de movimento, que não lutavam entre si, que não guerreavam pela posse de nada, que nenhum deles intentava dominar sobre os demais e que apresentavam um considerável défice de atenção, pormenores que automaticamente os arredavam de qualquer trabalho relativo à segurança de pessoas e bens, mas que tornam possível a sua utilização não especializada noutros serviços e propósitos. Na escolha de um cachorro importa considerar uma estrela de 6 pontas, estando em cada uma delas um impulso herdado a considerar (ao alimento; ao movimento; à luta; à defesa; ao poder e ao conhecimento) e aqueles nesta matéria não tinham ponta que lhes pegasse! Saí do local mais depressa do que entrei, revoltado e com uma saudade enorme dos cães que já criei - aqueles cães tinham tudo e não tinham nada!
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