quarta-feira, 2 de setembro de 2015

OS 6 ESTÁGIOS DO CPA NO MUNDO E ENTRE NÓS

Podemos dividir a história do Cão de Pastor Alemão em seis estágios desde a sua criação até aos nossos dias, cada um deles com uma duração de 20 anos, que espelham diferentes momentos da sua selecção, evolução e prestação, tempo necessário para alteração das linhas de criação visando a sua actualidade e préstimo, segundo os pressupostos da selecção artificial que se foi empreendendo e que melhor explica o cão que herdámos. O 1º estágio, “o embrionário”, vai da fundação da raça até 1920, passando pela I Guerra Mundial, acontecimento que notabilizará o CPA como cão militar e que o fará transpor as fronteiras da Alemanha para a restante Europa e para a América, ocasião em que a raça mais valerá pelas suas características laborais e manterá a biodiversidade presente na sua construção, longe de influências e decisões políticas, factores que no seu todo contribuirão para o seu bom nome e divulgação, como o mais extraordinário cão de guerra dos tempos modernos.
O 2º estágio, “o do cão militar”, vai de 1920 a 1940, período que apanha as duas Guerras Mundiais, altura em que este cão alemão é maioritariamente seleccionado para fins militares, acontecendo a selecção dos seus progenitores a partir da sua utilidade e desempenho no I Conflito Mundial. Os exércitos alemães e aliados usá-lo-ão na Europa para os mais diversos fins: sentinela, cão de patrulha, assalto, mensageiro, transportador, socorrista e detector de minas (os russos viriam a utilizar os seus cães como arma antitanque). Ainda que também tenha sido usado na Guerra do Pacífico, foi mais usado pelo Exército Imperial Japonês que pelos americanos, mercê do Japão ser aliado da Alemanha nazi e Hitler ter enviado para o Exército Nipónico 20.000 Pastores Alemães. Os americanos, particularmente os marines, valeram-se para o efeito de maior número de Dobermans. Quase no final do conflito, em 1944, tanto os Pastores como outros cães, passaram a fazer parte das tropas pára-quedistas, saltando dos aviões com os seus tratadores. Em virtude do seu louvável desempenho, testemunhado por diversos monumentos erigidos por várias partes, adivinha-se o seu uso policial. A expulsão da variedade branca irá acontecer poucos anos antes da II Guerra Mundial por influência nazi. Os afamados Pastores Alemães do passado, que justamente viriam a merecer a designação de “cães-polícia”, resultaram de progenitores seleccionados para fins militares, como viria a ser o caso do famoso Dox von Coburg, nascido em 1946.
O 3º estágio, “o do cão policial”, vai de 1940 a 1960, época dourada da raça que notabilizou tantos Pastores no combate ao crime. Em 1957 e no ano seguinte chegam a Portugal os primeiros Pastores Alemães militares e policiais, primeiro para os pára-quedistas (que na altura pertenciam à Força Aérea) e depois para a GNR, descritos genericamente e a grosso modo por “alsacianos” por politiquices. Nessa época proliferavam os lobeiros e as variedades recessivas eram mais numerosas que actualmente, o número de proprietários civis era bem menor que o dos militares e paramilitares, vendo-se amiúde Pastores muito-dominantes nas suas fileiras. A variedade preto-afogueada, como já havia acontecido no pós-guerra, vai-se tornando maioritária e por conseguinte dominante sobre as demais. A robustez, autonomia e valentia destes cães, somada à sua maior longevidade, haveria de torná-los objecto de admiração e maior procura. Os cães dessa época foram objecto de treino rigoroso e a sua prestação em pistas tácticas era excelente. Morfologicamente eram mais direitos de dorso e menos angulados de traseira. Devido à Cortina de Ferro, à divisão da Alemanha e ao Muro de Berlim, o Pastor Alemão irá proliferar nos exércitos do Bloco Soviético até chegar à saturação.
