terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

OS FALSOS PASTORES ALEMÃES

Longe vai o tempo onde em cada esquina se tropeçava num híbrido de Pastor Alemão com Serra da Estrela, fenómeno resultante de ambas as raças concorrem para o mesmo fim, a quem entregavam a guarda de explorações pecuárias, estâncias e unidades fabris, resultando a mistura mais da proximidade e da experiência do que pela qualidade do seu produto, já que gerava indivíduos maldosos, que juntavam à inteligência do cão alemão o carácter subversivo do cão serrano nacional. Hoje assiste-se a uma nova hibridação, também ela a partir do Pastor Alemão, que acontece quase no segredo dos anjos, por veneração e respeito à qualidade laboral do Rottweiler e porque a raça se encontra indexada à lista dos cães perigosos. A hibridação Pastor Alemão X Rottweiler é uma prática mais próxima dos indivíduos que se dedicam à segurança com cães, que não querendo perder o potencial operacional do molosso alemão, não lhes sobrando outro remédio, o disfarçam com uma aparência de Pastor Alemão, o que muito ajuda na entrega das ninhadas e na libertação de maiores encargos, já que as características exteriores do Cão de Stephanitz predominam sobre os outros cães. A acentuada baixa de preços nos cães e em particular nos Pastores Alemães tem garantido a proliferação da novidade.
Os híbridos provenientes deste cruzamento são praticamente iguais aos Pastores Alemães genuínos, diferindo mais deles quando adultos, já que em cachorros as diferenças são pouco notórias, muito embora manifestem desde cedo uma harmonia craniofacial diferente. Quando o Rottweiler é cruzado com um Pastor Alemão de linha estética homozigótica (sem a contribuição de exemplares de trabalho), os cachorros nascerão angulados e com a cauda a rasar o chão, ainda que melhores de peito, aprumos, ossatura e garupa, para além de logo evidenciarem uma maior envergadura, ratificada pelo peso e pela presença de costelas mais arredondadas. Alguns deles chegarão a levantar as orelhas, ficando isso a dever-se à excelente implantação de orelhas do Pastor Alemão usado no cruzamento e ao pouco peso das orelhas do Rottweiler que com ele cruzou. Os cachorros descendentes de mãe Pastor Alemão e pai Rottweiler serão os que mais características lupinas exteriores evidenciarão.
Se do ponto de vista morfológico a mestiçagem tende a omitir a presença do Rottweiler, do ponto de vista psicológico não há como escondê-lo, porque os cachorros apresentam-se mais sóbrios e menos sujeitos a provocações, como cientes da sua força ou condicionados por ela, denotando maior capacidade atlética do que a visível no molosso e herdando dele o mesmo apego e vontade de servir, aceitando prontamente a liderança como modo de vida. Por outro lado, por influência directa do Pastor Alemão, estes híbridos terão uma maior propensão para marcha, chegando alguns a adoptá-la como andamento preferencial. Com a chegada das diferentes maturidades assiste-se à substituição das “vozes”, porque nas situações em que o Pastor avisava (ladrava), o híbrido passa a rosnar. Também são visíveis diferenças na curva de crescimento dos híbridos, quando comparada com a do Pastor, porque crescem por mais tempo, ainda que atinjam a maturidade emocional sensivelmente na mesma altura e antes da verificada no Rottweiler. Com o passar do tempo, o pseudo-Pastor transformar-se-á num Rottweiler disfarçado de lupino, o que servirá em absoluto os propósitos iniciais dos seus mentores.
Pelas razões atrás indicadas, se fosse esse o caso, mais depressa se chegaria com dois híbridos destes ao Rottweiler do que ao Pastor Alemão. A entrada escondida, abusiva e isolada de um híbrido com estas características dentro de uma linha de criação de Pastores Alemães, bem depressa o omitiria devido a dominância da raça lupina, muito embora as características psicológicas do molosso perdurassem por mais algum tempo. Apesar de abominarmos a mestiçagem e de sermos avessos à hibridação canina, que só a aceitaríamos por razões ligadas à saúde e ao bem-estar das presentes raças caninas, somos obrigados a reconhecer as mais-valias laborais destes híbridos actuais, que ficam a dever mais ao Rottweiler do que ao tipo de Pastor que lhes serviu de “embrulho”. Para que o Pastor Alemão não se estagne, como se tem vindo a verificar, torna-se imprescindível aproveitar a multivariedade ainda presente na raça, que dispensa em absoluto qualquer tipo de mestiçagem ou o mais excelente dos híbridos ou mestiços.

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