No intuito de ficar em paz
com o seu passado, um ex-refugiado da RDA(1), Mário Goldstein, acompanhado pelo seu
Pastor Alemão Branco(2), decide percorrer a antiga fronteira
interna da Alemanha, que se estendia das praias do Mar Báltico, no Priwall, até
Vogtland(3),
no sudoeste, como parte da então conhecida por “Cortina de Ferro”, num total de
1.393 km.
O caminhante, que bem se
podia chamar de “peregrino do seu passado”, percorreu aquela distância em 100
dias, onde outrora havia 1.265 km de barreiras de chapa, 578 torres de vigia,
arame farpado, bunkers de terra, postos fronteiriços, pontos referenciados,
postos de queima e 1,3 milhões de minas terrestres. O lado leste da fronteira
interna alemã estava massivamente protegido e ceifou centenas de vítimas.
Apesar disso,
repetidamente, vários cidadãos da extinta RDA ousaram empreender uma fuga
arriscada, como foi o caso de Goldstein, da Vogtland, que falhou duas
tentativas e acabou resgatado da custódia da Stasi(4). Durante décadas ele evitou aquela faixa
fronteiriça, as memórias estavam ainda frescas e eram muito dolorosas. Só mais
tarde viria a fazer as pazes com o seu passado, quando decidiu percorrer a pé,
de mochila às costas e com o seu cão, a linha daquela hedionda fronteira, que
não envergonhou só a Alemanha, a Europa ou os Estados Unidos, mas todo o mundo
livre.
Depois de terminada a
viagem ao seu passado, Goldstein publicou um impressionante livro ilustrado
chamado “ABENTEUER
GRÜNES BAND”, onde mostra os seus encontros ao longo
da faixa fronteiriça, que entretanto se transformou num enorme cinturão verde
(daí o título dado ao livro).
Sunny, o seu Pastor Alemão
Branco, que o acompanhou na jornada de 100 dias, também foi ataviado de
mochila, carregando o indispensável em alguns percursos, junto ao muro ainda
visível que chegou a ser patrulhado, dia e noite, por 44.000 soldados armados.
Goldstein caminhou por todas aquelas lajes de betão perfurado de duas fileiras,
acampando num antigo posto de controlo, que era varrido diariamente uma vez para possibilitar a detecção de marcas
reveladoras e tentativas de fuga.
Hoje
predomina o verde naquela fatídica fronteira e Goldstein estabeleceu finalmente
a paz com o seu passado, acompanhado pelo seu cão branco, branco da cor da paz!
(1)Antiga República Democrática Alemã, território
ocupado e país satélite da União Soviética, internacionalmente designado pela
sigla DDR. (2) O
Pastor Alemão branco foi excluído da raça no tempo do “Nationalsozialismus”, é
um CPA igual aos outros e aguarda, há demasiado tempo, pela sua reintegração. É
também conhecido como Pastor Suíço e Pastor Canadiano. (3) Região
que abrange os estados federais alemães da Baviera , Saxônia, Turíngia e Boémia.
(4) A Stasi (forma curta de Ministerium für Staatssicherheit, "Ministério para a Segurança
do Estado") era a principal organização de polícia secreta e inteligência
da República Democrática Alemã.
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