O 4º estágio, “o do descalabro”, que vai de 1960 a 1980, tristemente agravado na década de 70, irá perpetuar doenças como a displasia coxo-femoral, a mielopatia degenerativa e a insuficiência pancreática exócrina, mercê de cruzamentos arbitrários que desconsideraram o seu despiste. A raça começa a ser mais procurada pela estética e menos para o trabalho, o número de criadores e proprietários civis aumenta vertiginosamente e a raça vulgariza-se à velocidade das suas menos valias. A endogamia e a consanguinidade aumentam, a rusticidade da raça vai-se perdendo e os novos exemplares são cada vez mais fracos e menos aptos. A raça perde funções laborais e é mais vista nas exposições de beleza. O número de cães concorrentes à  “Schutzhundprüfung” (prova do cão de guarda) diminui drasticamente, as variedades recessivas quase que desaparecem e passam a ser criadas isoladamente, inclusive a lobeira. Os cães passam a ser mais leves e precoces, a sua longevidade laboral é encurtada e a sua esperança de vida menor. Saltam para a ribalta os cães von Arminius e von der Wienerau, assim como os seus sucedâneos. Começa a efectuar-se por toda a parte o despiste das doenças hereditárias, os cães tornam-se mais uniformes e característicos, ainda que menos autónomos e com menor versatilidade.
No 5º estágio, “o estético”, que vai de 1980 até ao final do Séc. XX, o número dos cães de beleza é bastante superior aos de trabalho, acentuando-se como nunca as diferenças entre si, tanto morfológicas quanto cognitivas. A variedade preto-afogueada prolifera e assiste-se ao tímido retorno dos lobeiros. Na década de 80 a maioria dos reprodutores importados continua a vir da Europa ocidental, da Alemanha, Bélgica, França, Holanda e sobretudo da Espanha. Depois do advento da Perestroika, primeiro via Áustria e depois directamente, começam a chegar os Pastores do Leste, os primeiros notoriamente de trabalho e os últimos já desafogados da consanguinidade e morfologicamente idênticos aos da linha estética, ainda que transmissores dos defeitos da endogamia que anteriormente os havia vitimado. Pouco a pouco começam a acontecer provas de trabalho em Portugal. Como nessa ocasião o dinheiro parecia cair das árvores, os Pastores Alemães atingem aqui preços nunca vistos, entre os 800 e os 1250€. Este inesperado aumento da riqueza, hoje pago a duras penas, ligado aos dinheiros oriundos da CEE, para além de aumentar drasticamente o número de criadores, a maior parte deles aventureiros e pouco conhecedores da raça, irá fomentar o surgimento das variedades recessivas unicolores (cinzento, fígado e negro), que “inesperadamente” se apresentam com mãos divergentes, abatimento de metacarpos, peito invertido, linha de ventre arregaçada e jarrete de vaca, denunciando assim os beneficiamentos apressados de que foram apressadamente alvo. A quebra de qualidade dos Pastores Alemães nas fileiras policiais e militares evidencia-se de sobremaneira na década de 90 e continua até á presente data, algo que deverá ser também compreendido à luz da crise económica que sobre nós se abateu.
O 6º estágio, referente ao Milénio em que nos encontramos, que poderemos apelidar como “o estágio do retorno”, para além de nos ter livrado dos criadores de ocasião, trouxe-nos outros mais fundamentados e por isso mesmo mais conscientes da raça e dos seus propósitos, gente que não dispensa a aprovação laboral na selecção dos seus reprodutores, todavia sem ver premiado o seu esforço, atendendo à menor procura que condiciona os preços do mercado. Cresce o número dos cães de trabalho importados da África do Sul, Áustria, Canadá, Escandinávia, Estados Unidos, Inglaterra e República Checa. Devido a esse arejamento, os nossos pastores apresentam agora mais robustez e envergadura, apesar de sobrarem por todos os cantos exemplares de má qualidade e pouco préstimo resultantes de beneficiamentos operados nas décadas anteriores, que são vendidos abaixo dos 100€ ou praticamente oferecidos. O número de criadores de cães negros aumentou, o despiste das doenças genético-raciais virou prática corrente e o combate à consanguinidade é palavra de ordem, factores ligados à procura de maior e melhor informação. Contudo, ainda estamos longe dos lugares cimeiros, mas o retorno à proto-dominância lobeira tornará possível a nossa ascensão. Apenas levantámos o véu e temos consciência disso, porque que cada estágio foi aqui tratado sinteticamente. Não obstante, estamos no bom caminho e os criadores deste novo milénio estão a devolver à raça o prestígio que outros estupidamente lhe surripiaram nas décadas de 70, 80 e em grande parte da de 90. 

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