sexta-feira, 31 de maio de 2019

O CASO DO DOBERMAN DE HAIMHAUSEN /DACHAU

Os fugitivos à verdade e adeptos do susto e do terror, que gostam de dizer que o Doberman com o passar da idade vê o seu cérebro estrangulado pela estrutura do crânio e que por causa disso acaba por atacar os seus donos, têm neste incidente matéria mais do que suficiente para engrossar as suas fábulas. No Município de Haimhausen, Distrito de Dachau, na Baviera/Alemanha, na tarde de Domingo passado, um Doberman chamado Ajax, com 10 anos de idade, atacou um casal de sexagenários a quem pertencia, deixando homem e mulher em muito mau estado. Valeu-lhes na ocasião um vizinho, Herbert Ziller, que apesar dos seus 81 anos de idade, conseguiu cessar os ataques daquele cão com o tubo de um aspirador, dando-lhe uma valente mocada na cabeça. Apesar do pedido de ajuda do avô, proprietário e também vítima daquele cão, o seu neto de 29 anos negou-se a prestar auxílio, adiantando que não ia lá porque o cão podia matá-los, apesar da sua avó estar a ser violentamente mordida e encontrar-se em risco de vida (um verdadeiro valente!). O Doberman, que viria a ser abatido e que foi considerado por um expert como uma “bomba-relógio”, vivia com os donos desde sempre e também com a sua mãe, que veio a falecer no passado mês de Janeiro com 12 anos de idade.
Chamado a pronunciar-se sobre o ocorrido pelo jornal bávaro “Merkur”, Walter Kreipl (na foto abaixo), experimentado treinador de cães que em 1998 foi reconhecido pelo Governo da Alta Baviera como especialista em comportamento canino, agressividade e perigo para os seres humanos e outros animais, começou por dizer que os Dobermans não se encontram na lista dos cães perigosos porque recentemente têm criados mais “humanos”. Quando inquirido a pronunciar-se sobre o incidente, disse que como não conhecia o cão, só poderia adiantar um diagnóstico remoto, não se escusando a dizer que os Dobermans são personagens difíceis, simultaneamente muito ágeis e rapidamente sobrecarregados de nervos, razões que levam muitos a tratá-los como “puros-sangues entre os cães”. Para este especialista o ataque resultou da ausência de submissão do cão em relação à família, o que o levou a considerar-se o chefe do bando, “ele não queria atacar a sua dona que estava a trabalhar no jardim, mas corrigi-la. Quando o marido veio em auxílio da senhora, o cão viu isso como um desrespeito ainda maior e a situação complicou-se”.
Para Kreipl o sucedido não aconteceu porque o cão era racialmente agressivo, mas por não se encontrar correctamente educado, não demonstrando respeito pelos donos e comportando-se totalmente desenfreado, mostrando assim nunca se ter integrado naquele lar. Quando o jornalista lhe perguntou como seria possível um cão viver 10 anos com uma família e não se integrar nela, o expert adiantou que isso geralmente acontece quando numa casa vivem dois cães juntos e o mais velho morre subitamente. Neste caso a falecida cadela era o animal principal e reconhecia os seus donos como mestres. O seu filho não passou pela mesma educação, orientando-se apenas pelo comportamento da mãe. Quando ela morreu, o cão ficou desnorteado, mostrou-se inseguro, ladrava em demasia e encontrava-se stressado. E foi justamente nesta circunstância de estímulo extremo que reagiu contra quem invadiu o seu território – o jardim. Esta é a razão por detrás do ataque. Quando o jornalista lhe perguntou se foram os donos os culpados da desgraça, Kreipl disse: “Basicamente sim. Os proprietários são certamente pessoas amantes de animais e de boa índole que deram tudo para os seus cães. Só não fizeram uma coisa: integrar o cão mais novo”.
Kreipl concordou com a eliminação do cão, uma vez que no seu entender a reeducação do Doberman seria muito difícil e só possível por um especialista viável, o que não evitaria que o cão permanecesse como uma bomba-relógio. Na perspectiva deste senhor cinco coisas contribuíram para o ataque do cão, vamos descrevê-las pela ordem da sua importância: 1ª Ausência de educação do Doberman; 2ª _ Desprezo pela liderança humana; 3ª _ Alteração do viver social do cão pelo desaparecimento da mãe; 4ª - Apego à territorialidade pela perca do líder e 5ª _ Problemas psicológicos oriundos da formação da raça ainda por resolver, como a carga nervosa e o stresse. A nosso ver, Walter Kreipl fez um excelente diagnóstico e soube salvaguardar-se de algumas inexactidões por não ter privado com o cão.
Este caso, acontecido no Domingo em Haimhausen, levanta velhas questões e contradiz certos mitos agora muito em voga, porque relança a necessidade de subordinação de todos os cães (educação e treino); demonstra que a agressividade canina nem sempre surge como resposta à violência ou à instigação dos cães; evidencia o problema de se ter dentro de casa uma matilha animal onde a liderança humana é omissa; destaca a importância do sentimento territorial canino, manifesto na defesa do território, que é suficiente para alterar o comportamento dos cães e levá-los à insubordinação; desnuda que ainda há muito a fazer para eliminar defeitos perpetuados em algumas raças, por força do desequilíbrio dos impulsos herdados de que foram alvo, que mais considerou os impulsos ao poder e à luta em detrimento do inescusável ao conhecimento que viabiliza a parceria homem-cão. Por outro lado, ficou claro que os cães não podem ser tratados de igual para igual, porque socialmente sobrevivem pela hierarquia que sustenta as matilhas, o seu funcionamento e boa ordem. Um cão em pé de igualdade com o dono e liberto de toda e qualquer obrigação, é um indivíduo que virá a impor regras por não lhe terem sido impostas nenhumas, um verdadeiro disparate que pode revelar-se altamente perigoso.  

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