quarta-feira, 16 de novembro de 2016

A SOCIABILIZAÇÃO COM OS HUMANOS

NOTA INTRODUTÓRIA: Sempre será mais fácil sociabilizar um cão valente que um cobarde (há quem diga que nos homens também).
A sociabilização de um cão com outros cães e demais animais domésticos, quando operada desde tenra idade, acontece naturalmente e sem maiores atropelos, contrariamente à requerida com os humanos que nem sempre é fácil, por exigir estratégias próprias, tempo e paciência, particularmente quando os cachorros são pouco seguros, demonstram alguns medos e os seus donos não sabem como valer-lhes, caso que iremos tratar a seguir.
Convém esclarecer primeiro o que é a sociabilização canina, porque há por aí muito boa gente que ignora o que seja, entendendo-a indevidamente como sinónimo de interacção com tudo e todos, tarefa só ao alcance dos cães de terapia que são arduamente treinados para isso, já que os restantes, devido ao seu particular social, resistem à satisfação dos desejos alheios (um cão não é um burro que se albarda para qualquer um montar ou uma máquina que a troco duma moeda a todos satisfaz). A sociabilização canina é um processo educacional a empreender desde tenra idade que visa a adaptação e integração harmoniosa dos cães na sociedade, para que nela vivam pelo respeito aos seus valores e possam usufruir dos meios e privilégios colocados ao seu dispor, que sendo colectivos, obrigam ao respeito pela salvaguarda de pessoas, animais e bens.
Quando deveremos iniciar o processo de sociabilização de um cão com pessoas alheias à sua família de adopção e em ecossistemas distintos do seu lar? A idade ideal para esta necessidade e capacitação aponta para os 4 meses dos cachorros, altura em que já se encontram vacinados e estão mais despertos para o mundo à sua volta, tendem a ser excursionistas, carecem de liderança, começam a compreender a hierarquia e procuram o seu lugar social, muito embora a sua primeira experiência de sociabilização com humanos já tenha ocorrido antes, primeiro com a pessoa do seu criador (imprinting) e depois com os seus proprietários (experiência directa). Por outro lado, torna-se evidente que a selecção dos seus progenitores (carga genética) facilitará ou dificultará o seu processo de sociabilização.
Como deveremos operar essa sociabilização? Gradualmente, segundo as respostas positivas que os cães nos vão dando, o que pode obrigar a trabalho aturado. Para que a sociabilização de um cão não se torne desgastante e traumática para o animal, importa que ela evolua da observação para a reunião com as pessoas, porque doutro modo poderá ser surpreendido e querer fugir delas, por não se encontrar familiarizado com as suas rotinas e ignorar as suas intenções. Como os cães são animais de afectos, vivem pela experiência que vão tendo e partem naturalmente do conhecido para o desconhecido obrigados pela sobrevivência, a sociabilização não dispensa a prévia familiarização, que deverá acontecer das pessoas que conhece para aquelas que virá a conhecer, das que lhe são familiares para as desconhecidas, primeiro com pessoas isoladas, depois com pequenos grupos e finalmente entre multidões.
Onde deveremos operar a sociabilização? Em todos os locais onde o cão possa ir pelo seu próprio pé ou transportado e houver pessoas nas suas múltiplas actividades. Como sociabilizar cães com humanos implica em viver no seu mundo, torna-se necessário que o animal se habitue às suas distintas tarefas e actividades, máquinas usadas, diferentes meios de transporte e díspares manifestações colectivas, pelo que deve acostumar-se a todo o tipo de veículos, áreas muito frequentadas (mercados, estações e aeroportos), ao buliço das crianças e tornar-se indiferente aos seus brinquedos, assim como aos seus espontâneos e desconsertados estados de ânimo.
Sobre que pessoas deverá a sociabilização mais incidir? Para além das crianças, sobre pessoas com dificuldades de locomoção, deficientes físicos, invisuais, minorias raciais, polícias, indigentes, pedintes, andrajosos, artistas de rua, atletas, motociclistas, ciclistas e carteiros, sobre todos aqueles que pela sua apresentação ou comportamento se destacam dos demais e que poderão ser objecto da sua desconfiança ou constituir-se num desafio.
Os cães de guarda poderão ser sociabilizados sem prejuízo para o seu serviço? Poderão e deverão ser sociabilizados para minimizar ao máximo a sua margem de erro, desde que a sociabilização efectuada não os induza à troca de alvos ou à apatia generalizada, menos valias advindas do excessivo comunitarismo. A sociabilização canina, pela observação e familiarização que oferece, dota os cães guardiões de mais informação acerca das pessoas e do seu comportamento, auxiliando-os a identificar com mais acerto as intenções de cada um. Todas as armas fiáveis têm segurança, o cão ao ser uma arma também não a poderá dispensar.
A que se deverão as dificuldades na sociabilização canina com os humanos? As dificuldades experimentadas por alguns cães nesta sociabilização reportam-se a si mesmos, à pessoa dos seus donos e também à soma da impropriedade de ambos. Cães medrosos que nunca saem à rua, os muito-dominantes por carga genética, os tornados agressivos pela privação sistemática do contacto com outrem e os carentes de apoio ou liderança, também os entregues a gente que detesta abandonar a sua área de conforto, são os que mais resistem à sociabilização pretendida. Em síntese, os cobardes, os valentes, os desprovidos de interacção, os privados da liderança, os votados ao isolamento e os rufias sem controlo. Todos os cães precisam de sair à rua, não só por causa da sua exigida sociabilização, mas também para o seu bem-estar, saúde e longevidade.
Quando deveremos dar por concluído o processo de sociabilização? Qualquer ensino é um acto continuado e os cães carecem de recapitular as suas respostas artificiais. No entanto, um cão encontra-se verdadeiramente sociabilizado com os humanos, quando na ausência do dono e por tempo indeterminado, permanece no seu meio sem lhes causar qualquer tipo de dolo, infortúnio e incómodo, desinteressando-se em simultâneo dos díspares comportamentos à sua volta. Se sabemos que o desempenho dos cães melhora com o tempo e o treino, bem depressa nos apercebemos que a sociabilização sempre carece de recapitulação e aprimoramento.

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