terça-feira, 4 de abril de 2017

QUE SE LIXE A THUNDER LEASH E TODOS OS CABRESTOS PARA CÃES

Depois de décadas a ensinar cães, é com tristeza que assistimos à parafernália de acessórios que eles carregam hoje para poderem ser conduzidos de modo satisfatório (sem rebocarem os donos), como se fossem cavalos indomáveis ou furões à boca de uma toca. E por falar em cavalos, que é outra área que nos grata, todos eles necessitam que lhe “façam a boca” para que não saiam desarvorados, não recebam “queixais”, se concentrem no trabalho, coloquem o pescoço de forma correcta e obedeçam prontamente e à mais leve ajuda, ao que lhes é solicitado, saber que muitos cavaleiros actuais trocam por rédeas fixas, gamarras e gamarilhas, tanto em treino como em concurso, mesmo em “pencos” (pangarés no Brasil) que mal se mexem ou que dificilmente podem com os ossos. Tanto na equitação como no adestramento canino, porque cavaleiros e adestradores são condutores, ainda que os animais sejam diferentes, há que encontrar para ambos a sensibilidade de mão própria para os conduzir sem atropelos e resistência. Se nos cavalos tal desarmonia fica-se a dever-se a um mau trabalho no desbaste, nos cães tal se deve ao desaproveitamento dos seus ciclos infantis e ao encurtamento ou supressão das suas saídas ao exterior, restrição que poderá ter (e normalmente tem) como consequência difíceis sociabilizações.
Reportando-nos especificamente aos cães, a verdade é que todo o “bicho-careta” tem agora um cão, todos se dizem entendidos na matéria e muitíssimo poucos tem alguma formação para isso, desconhecendo obrigações e regras que passam pela disponibilidade, acuidade técnica, sensibilidade, estudo, tempo e paciência (algum sacrifício também), omissão que os leva a exacerbar o particular psicológico dos animais para justificarem o seu incómodo, pouco empenho e menos valias mas que não justifica a seu falta de amor, sentimento que tudo pode, suporta, altera e vence. Hoje o acessório canino mais visto nas ruas é o peitoral e os cães que mais se vêem são os castrados de raça indefinida, animais por norma pacíficos e temerosos, muitos deles amistosos que dispensam de imediato que lhe tirem as mão do chão para serem manobrados. É curioso reparar que 99,9% dos donos que têm cães medrosos atribuem o facto a maus tratos passados e nunca à castração (no passado também se arrancavam dentes por tudo e por nada, prática que actualmente se considera um disparate). Compreende-se o recurso ao peitoral pelos donos a quem falta frescura física e técnica mas a quem sobra sensibilidade, também aos obrigados a conduzir cães com tendência para problemas cárdio-respiratórios.
Agora fazer escola e recomendar como acessórios de ensino a “thunder Leash” e/ou o “head collar” é sobrecarregar os cães e aliviar os donos, tratar os animais como se fossem de tiro (há burros menos ataviados) e manter os donos na ignorância. Haverá nisto alguma réstia de reforço positivo? Uma escola assim não precisa de mestres mas de bons vendedores de acessórios, porque todos sabemos que o “junto” e o “aqui” são as duas pedras basilares da obediência, que o “junto” correcto depende quase em exclusivo do trabalho da mão de condução e que ela carece do acerto que só o tempo e o treino lhe poderão dar, tornando-a simultaneamente activa, cúmplice e sensível. E quando assim é, porque propicia e possibilita a condução dos cães em liberdade, até com uma simples linha de coser botões se consegue levar um cão à rua! Não necessitamos de muito matutar ou de algum “déjà vu” para compreendermos que a head collar é a versão optimizada do ancestral cabresto destinado às ovelhas, animais que nasceram para pastar e que só seguem o dono na hora de saírem ou de regressarem ao bardo. Será que alguém reclamou para si a invenção da head collar? Se houve, descaramento não lhe faltou!
Pelos mesmos motivos e por causa dos danos que causa aos cães (alguns irreparáveis do ponto de vista psicológico), não compreendemos, abominados e somos contra o uso da coleira de choques eléctricos, a quem tanto o bastão de choque para carregar gado como o “taser” não são alheios, prestando-se os três ao mesmo propósito (não será um cão diferente de um boi?). Igualmente desprezamos enforcadores e estranguladores de bicos, os primeiros porque provocam anoxia cerebral e os segundos porque são dolorosos, tornam-se inactivos (os cães com o tempo acostumam-se à dor e tornam-se mais agressivos) e porque intentam substituir a cumplicidade pela coerção. Que nos perdoem todas as forças policiais do mundo, mas se um cão tem que sair para o serviço com um estrangulador de bicos posto, somos obrigados a duvidar do profissionalismo e dedicação de quem o conduz! Perto de cães assim não nos sentimos seguros, porque tal acessório denuncia desde logo a precariedade técnica dos seus tratadores ou condutores e todos podemos estar em risco, porque os acidentes acontecem e a distracção não poupa ninguém.
Continuar-se-á a vender toda a sorte de acessórios para os cães enquanto os donos persistirem em não aprender, por falta da curiosidade que os impede de compreender!  

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