Quem se dedica ao ensino de cães não pode dispensar
o amor pelos animais, residindo nele o segredo do sucesso educacional. Que
alguns homens amam os cães, ninguém tem dúvida nenhuma, mas será que eles nos
amam de igual modo e com a mesma intensidade ou isso resultará do tanto que
lhes queremos, uma correspondência só explicada pelo antropomorfismo? Atribuir
sentimentos aos cães é uma tendência relativamente nova, intrinsecamente ligada
aos avanços da ciência e à sua comprovação, mercê da investigação agora levada
a cabo.
Os proprietários caninos sempre realçaram e
divulgaram o carácter sentimental dos seus animais, sobejando estórias, relatos
e filmes sobre o amor dos cães pelos donos, sentimento difícil de catalogar
diante das diferentes apresentações que há muito reconhecemos, apesar do seu
viver social se coadunar com o nosso sem maiores atropelos e tudo fazerem para
nos agradarem, ao ponto de nos protegerem, de reclamarem pela nossa presença e
de sofrerem com a nossa ausência. Caso se prove, como tem vindo a acontecer,
que os cães têm sentimentos (no que não deverão ser únicos), então estaremos a
lidar com seres mais próximos e melhor capacitados, o que não duvidamos,
capazes do melhor e do pior segundo as suas inclinações individuais, algo para
além de meros actos reflexos como até aqui se pensava, o que obrigará à
alteração de procedimentos diante da necessidade de melhor preparo pedagógico.
Será esse amor desinteressado ou interesseiro? Somos capazes de jurar que já
“vimos” ambos os casos.
Certo,
é que os japoneses garantem que a nível químico existe um correspondência
amorosa entre donos e cães, conclusões a que chegaram pelos níveis de ocitocina
presentes na urina das duas espécies, depois de conviverem num período de 30
minutos e de se olharem olhos nos olhos. A ocitocina é
um hormônio produzido pelo hipotálamo e armazenado na neuro-hipófise posterior
(neurohipófise), liberto pela glândula pituitária, também conhecido por
“oxitocina”, produzido pelo nosso cérebro, tratado como “hormônio do amor”, comummente
associado ao desenvolvimento da confiança e ao estabelecimento de laços sociais,
vulgarmente usado na sua forma sintética (artificial) para promover as contracções
musculares uterinas e reduzir o sangramento durante o parto, estimular a libertação
do leite materno e desenvolver afeição e a empatia entre pessoas, sendo ainda
usado noutras terapias e práticas (profícuas ou nocivas), apesar de induzir ao
medo pelo desconhecido.
Os investigadores
japoneses Kikusui e Nagasawa, da Escola de Medicina Veterinária da
Universidade de Azabu, do Japão, ao permitirem que vários proprietários caninos
interagissem com os seus cães descobriram que, quando os cães olham nos olhos
dos seus donos, os níveis de ocitocina aumentam em ambos, não ocorrendo o mesmo
feedback entre os lobos e os seus tratadores, que os cães que receberam uma
injecção daquele hormônio fixavam-se nos olhos dos seus proprietários por mais
tempo, aumentando-lhes os níveis de ocitocina, resultados que sugerem uma
ligação especial entre cães e pessoas, um vínculo que pode ter evoluído pela
selecção operada pelo Homem, que lhe oferece o retorno da mesma emoção por
parte destes animais, explicando a ocitocina em parte como isso acontece.
Aguardam-se novos desenvolvimentos e aproveitemos as actuais conclusões, sem
dúvida se suma importância para os proprietários caninos.
Os benefícios e mau uso da
ocitocina não nos são estranhos, tanto que já falámos dela em edições
anteriores, mas diante das actuais conclusões destes investigadores nipónicos
podemos ir mais longe. Sempre usámos e recomendámos o seu uso nas cadelas
parturientes, especialmente nas primeiras barrigas e diante de matriarcas mais
activas, nervosas ou com forte ligação aos seus donos, para lhes facilitar o
parto, suscitar-lhes a libertação do leite atempadamente e na quantidade
desejável e para lhes desenvolver o instinto maternal (sempre fomos bem
sucedidos). Usando-a ainda nas cadelas, quando necessário, entre a 2ª e a 3ª
semana de vida dos cachorros, quando as “más de leite” tendem a ficar sem ele e
os cachorros ainda não conseguem comer. Mas se esse cuidado não resultar, ao
invés de drogarmos e estoirarmos as cadelas, teremos que deitar mão ao leite
artificial próprio para o efeito.
Como se já não bastassem
os malandrecos que por cá temos, de reconhecido engenho, ainda nos sobram
alguns vindos do Leste Europeu, do Atlântico Sul e do Sudoeste Asiático, uma
minoria no seu grosso, que vive a expensas da segurança social, abomina o
trabalho e que tem como affaire dar caça àquilo que não lhe pertence. Alguns
destes indivíduos têm cursos universitários ou ampla experiência na cinotecnia,
sendo especialistas em eliminar ou ludibriar cães de guarda para o alcance de
proventos. Não duvidamos e já tivemos conhecimento de casos em que se valeram
da ocitocina para o sucesso nas suas acções, já que este hormônio se encontra à
venda nas farmácias sob a apresentação de spray, apesar da sua venda depender
de prescrição médica, geralmente torneada pela indicação de se destinar a um
animal, o que não dispensa os cães de guarda da sua defesa, condicionando-os a
um policiamento e aviso fora do seu raio de acção.
Por outro lado, e já
tratámos do assunto, ainda que levemente no artigo “APRESENTA-ME O TEU CÃO E CONHECER-TE-EI MELHOR”,
publicado na última edição, à luz das conclusões da presente investigação e
considerando tanto a salvaguarda como o policiamento a efectuar pelos cães
guarda, não devemos permitir aos estranhos que fixem o seu olhar ou olhem
demoradamente sobre os guardiões, para se evitar que estabeleçam com eles
comprometedores vínculos afectivos, capazes de neutralizar as suas acções e/ou
de possibilitar o seu furto, já que a inocência dos donos tende a vitimar os
cães ou a entregá-los a quem não devem (estamos a falar especificamente sobre
cães de guarda).
A presente investigação
japonesa veio reforçar a importância dos cães de terapia, nomeadamente junto de
indivíduos com dificuldades na linguagem, distantes da realidade, a braços com
a auto agressividade, insensibilidade à dor, dados ao isolamento e ausência da
sensação de perigo, assim como para os afectados pelo stress pós-traumático, porque
o contacto com eles animais transmiti-lhes, via ocitocina, a paz, a serenidade
e o bem-estar que não encontram em si mesmos, ajudando-os no equilíbrio e
futura reinserção social, sendo a sua prestação válida tanto para crianças como
para adultos.
Acresce para a cinotecnia
outra lição: quanto mesmo perto estiver um cão do lobo, menos vínculos
afectivos estabelecerá com os seus donos, pormenor agora comprovado
cientificamente, que já havíamos constatado e que nos levou ao desinteresse por
essas raças híbridas. Estamos em crer, falta-nos o saber e o parecer
clínico-científico, que o recurso à ocitocina sintética poderá resolver
problemas de desequilíbrios afectivo-emocionais nos cães, melhorando o
relacionamento impróprio ou deficitário entre eles e os seus donos, ajudando-os
na desejável fixação exclusiva nas suas pessoas. Quanto ao amor presente nos
cães ainda há muito para saber, assim como doutras emoções e sentimentos de que
possam ser portadores, pelo que aguardamos novos desenvolvimentos e comprovação.
Independentemente disso, pelo menos quimicamente, podemos estar certos: eles
amam-nos!