Quem já conviveu de perto com eslavos e teuto-russos, reconhece-lhes
características bem diversas das nossas, porque juntam à ingenuidade raro
empenho e engenho, não são de “meias tintas” e tanto nos podem surpreender pela
positiva como pela negativa, pelo torto é difícil vencê-los e se é para arrear,
arreiam mesmo, passando sem dificuldade da candura à efervescência, revelando
por vezes instintos que há muito subtraímos, o que os torna respeitáveis como
opositores. E se a sua natureza é essa, vão exigir dos seus cães idêntica
prestação. Contrariamente ao que fazem as companhias cinotécnicas militares
ocidentais, que desnudam tudo o que fazem pela internet, revelando métodos,
exercícios e objectivos, das companhias cinotécnicas russas pouco sabemos e o
que nos chega é pouco esclarecedor, remetendo-se a umas escassas fotos de
exercícios há muito conhecidos.
Esta falta de informação não deverá levar-nos a considerar os
adestradores de Leste como básicos, pacóvios ou ultrapassados, porque sabemos
que partiram adiantados na cinotecnia, que são pragmáticos e ligados à
investigação científica, que trabalham ordinariamente para além dos limites e
sempre alcançam alguma novidade. Numa das raras fotos que nos chegou e que
publicamos abaixo, vemos um cão a fazer um pódio de difícil execução, tirado a
partir da mecanicidade das acções, com degraus quadrados de 20cm de lado e
distantes entre si de 35cm (aproximadamente). O exercício obriga a um grande
controlo por parte do tratador e a rara concentração do cão que, para aumentar
o grau de dificuldade, ainda o executa com os olhos vendados, lembrando um dos
feitos do “Dox” (Dox von Coburger Land), um Pastor Alemão da Polícia Italiana,
várias vezes considerado o melhor cão polícia do mundo e outrora conduzido por
Giovanni Maimone.
Se não podemos negar o carácter empreendedor e científico dessa gente,
de igual modo somos obrigados a considerar o seu afinco ao trabalho. Na foto
seguinte vemos um trio de soldados, constituídos em rampa para o transporte do
cão, que é conduzido por uma tratadora, que intencionalmente se coloca para
trás da progressão do animal, para que ele não salte e se apoie nos três
militares. Pelas cores da bandeira presentes no braço da tratadora, julgamos
tratar-se dum exercício do Exército Bielorusso. Se do ponto de vista atlético o
exercício é elementar, o mesmo não se pode dizer da obediência que exige, tanto
aos homens como aos cães, considerando que estão a trabalhar debaixo de
temperaturas negativas, evidenciadas pela neve que cai e pela que se encontra
alojada no solo, obrigando os soldados ao uso justificado de luvas.
A riqueza da cinotecnia militar soviética que serve a Rússia de hoje e
os seus países satélites, para além dos exageros cometidos por ocasião da
Segunda Guerra Mundial, estamos a recordar-nos dos malogrados cães antitanque,
muito embora tenham contribuído para vitória e poupado muitas vidas humanas
(outros fizeram o mesmo), sempre foi reconhecida e conhecida como uma escola
onde o condicionamento canino sempre atingiu nota máxima, mercê da
extraordinária obediência patenteada pelos seus cães e pela rara cumplicidade
com os seus tratadores. É pena que não haja mais intercâmbio entre a cinotecnia
de Leste e a Ocidental, porque a nosso ver, todos sairíamos a ganhar,
especialmente agora que os excelentes treinadores militares e policiais do
passado recente caíram no esquecimento. Alguém se lembra ou sabe quem foi o
então Capitão Costa Campos, que criou e dirigiu o Centro de Instrução de Cães
de Guerra em Boane, a 45km de Lourenço Marques, quando Moçambique era ainda uma
colónia portuguesa, contando com mais de meio milhar de cães no seu efectivo e
onde foram treinados cerca de 1000 deles para o Estado, para entidades privadas
e particulares, assim como para os Fuzileiros e para a Força Aérea?
Por razões político-ideológicas, a herança da cinotecnia soviética estendeu-se
às nações do Leste e Sudeste Asiático, nomeadamente àquelas que tiveram ou
ainda conservam regimes comunistas, onde se destaca a designada República Popular
da Coreia (vulgo Coreia do Norte), hoje governada por um déspota de frágil
saúde mental, onde o treino canino é levado ao extremo e onde os direitos de
homens e animais são constantemente ignorados e aviltados. Dessa Coreia
entregue ao diabo, também sabemos pouquíssimo, quiçá porque não lhe sobrar
tempo para além do culto obrigatório ao seu “líder”, fortemente empenhado no
seu isolamento. Não obstante, conseguimos deitar mão a uma foto duma Companhia
Cinotécnica Militar Norte-Coreana, numa progressão debaixo de fogo, onde as
diferentes reacções caninas não comprometem o alinhamento dos seus tratadores
(é curioso reparar na linha dos Pastores Alemães, que não deverão ser Wienerau nem
Arminius).
Por nossa vontade já não existiriam mais cães de guerra, também não
haveriam mais guerras, apesar de sabermos que alguns avanços na cinotecnia
resultaram do uso canino para fins militares, que muitos dos seus conteúdos de
ensino se prestam e continuarão a prestar-se à paz e ao auxílio de muita gente,
já que tanto se pode treinar o arco do fogo para acções ofensivas como para a
salvaguarda de pessoas e cães. E é nesse sentido que entendemos a utilidade do
treino militar canino, enquanto precioso subsídio para o bem-estar, adequação e
longevidade daqueles que nos seguem pela trela, companheiros insubstituíveis na
prestação de socorro. Debaixo desta preocupação é que gostaríamos de saber um
pouco mais acerca dos cães do Leste, do seu treino e possível avanço, o que nos
parece pouco viável com a Guerra da Ucrânia à porta, guerra fratricida que
sobrepõe ideais caducos à vida do seu próprio povo. Stepán Banderas e Josef
Stalin já morreram, de Hitler só sobrou a má memória, será que é necessário que
continuem a matar depois de mortos? Há que enterrar velhos ódios e dar paz à
Ucrânia e aos ucranianos!
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