No
tempo em que andava pelas casernas, onde os soldados de Cavalaria a cavalo
sempre se achavam superiores aos seus camaradas de Infantaria, ouvi vezes sem
conta uma graçola acerca dessa pretensa superioridade, que julgo ser tão antiga
e quiçá até anterior à chegada de Friedrich Wilhelm Ernst zu Schaumburg-Lippe,
vulgo Conde de Lippe, que em Julho de 1762 comandou e começou a reorganizar o
Exército Português. A graçola começava assim: Sabe qual é a diferença entre um
militar de cavalaria e um de infantaria? É muito simples! Na Infantaria, o
capitão manda vir com o tenente, o tenente com o sargento, o sargento com o cabo,
o cabo com o soldado e este fica com elas! Na cavalaria, o capitão manda vir
com o tenente, o tenente com o sargento, o sargento com o cabo, o cabo com o
soldado e este ainda tem o cavalo para lhe descarregar dois valentes pontapés
na pança!”
Infelizmente
ainda há por aí alguma gente ignorante, adepta da violência e “do pontapé na
pança” no mundo do adestramento (importa denunciá-la), plebe que em aflição e
sem ter como se fazer obedecer, não hesita em esganar e agredir os seus cães, abusando
deles e fazendo uso da “técnica do meia bola e força”, prima-direita do desenrascanço
e descendente directa da justiça executada a varapau. Perante um tratamento
destes, um cão submisso ficará sem préstimo (ainda mais borrado) e um dominante
bem depressa aprenderá a ser manhoso e velhaco, tentando não incomodar e não ser
visto para não apanhar mais do mesmo. Impotente perante a exagerada prepotência
do dono, mas incólume quanto ao seu perfil psicológico, enquanto vítima de
violência, tal qual o “soldado de cavalaria”, tenderá a atacar os outros cães
como resposta às contínuas inibições e agressões de que é alvo.
Na eventualidade do cão submisso mudar de
dono, este terá um trabalho aturado e moroso para o recuperar, não tendo
garantias de consegui-lo totalmente. Caso o cão dominante, para felicidade
dele, troque de mãos e um encontre um dono capaz de “desencarcerá-lo”,
constituindo com ele um binómio seguro, é muito natural que o animal, perante a
aproximação do antigo dono, queira ajustar contas com ele ou pôr as contas em
dia, ainda mais se houver sido treinado para atacar, porque os cães nunca
esquecem quem lhes faz mal e só se não puderem é que não devolvem ao remetente
tudo aquilo que receberam. A imerecida salvação dos violentadores e
torturadores de cães deve-se à natureza dócil da esmagadora maioria destes
animais, incapaz de responder à agressão com a agressão, o que torna ainda mais
cobardes e deploráveis as acções destes indivíduos. Eu já vi alguns cães “a ajustar contas” e gostaria de ter visto mais (1). Na nossa escola nenhum dono ou cão é de
infantaria ou de cavalaria, todos somos diferentes e ao mesmo tempo merecedores
de igual respeito, carinho e simpatia – estamos cá para ensinar, não para
traumatizar!
(1)Não
descobri a pólvora, mas bem vistas as coisas, a vingança é acima de tudo um
acto animal, que de racional nada tem e que em nada dignifica o homem.
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