sexta-feira, 10 de julho de 2015

O QUE FAZER COM OS CÃES INIBIDOS

O que fazer com os cães inibidos? Investi-los com uma pele que não a sua, até que acreditem que lhes pertence! Um dos maiores desafios para os adestradores é a recuperação de cães inibidos, tarefa que irá exigir-lhes observação, estudo, engenho, tempo, perseverança, empatia e muita paciência, porque o progresso destes animais é lento e sujeito a revezes, capacitação que automaticamente dispensa os mais coléricos, os menos flexíveis e os que carecem de resultados imediatos como estímulo para o trabalho.
Contrariamente ao que se pensa, a inibição de origem genética é mais comum entre os cães padronizados do que entre os provenientes da selecção natural, quer eles sejam silvestres ou párias, fenómeno associado a beneficiamentos que alteraram, ainda que involuntariamente, tanto pela endogamia quanto pela consanguinidade, o são equilíbrio dos principais impulsos herdados na procura de características morfológicas (estéticas). Um cão pode inibir-se por razões ambientais mas não totalmente, sendo a sua recuperação mais célere pela alteração do desfecho e dos efeitos ligados aos traumas. Muito mais difícil será a recuperação de um cão que nasceu inibido e que treme diante de tudo e todos, mazela geralmente reforçada por um imprinting descuidado.
Ainda que o extraordinário temor destes cães seja mais visível ao nível social, ele pode estender-se aos fenómenos naturais e diante da apresentação de qualquer novidade, o que obrigará a mil cuidados e ao estabelecimento de etapas, cujo cronograma nos será indicado pelos animais, mediante a aprovação nos trabalhos antecedentes. Na fase embrionária o adestrador obriga-se a passar a maior parte do tempo com o cão - à coabitação, para que ele se sinta protegido e pouco a pouco aceite as rotinas diárias de quem o acompanha.
A seu tempo, evoluir-se-á do interior para o exterior, do conhecido para o desconhecido e da separação do binómio para a sua integração no meio de outros, havendo o cuidado de não o inserir num grupo já hierarquizado ou portador de cães provocadores ou briguentos. O ideal é apresentá-los primeiro e isoladamente no terreno ou terrenos do cão medroso, vantagem que facilitará o seu entrosamento, isto se os cães utilizados estiverem convenientemente sociabilizados e forem de fácil controlo. Sempre será mais fácil recuperar um cão nestas condições do que uma cadela, apesar da cópula poder beneficiar de sobremaneira ambos e o exercício da maternidade vir em auxílio das cadelas. Paralelamente à sociabilização entre iguais, que deverá acontecer primeiro com o cão atrelado, operar-se-á a sociabilização e convívio com outras pessoas, optando-se por escolher aquelas cuja mímica seja de fácil leitura para o animal e não exteriorize instabilidade ou qualquer tipo de agressividade. Depois de certificada a confiança do animal no adestrador, este deve sair com ele para ecossistemas calmos e repousantes, onde o cão se sentirá cómodo e confiante, nem que seja pelo conforto daquele que o guia pela trela. Daí passar-se-á, para percursos mais concorridos e movimentados, com gente apressada e máquinas em movimento.
No processo de reabilitação do animal não adianta contrariá-lo, antes criar-lhe condições para que evolua sem suspeita e sem sobressaltos, caso contrário aumentará a sua resistência e menos confiará em nós (não podemos correr este risco). De etapa em etapa, o cão robustecerá gradualmente o seu carácter e passará a confiar em si próprio pela experiência adquirida, novidade que jamais alcançaria sem o contributo humano. A recuperação dos cães medrosos é um trabalho que pertence à reeducação, área do ensino canino que deveria ser matéria obrigatória para qualquer adestrador, uma vez que ela não se destina exclusivamente aos cães agressivos. E se ensinar cães é um acto de amor, recuperá-los é o seu expoente máximo. Os cães medrosos têm solução e ela passa pela dedicação dos adestradores, que enternecidos pela sua desprotecção, irão ensiná-los a vencer os seus medos, revestindo-os da confiança que a genética lhes omitiu, mercê da caminhada conjunta que a ambos fez crescer (o cão ganha confiança e o adestrador saber)

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