quinta-feira, 27 de outubro de 2022

OS SEIS INCUMPRIDORES DE OSAKA

 

Como dizia o grande Eça na sua obra O CONDE DE ABRANHOS, “quanto toca a dinheiro não há oposição nem governo, são todos iguais” (ignoro se as coisas ainda se passam assim). Muitos de nós têm uma ideia estereotipada dos japoneses, que julgam ser gente certinha, zelosa e cumpridora, gente bem diversa daquela que por cá temos, como se o mérito humano se remetesse apenas aos japoneses e sobre nós tivesse desabado exclusivamente uma torrente de defeitos, quando na verdade não é assim, porque a fuga aos impostos e a procura de bens ilícitos são universais. Seis criadores de cães e gatos na província japonesa de Shiga não declararam um total de cerca de 235 milhões de ienes (cerca de 1,58 milhões de dólares) de receita ao longo de cinco anos até dezembro de 2020, revelaram fontes próximas ao caso Mainichi Shimbun. A revelação veio depois da inspeção fiscal do Escritório Regional de Tributação de Osaka sobre estes criadores, realizada no momento em que a indústria de animais de estimação desfruta de lucros crescentes devido à demanda especial de “ficar em casa” debaixo da pandemia do coronavírus, tornando-se tentadora a fuga aos impostos por parte destes criadores. Da renda não declarada, o escritório de impostos de Osaka reconheceu cerca de 160 milhões de ienes (aproximadamente 1,08 milhões de dólares americanos) como renda não tributada. A referida agência fiscal obrigou os criadores ao pagamento de impostos atrasados no valor de cerca de 78 milhões de ienes (cerca de 526.000 dólares americanos), incluindo impostos de multa adicionais. A maioria dos criadores admitiu aparentemente a evasão fiscal.  

De acordo com as fontes, o departamento de tributação lançou uma investigação intensiva sobre os criadores – que são proprietários individuais – à medida que as suspeitas cresciam sobre suas declarações fiscais no meio da crescente demanda por animais de estimação devido à pandemia. Como resultado, descobriu-se que os seis homens e mulheres registrados como criadores na província de Shiga não relataram os seus enormes lucros com a venda de cães e gatos em pet shops e casas de leilões. Por lei, estes criadores são obrigados a relatar o número de cães e gatos que mantêm, criam e vendem aos governos locais onde se encontram registados registrados. A investigação do departamento fiscal de Osaka descobriu tácticas maliciosas de ocultação de renda ao subnotificar aqueles valores. Também surgiram casos em que o número de cães e gatos vendidos não puderam ser confirmados, por ausência de facturas, recibos e vendas a dinheiro. Há falta de outros meios, o departamento fiscal concentrou-se na prática dos criadores que entregam certificados de pedigree aos clientes a quem vendem cães e gatos de raça pura, tendo assim uma ideia aproximada do número total de certificados emitidos por organizações relevantes. A agência descobriu assim que os criadores acusados já haviam vendido os cães e gatos e que com eles entregaram o respectivo pedigree, não tendo portanto esses documentos na sua posse.

Nesses casos, acredita-se que a agência tenha identificado o valor da renda não declarada com base no preço médio de venda por animal. Com a pandemia às costas, mais e mais japoneses estão a comprar cães e gatos de estimação, na procura de consolo durante o tempo que passam em casa. De acordo com a Japan Pet Food Association, uma fundação oficialmente reconhecida com sede em Tóquio, o número de animais recém-criados em 2020 aumentou 18% para 416.000 cães e 16% para 460.000 gatos em relação ao ano anterior. A taxa de aumento em 2020 foi a maior dos últimos cinco anos, e o número permaneceu alto em 2021. “Os cães, em particular, venderam-se bem logo após a pandemia, desencadeando uma bolha”, confidenciou um criador da região de Kansai, no oeste do Japão. Entretanto, um indivíduo da indústria de animais de estimação disse ao Mainichi Shimbun (importante jornal diário japonês): "Os criadores precisam geralmente de ajuda para cobrir as suas despesas, mas é-lhes difícil obter empréstimos bancários. De repente o negócio tornou-se lucrativo, e eles podem ter recorrido à má conduta para amortizar suas dívidas. Esconder a renda é inadmissível, mas subsistem circunstâncias complexas." No Japão, em Portugal ou na China, criar cães é uma carolice, um negócio que não é rentável só por si, a menos que dê lugar à trafulhice, sirva outros propósitos ou induza a outros negócios (escolas e hotéis caninos), esses sim mais lucrativos. Neste caso foi a miséria e não a ganância que levou à fuga dos impostos, fenómeno que infelizmente também acontece por cá com alguma frequência. De repente, lembrei-me daquela frase já batida: “todos diferentes, todos iguais” - さよなら (sayonara)

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