sexta-feira, 2 de setembro de 2022

BURRADA DE ALICANTE

 

Tenho uma natural aversão em comentar disparates perpetrados por povos que vivem à sombra da bandeira da Monarquia Espanhola, porque a minha família ultrapassa as fronteiras que separam Portugal de Espanha e ao fazê-lo é como se me picasse a mim mesmo. Não obstante, há casos e casos, e o que vou hoje noticiar envergonha qualquer um pela sua crueldade e ignorância desusadas, que associadas à burocracia, acabaram por vitimar um cão num terraço em Torrevieja, na província de Alicante, na Comunidade Valenciana. Alicante que já era famosa pelos seus passeios turísticos de burro, passa doravante a sê-lo também pelas suas “burradas”. Em Torrevieja, um cão tipo lupino morreu depois de ter ficado amarrado à torreira do sol durante quatro dias, sem água nem comida, no terraço de uma casa. O grupo dos direitos dos animais PARTY AGAINST ANIMAL ABUSE (PACMA) diz que o conselho da cidade e a polícia local estavam cientes da situação e "foram incapazes" de fazer qualquer coisa para evitar o trágico resultado. A organização assegurou que em 17 de agosto, os vizinhos informaram a câmara municipal que um cachorro amarrado pelo pescoço havia sido "extremamente sufocado" e "exposto ao sol" numa casa situada no complexo de urbanização Torrevieja Nueva. Tanto os moradores quanto o conselheiro independente Nacho Torre-Marín informaram a polícia local e o Conselho de Bem-Estar Animal, chefiado por Concha Sala, sobre o que se estava a passar. Infelizmente, diante da inoperância das autoridades e instituições contactadas, os vizinhos anunciaram alguns dias depois a morte do animal (na foto abaixo ainda vivo).

Concha Sala confirmou que a polícia elaborou um relatório para o tribunal de Torrevieja, onde fez saber das suas deslocações ao local e de haver cumprido com o legalmente estabelecido, uma vez que não conseguiu contactar os proprietários do terraço onde o cão pereceu. Por sua vez, a vereadora adiantou que os representantes do seu departamento e da polícia local não conseguiram ter acesso à casa onde tudo ocorreu porque e nenhuma das pessoas que ali morava respondeu aos vizinhos, mas aperceberam-se que o animal estava "mal cuidado”. A polícia, por sua vez, também fez asneira e da grossa, porque ao se abeirar da casa anunciou que o animal já se encontrava “fora de perigo porque as horas de sol já haviam passado”, saindo dali sem se inteirar da saúde do pobre cão. Após a morte do animal, a Câmara Municipal ordenou a transferência do corpo do cão para uma clínica veterinária com quem tem contrato para levantamento de um relatório clínico, adiantando que "em nenhuma circunstância o corpo será queimado sem que sejam feitos os testes julgados necessários". O PACMA e o conselheiro Nacho Torre-Marín pedem agora que o caso seja tratado até ao fim, que Concha Sala seja demitida e a existência de um protocolo de resgate que “coloque a vida dos animais à frente dos procedimentos burocráticos necessários” agilizando assim o resgate para evitar que ocorram mais mortes como aquela.” Pergunta-se: por que razão a polícia não resgatou o animal? Temeria ser acusada de invasão domiciliar? Não confiamos na polícia em casos destes? Burradas de Alicante que por vezes ultrapassam fronteiras.

Em certas partes de Espanha a vida de um cão tem pouco ou nenhum valor, como se esse desrespeito tradicional fosse indispensável à preservação da cultura espanhola. É o futuro quem tem a última palavra a dizer sobre a continuidade ou não das idiossincrasias de um ou mais povos. Por causa disto e porque o mundo está em constante mudança, acredito que no futuro os animais venham a merecer maior respeito em terras de Espanha. Por ora, de Alicante, só quero lembrar-me dos idílicos passeios de burro para turistas, de manhãzinha ou ao final da tarde, muito embora lamente a sorte dos asnos, que se vêem obrigados a carregar volumosas senhoras do norte da Europa, a quem o exercício só lhes faria bem (o dia da redenção dos burros também chegará a Alicante, se calhar mais depressa do que o esperado).

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