Tenho reparado aqui e
noutras partes do mundo por onde tenho andado, quando observo os reprodutores
usados pela maioria dos canicultores, e aqui não há distinção entre os amadores
e os profissionais, que muitos deles possuem excelentes machos e fêmeas a rasar
o desprezível, descuido que a breve trecho condenará a sua linha de criação
pela lástima dos seus produtos. E quando digo “fêmeas a rasar o desprezível”,
digo-o dos pontos de vista físico, psicológico e cognitivo, que uma vez usadas como
matriarcas geram cachorros débeis (carentes de robustez e envergadura),
irritadiços ou medrosos, por demais dependentes, com baixa capacidade de
aprendizagem e incapazes de ultrapassar as adversidades que irão ter pela
frente.
Quer se trate da
morfologia, da psicologia ou da cognição dos cachorros, estes sempre ficarão a dever mais às
mães que aos pais, considerando o papel primordial das
primeiras no seu sustento, desenvolvimento, adaptação e ensino, o que torna a
selecção, compra e aquisição das fêmeas num assunto muito sério e merecedor de
toda a atenção, já que as primeiras interacções entre os cachorros e as mães
parecem ser de efeito duradouro. Assim fizemos e temos aconselhado outros a
fazê-lo, porque não nos envergonhamos de fazer o bem e quem nos dá ouvidos
nunca se deu mal.
A corroborar o que acabámos
de dizer, surgiu recentemente um estudo oriundo da Universidade do Arizona/US e
publicado na revista “Proceedings of the National Academy of Sciences”, que se
debruçou sobre o papel das mães no sucesso e insucesso dos cães destinados a
guiar invisuais (cães-guia). A principal autora deste estudo, Emily Bray,
pesquisadora pós-doutorada do “Arizona Canine Cognition Center” da Universidade
de Antropologia do Arizona, adiantou que as cinco semanas que os cachorros passam
com as suas mães influem directamente sobre o seu sucesso dois anos mais tarde,
que nesse período inicial das suas vidas necessitam de lidar com pequenos
desafios e que se não o fizerem virão a penar mais tarde.
O estudo aconteceu nas
instalações da associação “The Seeing Eye” que se dedica à formação de
cães-guia e abrangeu 23 cadelas e os seus 98 cachorros durante as primeiras
cinco semanas da sua vida. A análise dos dados obtidos revelou que havia diversidade
de comportamentos nas mães, sendo umas mais atenciosas que outras. Ao observar-se
dois anos mais tarde esses cães, verificou-se que os cachorros que tiveram mães
mais atenciosas (mães-galinha) foram os menos propensos a formar-se como
cães-guia, particularmente os que tiveram uma mãe que os amamentava
invariavelmente deitada, ao invés de o fazer de pé ou sentada.
Robert Seyfarth, co-autor
deste mesmo estudo e professor de psicologia na Universidade da Pensilvânia, acerta
do pormenor acima citado (o das mães que invariavelmente amamentam deitadas)
adiantou: “Se uma mãe está deitada sobre o seu estômago, os cachorros têm
acesso gratuito ao leite, mas se ela estiver de pé terão que trabalhar para
obtê-lo”, o que realça a importância das matriarcas na criação de pequenos desafios
ao alcance dos cachorros, para que mais tarde possam desenvencilhar-se e ter
sucesso na vida, aumentando assim as suas chances de sobrevivência pelo
desenvolvimento cognitivo.
Este assunto só agora está
a ser abordado e ainda há muito por descobrir e comprovar. Todavia, não se pode
confundir uma cadela com uma coelha e uma boa cadela é aquela que começa a
ensinar a sua prole bem cedo, dotando-a da curiosidade que melhor a servirá
para a vida e conduzirá ao sucesso. Já havíamos abordado este assunto, ainda
que noutra perspectiva no texto “A
PARAQUEDISTA E A LOBEIRA”, editado em 13/12/2012.
Tendo em visto a utilidade
da generalidade dos cães e não a dos cães-guia em particular, apraz-nos dizer:
cadelas carentes de envergadura, disfuncionais, desaprumadas e medrosas, com
fracos impulsos ao alimento, movimento, à defesa e à luta, ao poder e ao
conhecimento - não, obrigado!