Quando hoje se pergunta a
alguém se o seu cão se encontra treinado, é comum obter-se como resposta: “ Sim,
alguns truques fui eu que lhe ensinei e outros aprendeu numa escola” e “Sim,
ele faz «give me five», senta, deita,
rebola e com um auxílio de um biscoito consegue andar somente apoiado nas patas
de trás!”. Resumir-se-á o adestramento a uns tantos truques? Ao olhar para o
trabalho que alguns profissionais desenvolvem com os seus cães juraríamos que
sim mas sabemos que não!
Conseguirá algum método de
ensino subsistir tendo como base unicamente um conjunto de truques? Os ditos
truques conseguirão adestrar convenientemente um cão? Serão os seus resultados
perpétuos? Às três interrogações respondemos com um peremptório não,
considerando primeiro a salvaguarda dos cães e depois as alterações de carácter
necessárias à sua inserção harmoniosa no lar e na sociedade. Pelo contrário,
sabemos que os truques prestam-se de sobremaneira para enganar os binómios e
quem os aprecia, coisa que não é de hoje já que sempre se ouviu que “com papas
e bolos se enganam os tolos”.
Como não faltam por aí
cães com uma forte personalidade e mau carácter (há quem diga que homens também
não), ao adestramento digno desse nome cabe adequar o carácter dos animais para
que venham a ser companheiros melhor adaptados e mais úteis, pelo
aproveitamento da plasticidade presente nos seus ciclos infantis e pelo
concurso da experiência variada e rica, dotando-os assim de um comportamento
que por si mesmos não atingiriam, por vezes aparentemente contrário à sua
propensão genética, quando comparados com outros iguais e dispensados de idêntico
cuidado.
Ao contrário do que
acontece com a personalidade (individualidade) canina, que ao invés do carácter
não é boa nem má, mas sim forte ou fraca, o carácter da maioria dos cães carece
de ser melhorado e a sua capacidade de aprendizagem aumentada, visando a sua salvaguarda
e possível uso. Se entendermos o carácter como uma componente de grande
importância na personalidade de um cão como um todo, então podemos dizer que a
sua personalidade é também alterável em grande parte pelo enriquecimento do seu
carácter, alteração que não se pode alhear da dependência canina, da idade da
cópia que todos os cães atravessam, do seu quadro experimental, do
condicionamento havido e dos méritos de quem o educa.
Um cão quando devidamente
adestrado terá sempre duas filiações graças à sua natureza social: uma
biológica e outra pedagógica, podendo facilmente substituir os seus rituais
naturais por outros atempadamente absorvidos, compreendidos, experimentados e
necessariamente aprovados. Esta transformação que não acontece por artes
mágicas e que dificilmente será efectuada por um “encantador”, resulta do
conhecimento dos animais, da individualidade de cada um, da comunhão de vida e do
tempo dispensado ao seu estudo e apetrechamento.
Não é nenhum crime ensinar um cão a
andar de trotineta, mas melhor será ensiná-lo a atravessar uma estrada. Varremos os
animais selvagens do circo, quando expulsaremos os cães de lá? Basta de enganar os cães!
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